Jornal Estado de Minas

CHECAMOS

A suposta sentença de morte a 229 missionários cristãos no Afeganistão circula desde 2017

Uma mensagem pedindo orações a 229 missionários cristãos que seriam executados “amanhã” por “islâmicos afegãos” foi compartilhada mais de mil vezes nas redes sociais desde pelo menos 19 de agosto, dias após os talibãs tomarem o controle de Cabul. No entanto, trata-se de uma mensagem apócrifa que circula desde 2017.



“Hoje, infelizmente, confirmaram a triste e terrível notícia que 229 missionários cristãos, foram condenados à morte amanhã à tarde pelos islâmicos afegãos”, diz a mensagem que circula no Facebook (1, 2). “Por favor, transmitam esta mensagem o mais rápido possível para que muitas pessoas possam orar. A mensagem foi enviada por JUDITH CARMONA O missionário de Chihuahua que está na África”.

A publicação pede ainda uma oração porque o “grupo radical islâmico também acaba de tomar Quaragosh”, no Iraque.


Alegações similares também circularam no Twitter (1, 2), no Instagram e em outros idiomas, como o espanhol. Em inglês, a mesma versão foi compartilhada nas redes sociais, além de outra em que os condenados à morte são 22 missionários cristãos em vez de 229.

Origem da mensagem

De acordo com o site de verificação Snopes, a mensagem começou a circular em inglês em 2009 por e-mail. Na época, a versão era mais curta e pedia orações por “22 famílias missionárias” que seriam executadas por islamitas no Afeganistão.



A origem dessa publicação provavelmente está relacionada com a captura de 23 missionários sul-coreanos pelos talibãs em 2007. Como informado pela AFP à época, dois reféns foram assassinados e os demais foram libertados no final de agosto daquele ano.

Uma busca por palavras-chave na ferramenta CrowdTangle levou a uma publicação de janeiro de 2018 com um conteúdo semelhante, mas mencionando supostos 22 missionários cristãos e indicando que a notícia em questão havia sido dada por um “metodista da Costa do Marfim”.

Em espanhol, por sua vez, uma pesquisa similar mostrou que essa mensagem circula ao menos desde setembro de 2017, falando em “229 missionários” e citando uma voluntária cristã do México que se encontrava na África chamada Judith Carmona. Em português esse conteúdo só foi encontrado em 2021.



A equipe de checagem da AFP não encontrou nenhum registro dessa pessoa, suposta autora da mensagem.

Nas publicações agora viralizadas há a palavra “Quaragosh”, uma transcrição incorreta do nome da cidade iraquiana de Qaraqosh, que foi ocupada pelo grupo extremista Estado Islâmico - não pelos talibãs - entre 2014 e o final de 2016.

Cristãos no Afeganistão

Emal Haidary, um dos repórteres da AFP em Cabul, confirmou que os cristãos são proibidos de professar sua fé no Afeganistão.

“O trabalho missionário cristão é ilegal no Afeganistão porque a base de todas as leis aqui é a sharia islâmica e a sharia não permite o trabalho missionário cristão nem a apostasia (renúncia à fé muçulmana)”, explicou.



“No entanto, existem alguns missionários cristãos que agem secretamente em algumas partes do país, sobretudo sob o nome de organizações de caridade. Também existem alguns missionários afegãos em Cabul, mas têm que ser extremamente sigilosos, do contrário terão problemas”, complementou.

No passado, os talibãs assassinaram pessoas acusadas de trabalhar como missionários cristãos, incluindo um ataque em 2014 a uma família sul-africana que vivia em Cabul. Pessoas próximas indicaram que a família era cristã praticante, mas não missionária.

Em 2010, os talibãs reivindicaram o assassinato de um grupo de professionais de saúde, também alegando que eram missionários cristãos.

Desde a tomada do palácio presidencial em Cabul por parte dos talibãs, em 15 de agosto, a situação no país é instável, com centenas de pessoas que tentam sair do país.



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