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Estado de Minas

No Afeganistão, um alcorão de seda para preservar o patrimônio cultural


postado em 23/05/2018 11:00

No Afeganistão, os criadores de um alcorão de seda com suas 610 páginas pintadas a mão esperam que sirva para apoiar a arte da caligrafia, plurissecular, mas ameaçada.

Uma equipe de 38 calígrafos e pintores de miniaturas trabalhou por quase dois anos nessa obra de arte, feita em couro e pesando 8,6 quilos.

A maioria dos artistas que participaram da iniciativa foi formada no instituto da fundação britânica Turquoise Mountain, instalado em um velho caravançará de Cabul restaurado por essa instituição.

"Nossa intenção é garantir que a arte da caligrafia não desapareça neste país. A escrita é uma parte da nossa cultura", disse à AFP o mestre calígrafo Khwaja Qamaruddin Chishti, de 66 anos.

Usada para transcrever o texto sagrado do Corão, a caligrafia recebe um particular respeito nas terras do Islã e entre as artes islâmicas.

"Quando se trata de arte, é difícil pôr um preço... Deus nos confiou esse trabalho [o Corão] e isso é muito mais importante para nós do que o aspecto financeiro", acrescenta Chishti.

Equipados com uma vara de bambu, Chishti e seus calígrafos chegaram a trabalhar até dois dias seguidos em cada página para copiar os versículos sagrados - às vezes até mais se um mínimo erro precisasse levar ao recomeço da tarefa.

Usaram o naskh, a escrita cursiva elementar desenvolvida nos primeiros tempos do Islã, substituindo o estilo kufi, já que é muito mais fácil de ler e de escrever.

É preciso quase uma semana por página para fazer as pomposas decorações que rodeiam os versículos.

Os artistas recorreram apenas a pigmentos naturais, desde a lápis-lazúli moída - a emblemática pedra do país - até o ouro, ou o bronze, para recriar os motivos decorativos clássicos da escola de pintura de Herat, no oeste do país, promovida pela dinastia dos imperadores mongóis timúridas, nos séculos XV e XVI.

- 300 metros de seda afegã -

"Todas essas cores nos foram dadas pela natureza", ressaltou Mohamad Tamim Sahibzada, mestre de miniaturas e responsável pelos ornamentos.

Trabalhar em seda pela primeira vez constituiu um verdadeiro desafio, assegurou Sahibzada na conversa com a AFP. O material, 305 metros de seda 100% afegã, foi previamente mergulhado em uma solução à base de sementes de psílio (Psyllium) para evitar vazamentos de tinta.

A Turquoise Mountain começou a trabalhar em Cabul em 2006, com a restauração do caravançará, tendo como objetivo preservar o patrimônio cultural e artesanal do Afeganistão, muito deteriorado pelas guerras sucessivas.

A fundação protege e perpetua a arte da cerâmica, a marcenaria e o trabalho da madeira, a ourivesaria, as miniaturas e a caligrafia.

A instituição espera que, após esse alcorão, cheguem novas encomendas em torno dos textos islâmicos para poder dar trabalho aos artesãos formados por seu instituto.

"Vamos apresentá-lo em diferentes países muçulmanos e ver se é possível perpetuar os empregos, fazendo que nossos graduados trabalhem em outros alcorães", explicou Abdul Waheed Jalili, diretor desse instituto sem fins lucrativos.

A fundação funciona, graças ao apoio do British Council e do Príncipe Charles, além da agência de desenvolvimento americana USAid.

"Transcrever o alcorão em seda é um trabalho extremamente raro", afirmou o diretor da fundação para o Afeganistão, Nathan Stroupe. Para ele, o projeto é "uma formidável maneira de formar nossos alunos, conforme a tradição e com o mais alto nível de excelência".

"Se um príncipe saudita, ou um colecionador de Londres, se mostrasse interessado, [este alcorão] pode ser vendido, talvez, por entre 100.000 e 200.000 dólares", completou.


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