As forças pró-Haftar bloquearam neste sábado (18) os principais terminais de petróleo do leste da Líbia, horas antes de uma reunião de cúpula internacional em Berlim para relançar o processo de paz naquele país, mergulhado em uma guerra civil.
A interrupção das exportações de petróleo, quase única fonte de receita da Líbia, é um ato de protesto contra a intervenção da Turquia naquele país, indicaram as tribos e forças leais ao general Khalifa Haftar, homem forte do leste líbio, e que está em conflito com o Governo de União Nacional (GNA), reconhecido pela ONU e instalado na capital, Trípoli.
Os pró-Haftar consideram que a receita do petróleo distribuída pelo GNA serve para pagar combatentes do exterior, principalmente da Turquia.
A Companhia Nacional de Petróleo (NOC) anunciou a paralisação das exportações nos terminais de Brega, Ras Lanuf, Al-Sedra e Al-Hariga. O bloqueio provocará uma queda da produção do país do 1,3 milhão de barris diários atuais para 500 mil barris diários, e um prejuízo de cerca de 55 milhões de dólares por dia, segundo a empresa.
O marechal Haftar, que realiza desde abril de 2019 uma ofensiva para tomar Trípoli, deveria participar amanhã da conferência internacional sobre a Líbia organizada pela ONU, bem como seu rival, Fayez Al-Sarraj, chefe do GNA.
A Turquia apoia Sarraj, inclusive militarmente, enquanto suspeita-se de que a Rússia, apesar de suas negativas, apoie o general Haftar com armas, dinheiro e mercenários.
O ministro turco das Relações Exteriores, Mevlut Cavusoglu, criticou por sua vez a decisão da Grécia de convidar o marechal na véspera da conferência porque, segundo ele, é "sabotar" os esforços de paz.
- 'Chantagem' -
Ahmad Al-Mismari, porta-voz dos pró-Haftar, indicou neste madrugada que "o fechamento dos campos e terminais de petróleo é uma decisão puramente popular, o povo decidiu".
Mas segundo Jalal Harchaoui, pesquisador no Instituto Clingendael de Haia, "trata-se de uma lógica de chantagem que pode funcionar, mas há o risco de que Washington reaja mal. O governo Trump é muito contrário aos bloqueios das exportações de petróleo líbio", que levariam a um aumento do preço do óleo.
Em entrevista à AFP neste sábado, em Berlim, o enviado da ONU à Líbia, Ghassan Salame, não descartou uma motivação política, antes da reunião na Alemanha. "Digamos que o momento é um pouco suspeito. Na ONU, nossa linha é clara. Não se deve brincar com o petróleo, porque é o sustento dos líbios. Sem petróleo, os líbios morrem de fome", advertiu.
Salame também pediu aos outros países que abandonem a interferência no conflito, que mescla rivalidades políticas e econômicas motivadas pelas importantes reservas líbias.
A presença de militares turcos no país e as suspeitas de que também haja mercenários russos gera o temor de que a Líbia se converta em uma "nova Síria", um conflito complexo, com a presença de vários países.
- 'Aspirina' -
"Qualquer tipo de interferência estrangeira pode ter o efeito de uma aspirina a curto prazo", disse Salame em Berlim, referindo-se ao cessar-fogo que entrou em vigor em 12 de janeiro na Líbia, por iniciativa da Rússia e Turquia.
A reunião de amanhã terá o objetivo principal de consolidar a trégua, ainda frágil, com um embargo à entrega de armas. Os dois campos rivais da Líbia se acusam mutuamente de "violações".
Apesar de seus interesses divergentes, Rússia e Turquia se impuseram nas últimas semanas como personagens-chave na Líbia, em detrimento da Europa.
O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, que estará amanhã em Berlim, advertiu hoje sobre o perigo de ressurgimento de grupos jihadistas se o GNA for derrubado. "A Europa enfrentará uma nova série de problemas e ameaças em caso de queda do governo legítimo líbio", publicou Erdogan no site de notícias Politico.
A Tunísia, por outro lado, anunciou que não vai participar da conferência porque foi convidada com atraso pela Alemanha.