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Estado de Minas ATAYE

Violência étnica afeta eleições na Etiópia


05/06/2021 11:46

Quando os tiros começaram em uma manhã de abril, Genet Webea abraçou seu marido e sua filha de sete anos, pedindo que seu lar fosse poupado da violência étnica que mais uma vez atinge sua região no centro da Etiópia.

Naquela manhã, uma dúzia de homens armados arrombou a porta de sua casa na cidade de Ataye. Genet implorou por misericórdia, mas sem sucesso: seu marido foi morto.

Ele foi um dos 100 civis assassinados em uma recente onda de violência na região de Amhara. Mais de 1.500 edifícios foram incendiados e suas ruas, antes vibrantes, ficaram cobertas de escombros.

A violência étnica na Etiópia tem manchado a gestão do primeiro-ministro Abiy Ahmed, ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 2019, e ameaça as próximas eleições nas quais ele disputará um novo mandato.

A votação está marcada para 21 de junho, mas os órgãos eleitorais consideram que a insegurança e os problemas logísticos impossibilitam a realização de eleições nessa data em pelo menos 26 círculos eleitorais, incluindo Ataye.

Nesta cidade agrícola, a meta de Abiy Ahmed de unificar os 110 milhões de etíopes, espalhados por uma miríade de grupos étnicos, parece inatingível.

A maioria de seus 70.000 habitantes são amhara, mas há várias aldeias oromo. Pelo menos seis episódios de violência étnica foram registrados entre as populações oromo e amhara, os principais grupos étnicos do país, desde que Abiy chegou ao poder em 2018, segundo o prefeito Agagenew Mekete.

Para Genet Webea, uma amhara, o simples ato de ouvir a língua oromo causa enorme angústia e traz à mente a imagem do marido sangrando no chão da cozinha.

"Foram eles (os oromo) que fizeram isso com meu marido", diz. "Eu não quero vê-los ou ouvi-los".

- Acesso às terras -

Para o prefeito Agagenew, a violência reflete as tensões em torno do acesso às terras férteis da região, onde são cultivados sorgo, milho e trigo.

Amhara sofreu mais de 400 mortes e 400.000 deslocados em março e abril, de acordo com o mediador da Etiópia, Endale Haïlé, que se recusa a fornecer uma classificação das vítimas por etnia.

Nos últimos anos, as tensões aumentaram na Etiópia, o segundo país mais populoso da África.

De acordo com o prefeito, a intenção do primeiro-ministro de aliviar o autoritarismo da coalizão governamental anterior criou um espaço político que foi aproveitado por grupos étnico-nacionalistas violentos.

"Desde que Abiy chegou ao poder, tem havido indulgência em nome da abertura à democracia", explicou Agagenew. "Falta rigor na aplicação da lei".

Como Genet Webea, ele atribui as mortes em parte ao Exército de Libertação Oromo (OLA), um grupo rebelde rotulado de "organização terrorista" pelas autoridades.

OLA nega qualquer presença na região e afirma que as autoridades o acusa falsamente para justificar uma "limpeza étnica" contra os oromo.

Muitos oromo em Ataye não acreditam que o OLA esteja envolvido na violência, como Boru, que não revelou seu sobrenome por razões de segurança.

De acordo com Boru, a violência começou em 19 de março depois que um imã oromo foi morto em frente a uma mesquita pelas forças de segurança amhara, que impediram que pessoas próximas a ele recuperassem o corpo.

"É uma guerra, cada lado ataca o outro", disse ele.

Mas, independentemente de quem seja o responsável, a violência transformou Ataye em uma cidade fantasma.

O hospital e o posto policial foram saqueados. Restam apenas algumas coisas dispersas.

A maioria dos moradores fugiu e a multidão só se apresenta para as distribuições de sacos de trigo organizadas pelas autoridades.

- "Mortes politizadas" -

A comissão eleitoral garante que, como os outros 25 distritos envolvidos na violência, Ataye votará sem problemas nas próximas eleições.

No entanto, não há preparativos em andamento e os habitantes estão indiferentes.

"Por que votar? Não temos interesse nessas eleições, perdemos nossas casas", disse Hawa Seid, de 19 anos.

Em outras partes do país, o massacre de Ataye pode pesar na votação. Já provocou manifestações na região de Amhara e alimentou a versão de um "genocídio" promovido por alguns militantes.

A Amhara Association of America, com sede em Washington, diz que mais de 2.000 amhara foram mortos em dezenas de massacres desde julho de 2020.

"Para as pessoas cuja própria existência é questionada, acho que a questão da segurança dos amhara em toda a Etiópia determinará seu voto", afirmou Dessalegn Chanie, membro do Movimento Nacional pelos Amhara.

Por sua vez, o porta-voz da região Amhara, Gizachew Muluneh, acusa os partidos rivais de "tentarem politizar as mortes para tirar proveito".

Genet Webea participou de algumas manifestações. "Fiquei feliz por estar lá, queria mostrar o mal que eles nos fizeram e exigir que o governo pare com o genocídio dos amhara", explicou.

No entanto, ele não deixa de acreditar que os amhara e os Oromo um dia poderão viver em paz.

Ella contou que depois da morte de seu marido, seus vizinhos oromo a abrigaram brevemente com sua filha.

O gesto a lembrou de um tempo de paz que deseja ver novamente: "Antes todos nós vivíamos juntos, como uma família."


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