Jornal Estado de Minas

Israel está prestes a convocar a terceira eleição em um ano

Os 3 milhões de palestinos que vivem na Cisjordânia compartilham com os 9 milhões de israelenses a expectativa tensa pelo desfecho de mais uma etapa na crise política mais profunda e prolongada vivida pelo moderno Estado judeu desde sua fundação, em 1948. O país é governado interinamente pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyhu desde o início de abril, quando uma eleição antecipada terminou sem a formação de uma maioria na Knesset (parlamento) – resultado que se repetiu em setembro. No fim desta semana, esgota-se o prazo para que os deputados encontrem uma solução. Caso contrário, os eleitores serão chamados novamente às urnas, pela terceira vez no intervalo de um ano.



Inédito para os israelenses, o cenário tem implicação direta para os palestinos, em especial desde os dias finais da última campanha eleitoral. Foi quando o direitista Netanyahu, no esforço final para desempatar a disputa com o líder da oposição de centro, Benny Gantz, prometeu tomar medidas, caso reeleito, para anexar o Vale do Jordão e a margem norte do Mar Morto, que correspondem a 30% da Cisjordânia e compreendem a maior parte da terra cultivável. As áreas visadas são adjacentes aos assentamentos onde se concentra uma parte dos cerca de 500 mil colonos israelenses que vivem no território.

A ideia ganhou contornos mais claros em outubro e setembro. Primeiro, foi transformada em projeto de lei apresentado pelo Likud, o partido de Netanyahu, que se dispõe a colocá-lo prontamente em vigor, uma vez aprovado. Em seguida, veio o apoio externo indispensável para fazer frente a condenação praticamente unânime, começando pelas Nações Unidas. Rompendo com a política seguida há décadas por governos de ambos os partidos americanos, o presidente Donald Trump decidiu não mais considerar contrária ao direito internacional a colonização israelense na Cisjordânia, ocupada na guerra de 1967.
Do ponto de vista dos palestinos, a anexação das áreas abrangidas pelo plano tornaria inviável, em termos econômicos e mesmo práticos, a instalação de um Estado soberano. Desde os Acordos de Oslo, firmados em 1993, a Cisjordânia e a Faixa de Gaza são governadas em regime de autonomia limitada pela Autoridade Palestina (AP), como parte de um processo delineado para conduzir a uma Palestina independente, convivendo em fronteiras reconhecidas com o vizinho israelense.



“Estamos monitorando de perto as ações” de Netanyahu, comentou o presidente da AP, Mahmud Abbas. “Se ele realmente tomar uma medida como essa (a anexação), vamos nos dirigir à ONU e ao Tribunal Penal Internacional”, avisou. “E vamos, de maneira definitiva e irrevogável, romper todos os laços com Israel.” Abbas não deixou passar em branco, igualmente, a guinada diplomática anunciada por Washington. “A liderança palestina não pensa em ficar indiferente a isso. Comecei consultas com as diferentes força políticas a respeito dos passos que poderemos dar, e estamos pontos, inclusive, a eventualmente romper completamente as relações com os EUA.”

ESPELHO 

Se Israel vive um período de impasse e indefinição política, a situação não é muito diferente no lado oposto. Abbas sucedeu o primeiro presidente e patriarca da causa palestina, Yasser Arafat, morto em novembro de 2004. Despido do carisma do antecessor, exerce uma liderança permanentemente contestada, em especial pelo movimento islâmico Hamas, que desde 2007 controla na prática a Faixa de Gaza – e já se envolveu em duas breves guerras com Israel. Desde 2009, o mandato de Abbas na presidência da AP foi prorrogado indefinidamente. Seguidas tentativas de convocar eleições para renovar o Executivo e o Legislativo do governo autônomo foram canceladas. A perda de 30% da Cisjordânia pode decretar o fim da carreira política de Abbas, sem que alguma nova liderança se projete.

No campo israelense, a semana começa com a os ventos soprando no rumo de uma nova eleição, depois de mais uma tentativa frustrada de Netanyahu e Gantz para compor um governo de “união nacional”, com maioria parlamentar sólida. Em ambas as possibilidades, no entanto, a anexação da Cisjordânia se insinua no horizonte como risco palpável, e a ampliação dos assentamentos como realidade tangível. O governo autorizou a construção de mais moradias para colonos na cidade de Hebron, foco permanente de tensão e confrontos. E, se o premiê interino já tem nesse um lema de campanha, o principal rival parece tomar o mesmo rumo. “Existe uma importante necessidade de fortalecer os assentamentos e garantir a sua proteção”, afirmou Gantz, que jamais se pronunciou contra o projeto de anexação. “É por isso que precisamos de um governo forte”.