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Estado de Minas

Mítico Mont Blanc sucumbe ao aquecimento global


postado em 01/08/2019 15:25

As geleiras derretem e a montanha perde suas feições. No maciço do Mont Blanc, a montanha mais alta dos Alpes, há cada vez mais vias míticas que se tornam perigosas, para não dizer impossíveis, devido às mudanças climáticas, partindo o coração de alpinistas.

"Acontece muito depressa. Há dez anos não poderia imaginar uma aceleração como esta", afirma o geomorfólogo Ludovic Ravanel, que registra cada alteração de altitude no berço histórico do alpinismo. E, "se forem levados em conta os anúncios dos meus colegas, climatologistas, dentro de 10, ou 20 anos, será ainda pior".

Em 2005, o emblemático pilar Bonatti, um temido paredão que domina a vertical da localidade de Chamonix (leste da França) desabou, provocando um terrível estrondo. Vieram abaixo 292.000 metros cúbicos de rocha e um pedaço da história, arrastando junto a possibilidade de escalada para os guias mais jovens.

Estes desabamentos continuam e se multiplicam. Ravanel escreveu uma tese sobre eles e os registra sem trégua.

O permafrost - camada permanentemente congelada, que serve de cimento entre blocos de pedra - está abalado. E os glaciares, que também sustentam as montanhas com uma pressão horizontal aos seus pés, recuam, fragilizando-as ainda mais.

No verão passado, desabou uma parte do Arête des Cosmiques, muito frequentado. "Algumas paredes não têm muito tempo restante", adverte este pesquisador, vinculado ao Centro Francês de Pesquisa Científica (CNRS, na sigla em francês).

- Esquecer as faces míticas -

A 3.000, ou 4.000 metros de altitude, a perda de pontos de referência climáticos dificulta avaliar os riscos.

É verão e cerca de 50 montanhistas se preparam para jantar no refúgio de Couvercle (2.687m), sobre o glaciar Mer de Glace ("mar de gelo"), o mais longo da França e que a cada ano perde vários metros de espessura.

Em volta da mesa, há várias duplas guia-cliente e um quarteto de aspirantes a guias com menos de 30 anos. E todos estes esportistas determinados expõem claramente seus temores.

Nenhum deles quer ser identificado, porque não quer ser o "pé frio". No fim das contas, o que contam é sabido por todos - não viram outra coisa além de um aquecimento devastador, que destrói tudo em sua passagem.

"O alpinismo na neve é aleatório. Antes, em junho, sempre era possível. Atualmente, nem sempre é o caso e, em agosto, está morto", começa a explicar um deles.

De fato, na primavera, "há mais trabalho do que antes. É melhor do que julho e agosto", reforça o vizinho. Mas é preciso abrir mão de algumas "faces míticas", acrescenta.

- Perda de referências -

Os guias atuais "não praticam mais o mesmo ofício que meu pai", afirma Ludovic Ravanel, de 37 anos.

Sua equipe recuperou a lista "Les 100 plus belles courses" (As 100 mais belas vias, em tradução livre) do maciço de Mont Blanc, publicada originalmente em 1973 pelo guia Gaston Rébuffat e transformada na bíblia de várias gerações de alpinistas. Em menos de meio século, a maioria delas foi afetada pelo aquecimento, e três não existem mais.

As janelas "ótimas" para fazer estas escaladas se tornaram "mais perigosas e difíceis" e se deslocaram "para a primavera, ou para o outono".

Escalar sempre foi um esporte de risco, no qual o alpinista enfrenta o risco de queda de pedras, ou seracs, grandes blocos de gelo que se rompem regularmente com o movimento natural dos glaciares, arrastando tudo em seu caminho. Mas estes fenômenos têm-se multiplicado.

- "O luto" -

"Eu comecei a viver o luto de muitas coisas", admite Yann Grava, de 33, que terminará sua formação em um ano. "Em média, um guia trabalha por uns 15 anos. Eu acho que serão dez, porque as montanhas vão cair", desabafa.

Em Couvercle, todo mundo tem uma história apavorante relacionada com o aquecimento. Como a de uma cordada (grupo de alpinistas amarrados pela mesma corda) escalando o Peigne, nas "agulhas" de Chamonix. "O penhasco começou a vibrar [...] Não tenho muita vontade de voltar", lembra, com um sorriso nervoso um guia de 40 anos que não quis dar seu nome.

Como muitos de seus colegas, ele tem uma segunda profissão: eletricista. "Penso voltar a exercer as duas".

Em três dias de caminhada, uma equipe da AFP localizou uma montanha de lixo devolvidos pelo "Mer de Glace", de latas de conserva enferrujadas com rótulos dos anos 1950, ou um velho esqui dos 1990.

"Tudo vem à tona, porque o nível do glaciar diminui", explica o guia eletricista.


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