Jornal Estado de Minas

Londres e Bruxelas trocam acusações sobre possível fracasso do Brexit

A menos de um mês para a separação, autoridades do Reino Unido e da União Europeia (UE) trocaram farpas nesta quinta-feira (3) sobre a responsabilidade de trabalhar para alcançar um acordo que permita evitar um Brexit caótico, tendo como base as novas propostas britânicas.

"Continuamos abertos, mas não convencidos", disse o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, que conversou com o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, sobre sua proposta apresentada no dia anterior para chegar a um acordo de desvinculação antes de 31 de outubro, data do Brexit.

Esta "proposta final", nas palavras de Johnson, demonstram a seriedade de seu governo. "Não cumprem tudo o que desejávamos, mas, com essas concessões, fazemos uma verdadeira tentativa de superar o abismo", declarou diante da Câmara dos Comuns.

O premier reiterou que, se a UE não demonstrar a mesma disposição, o Reino Unido abandonará o bloco de forma brutal, sem pedir mais adiamentos, um resultado "que seria um fracasso, pelo qual todas as partes seriam responsáveis", acrescentou.

O plano de Johnson consiste em modificar o rejeitado Tratado de Retirada fechado em novembro pela ex-primeira-ministra Theresa May com Bruxelas: como manter aberta a fronteira entre a província britânica da Irlanda do Norte e a República da Irlanda, país-membro da UE.

O acordo de May, que os líderes europeus chamaram de "melhor possível, único possível", foi rejeitado três vezes pelos deputados britânicos.

A nova proposta não é muito diferente das primeiras versões do Tratado de Retirada: a Irlanda do Norte permaneceria no mercado único europeu no que diz respeito às mercadorias, ao contrário do restante do país. E todo Reino Unido sairia da união alfandegária europeia para poder negociar acordos comerciais com outros países.

A ideia esbarra, porém, nos mesmos obstáculos: as críticas de Bruxelas e a rejeição da oposição britânica.

"Nenhum deputado trabalhista pode respaldar este acordo temerário", afirmou o líder opositor Jeremy Corbyn, que acredita que será rejeitado em Bruxelas, na Câmara dos Comuns e em todo seu país".

- Bruxelas pede soluções -

Johnson já havia passado a bola para o lado da União Europeia ao solicitar, na quarta-feira (2), "alguma concessão" para alcançar um compromisso que evite um Brexit sem acordo. Mas a Comissão Europeia, que negocia em nome da UE, já encontrou "pontos problemáticos" na proposta.

"Resta trabalho por fazer, e este trabalho deve ser feito pelo Reino Unido, não o contrário", afirmou a porta-voz do Executivo europeu, Natasha Bertaud. "É o Reino Unido que sai da UE e não a UE que sai do Reino Unido", acrescentou.

Vários diplomatas europeus resumiram que os problemas se concentram na separação de medidas regulatórias e controles alfandegários, bem como no veto que a assembleia da Irlanda do Norte teria por sua continuidade no mercado único europeu.

No entanto, as equipes de negociação europeias e britânicas começaram a discutir, segundo um diplomata, avisando que o prazo não é 31 de outubro ou 17 e 18 de outubro, quando será realizada a cúpula europeia, mas dentro de dez dias.

"A UE não é responsável pela proposta ter chegado ontem (...) Se um acordo não for alcançado antes do Conselho Europeu , a culpa não será nossa", disse outro diplomata.

A Eurocâmara, que poderia dar seu consentimento para um pacto para que este entre em vigor, advertiu também nesta quinta que a proposta britânica não constitui "a base de um acordo" que poderiam aprovar.

"A estratégia de Johnson consiste em culpar o outro, neste caso a UE, quando o plano for rejeitado", denunciou o deputado independentista escocês Ian Blackford na Câmara dos Comuns.

Desde que chegou ao poder no fim de julho, em substituição a Theresa May, o carismático e controverso primeiro-ministro acumula fracassos no Parlamento. Sofreu uma rebelião da bancada conservadora, perdeu a maioria absoluta, viu a aprovação de uma lei que o obrigaria a solicitar um novo adiamento do Brexit e a rejeição de seu pedido de eleições antecipadas.

Também ganhou a inimizade de muitos deputados, ao anunciar uma suspensão do Parlamento de cinco semanas, de 10 de setembro a 14 de outubro. A medida foi denunciada como uma estratégia para amordaçar os opositores e acabou sendo anulada pela Justiça, que a considerou ilegal.

Desde que assumiu o cargo em julho, Johnson acumula fracassos: foi alvo de uma rebelião dos conservadores, perdeu a maioria absoluta, teve negado o pedido de antecipação das eleições e viu o Parlamento aprovar uma lei que o obriga a solicitar outra prorrogação na ausência de um acordo com Bruxelas em 19 de outubro, logo após uma reunião de cúpula europeia.

Enquanto isso, os europeus reiteram que esse pedido deve ser acompanhado de um bom motivo, como eleições antecipadas, para ser aceito.

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