(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas

Três décadas da vitória do 'não' no Chile, 'alegria' derrotou Pinochet


postado em 04/10/2018 10:42

Há 30 anos, os chilenos disseram "não" à ditadura de Augusto Pinochet. Em 5 de outubro de 1988, após uma ousada campanha que apostou no otimismo para vencer o medo, os chilenos votaram contra o ditador, abrindo as portas para a democracia no país.

No papel, a decisão parecia simples. O "sim" significava estender a ditadura por mais oito anos, enquanto o "não" liberava o caminho para a eleição presidencial um ano depois.

Pinochet chegou ao referendo, convocado por ele mesmo e que estava previsto na Constituição promulgada em 1980 em meio a denúncias de fraude, com uma crescente pressão internacional e o desgaste de 15 anos no poder. Nesse período, espalhou o terror, com assassinato e desaparecimento de opositores e uma censura ferrenha.

Não era fácil para a oposição - reunida em uma extensa Concertação de partidos políticos - abordar os temores da população. Diante de uma arriscada campanha, porém, decidiu apostar na alegria e na esperança por um futuro melhor sem Pinochet.

"Chile, a alegria já vem..." foi o principal slogan de uma campanha pioneira em política e que ainda é estudada em escolas de publicidade por sua audácia.

No mês anterior à votação, a peça publicitária foi transmitida todos os dias antes do principal telejornal no horário de propaganda eleitoral com 15 minutos para cada lado.

"Foi muito acertado da parte da equipe de criação pôr o que vinha como positivo, que o que vinha era melhor", lembra à AFP Cristian Dupré, um dos que se animaram a atuar nos curtos spots publicitários do "não".

Com humor, música e dança, a mensagem superou uma propaganda rival que continuava apostando no medo, com grosseiras encenações de atentados explosivos e outros atos de violência.

Colocar o rosto diante das câmeras, desafiando Pinochet, era, porém, um grande risco.

"Como ia sair na televisão, se tinham matado gente por muito menos? Mas não pude me negar a protagonizar algo que podia pôr fim a uma ditadura criminosa", disse Patricio Bolaños, locutor e principal rosto da campanha, em recente entrevista ao jornal "La Tercera".

Dupré, militante de esquerda, admite que recebeu ameaças, mas que foram compensadas pelo apoio da população.

"Me estimulavam muito. Me protegiam nas ruas", relata.

- Códigos publicitários -

Dar todo o mérito da vitória à propaganda seria um erro, assim como desconhecer seu valor.

"A vitória se deveu a todas essas pessoas que se opuseram à ditadura, a todo o trabalho de resistência, aos movimentos de trabalhadores, estudantes, mulheres, às pessoas que enfrentaram os tanques (...) Tudo isso foi um motor que permitiu a vitória do 'não'", disse à AFP o produtor de televisão Juan Forch, que trabalhava para a oposição.

O produtor lembra a emoção que sentiu quando o primeiro programa foi ao ar. Para dezenas de produtores audiovisuais e artistas que trabalharam sem receber, era a coroação de anos de censura, durante os quais, para sobreviverem, foram se entrincheirar em agências de publicidade.

Escritores, poetas e diretores tiveram de aprender na marra o ofício de fazer pequenas mensagens muito efetivas. Foi esse nicho, para o qual Pinochet os empurrou, que colaborou para poder derrubá-lo, analisa o produtor.

Nem o comando político, nem os demais participantes da campanha tinham um plano B. Perder não era uma opção.

No dia do plebiscito as pessoas venceram o medo, e os centros de votação lotaram. As horas seguintes ao fechamento das urnas foram vividas como uma via-crúcis. As primeiras informações oficiais davam uma clara vantagem para o "sim", ainda que as pesquisas realizadas pelo comando opositor previssem a derrota do ditador.

As horas passavam, e Pinochet brilhava por sua ausência. A apuração oficial demorava, enquanto a televisão transmitia desenhos animados. A tensa espera terminou apenas de madrugada. Diante dos jornalistas na entrada do Palácio de Governo, um membro da junta militar, o comandante da Força Aérea, Fernando Matthei, reconheceu que o "não" havia vencido.

De acordo com os números oficiais, o "não" venceu por 56%.

- Resistência pinochetista -

Um ano depois, foi realizada a eleição presidencial e, em 11 de março de 1990, o democrata-cristão Patricio Aylwin assumiu o poder. Pinochet ainda se manteve por mais oito anos à frente do Exército, de onde continuou demonstrando sua força, ao levar os tanques várias vezes às ruas.

Depois de deixar o Exército, assumiu como senador vitalício e, finalmente, faleceu em 2006, aos 91 anos, encurralado pela Justiça. Nunca foi condenado, porém, por nenhuma das mais de 3.200 vítimas de seu regime, entre mortos e desaparecidos.

Seis governos democráticos se passaram desde o fim da ditadura chilena.

"O que se avançou foi muita coisa, embora haja uma tarefa pendente (...) A alegria não chega, ainda está pendente", reflete Forch.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)