Jornal Estado de Minas

ONU chama sistema judiciário brasileiro de ineficiente

Estudo denunciou superlotação e situação precária de prisões. Organização ainda afirmou que sistema judiciário é lento e que país vive "cultura autoritária"

Quatro pessoas foram mortas em rebelião na Penitenciária Estadual de Cascavel, na Região Oeste do estado do Paraná, no mês passado - Foto: WWW.CGN.INF.BR

Com quase metade da população carcerária brasileira ainda esperando julgamento e um excesso de 54% na capacidade das prisões, a Organização das Nações Unidas (ONU) apresentou um informe nessa quarta-feira, em Genebra, na Suíça, apontando o sistema judiciário de "ineficiente" e alertando para a "superlotação endêmica" das prisões brasileiras.

As conclusões são do Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária que analisou a situação no País. "O Grupo de Trabalho (da ONU) reconhece que as autoridades brasileiras estão confrontando uma cultura autoritária, o legado do colonialismo e dos 21 anos de ditadura militar". O grupo ainda denunciou o excesso de pessoas mantidas em prisões, sem que sequer tenham sido julgadas.

No informe, a ONU apontou que quase metade da população carcerária no País não foi julgada e que as prisões contam com quase 200 mil detentos a mais do que sua capacidade. "O Brasil tem uma das maiores populações carcerárias do mundo e mais de 217 mil pessoas ainda aguardam julgamento", alertou na plenária da ONU o perito Mads Andenas, chefe do grupo da ONU.

O governo brasileiro contra-atacou imediatamente, argumentou que a entidade fez "generalizações inapropriadas" e que as fontes das informações não foram reveladas pelos peritos da ONU em seu informe. Brasília rejeitou a avaliação dos peritos de que existe uma "cultura autoritária" no País. "O Brasil é uma democracia plural e participativa", declarou a embaixadora do Brasil, Regina Dunlop.

Regina apontou que os desafios identificados no informe "já são reconhecidos" pelo governo. Segundo ela, é "lamentável" o fato de os peritos não levarem em conta os comentários enviados por Brasília quando o informe ainda estava sendo feito.

Ela atacou as "generalizações" em relação ao Judiciário e apontou que o orçamento seria de US$ 57 bilhões em 2012. O governo também saiu em defesa da Polícia Federal e afirmou ser "incorreta" a informação de que a detenção de indígenas aumentou em 33% ao ano - o porcentual seria de 13%.

O Itamaraty também criticou comentários da ONU de que a hospitalização de usuários de drogas seria algo comum.
"Os números mencionados no informe não têm fundamentos", declarou Regina. O governo ainda criticou o fato de a ONU ter tratado da prisão de pessoas mentalmente descapacitadas, alegando que os peritos não visitaram as unidades.

Alerta

Mas a ONU tem uma posição diferente. Com um sistema judicial lento, a entidade alertou que o Brasil se depara com uma situação pouco confortável. O país tem a quarta maior população carcerária do mundo. Mas 44% dos detentos ainda aguardam julgamento, cerca de 217 mil pessoas.

Os peritos da ONU acusaram diretamente o sistema Judicial no Brasil pela situação. Segundo o informe, uma parte desses prisioneiros podem esperar "meses e até anos" para serem julgados. "Durante esse período, os detentos frequentemente nem sabem o status de seu caso", alertou.

"A presunção de inocência que consta da Constituição parece que na prática foi abandonada por juízes", declarou o informe da ONU. Para a entidade, o "número elevado de detentos em prisões sem um julgamento pode ser a consequência da falta da habilidade do sistema judiciário em processar os casos de forma eficiente".

A ONU também denunciou a superlotação das prisões. Segundo a entidade, existem hoje no Brasil quatro prisões federais e 1,1 mil estaduais. Mas, se a capacidade é para 355 mil detentos, o que se vê é a presença oficial de 549 mil.

"Políticas públicas de mostrar firmeza contra o crime levou a uma tendência de encarceração em massa", denunciou o informe. A ONU, porém, declarou que, apesar dessa política, Estados não têm "nem a capacidade nem a estrutura para lidar com as consequências" de tal estratégia.

"A maioria das prisões estão em uma situação precária", indicou o informe da ONU. "A infraestrutura é abaixo do padrão, frequentemente inadequada, e o número de profissionais no setor de educação, saúde e bem-estar trabalhando nelas é insuficiente", denunciou.

"Como resultado do excesso de detenções, as prisões são frequentemente superlotadas. Em alguns casos, o excesso supera 100% de sua capacidade", declarou.
A ONU advertiu ainda que a situação pode piorar ainda mais, diante de cerca de 192 mil mandados de prisão que aguardam para ser executados.

A entidade apontou ainda que o risco não é apenas para os detentos, mas para a própria estratégia de segurança. "Superlotação endêmica leva a distúrbios e a um maior número de mortes nas prisões", concluiu.

Últimos casos

Somente em 2014, presídios de Paraná, Santa Catarina, Amazonas e Maranhão tiveram que enfrentar revoltas que acabaram com mortes de presos, decapitados ou jogados dos telhados, e agentes penitenciários feitos reféns. Na maioria dos casos as unidades também foram danificadas.
Familiares e amigos de detentos da Penitenciária Estadual de Cascavel passaram vários dias sem notícias na porta da unidade - Foto: WWW.CGN.INF.BR

(Com Agência Estado)

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