Jornal Estado de Minas

Israel alerta para conflito prolongado em Gaza

Ataques a campo de refugiados e ao maior hospital de Gaza marcam retomada de combates intensos. Mortes aumentam

Gabriela Walker Rodrigo Craveiro
- Foto: MAHMUD HAMS / AFP

A rápida e frágil trégua humanitária entre Israel e os militantes palestinos cedeu espaço a uma série de ataques letais mútuos e ao temor de uma investida ainda maior contra a Faixa de Gaza. Em declaração à nação, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, alertou que a guerra poderá se alongar e defendeu a desmilitarização do enclave árabe. “Precisamos estar preparados para uma campanha prolongada. Vamos continuar a agir com força e com cuidado até que nossa missão esteja cumprida”, declarou o premiê, que prometeu neutralizar os “túneis de terror”, em referência aos locais usados pelo Hamas para contrabando de armas. Moradores do território palestino receberam mensagens e ligações telefônicas das Forças de Defesa de Israel (IDF, pela sigla em inglês), por meio das quais aconselhavam que fugissem para a Cidade de Gaza, desocupando localidades fronteiriças. Jornalistas estrangeiros foram advertidos a não abandonarem seus hotéis. No início da madrugada de hoje (hora local), explosões e sinalizadores iluminavam o céu de Gaza.

O feriado de Eid al-Fitr, que marca o fim do mês sagrado do Ramadã, foi sangrento. Crianças do campo de refugiados de Al-Shati brincavam em um parquinho improvisado na localidade, às margens do Mar Mediterrâneo, na parte Norte de Gaza.
Por volta das 17h30 (11h30 em Brasília), um foguete atingiu o local, matando oito crianças e dois adultos. Pouco tempo depois, o Al-Shifa, maior hospital da Faixa de Gaza e para onde os mortos e feridos em Al-Shati foram levados, foi alvo de explosões. Um porta-voz do Ministério da Saúde da Autoridade Nacional Palestina afirmou que o terceiro andar do prédio – ocupado por uma unidade de tratamento intensivo e por salas de cirurgia – foi atingido. Ao menos duas pessoas ficaram feridas.

A dona de casa Sally Idwedar, de 30 anos, precisou sair de casa para abastecer a despensa e ouviu de perto a explosão no hospital. Depois de comprar pães perto do Al-Shifa, ela escutou um forte estrondo e foi jogada pelo marido dentro de um táxi. O ataque ocorreu no momento em que carros e táxis chegavam do campo de refugiados de Al-Shati. “Os veículos traziam corpos ensanguentados. Meu Deus! Não posso me esquecer disso. Eram tão pequenos”, relatou.

MORTEIROS O Exército israelense insistiu que morteiros do movimento fundamentalista islâmico Hamas atingiram os dois alvos, mas militantes citados pela TV Al-Jazeera disseram ter coletado estilhaços que comprovariam a origem israelense da munição. “Terroristas em Gaza dispararam foguetes contra Israel. Um deles atingiu o Hospital Al-Shifa e o outro o campo de refugiados de Al-Shati”, publicou as IDF em seu perfil no Twitter. Segundo Israel, mais de 200 morteiros disparados de Gaza caíram no território palestino desde o início da operação Margem Protetora, em 8 de julho.

Foguetes lançados por palestinos contra o Conselho Regional de Eshkol, na fronteira com o enclave palestino, mataram quatro soldados israelenses – em um primeiro momento, foi divulgado que as vítimas eram civis.
Combatentes do Hamas usaram um túnel para invadir a vila de Nahal Oz, na manhã de ontem. Segundo relatos, cinco militantes teriam sido mortos. O Hamas anunciou ter matado 10 soldados inimigos. Israel confirmou a morte de cinco militares ontem, o que eleva para 48 o total de baixas militares. O número é o mais expressivo desde a guerra contra o Hezbollah libanês em 2006, quando 121 soldados morreram. Desde 8 de julho, 1.092 palestinos foram mortos – na madrugada de hoje, sete pessoas, incluindo cinco mulheres e uma criança, não resistiram a um bombardeio contra a cidade de Rafah.

IRRITAÇÃO O secretário de Estado americano, John Kerry, que tentou articular um cessar-fogo na última semana, foi alvo de críticas israelenses. “É um amigo de Israel, mas com amigos assim é preferível, às vezes, negociar com inimigos”, ironizou o editorialista do jornal Yediot Aharonot, Nahum Barnéa. Descontentes com a proposta de Kerry, autoridades e jornalistas classificaram o documento apresentado por ele de “pró-Hamas”.

“Simplesmente não é a forma como aliados tratam um ao outro”, rebateu a porta-voz do Departamento de Estado, Jen Psaki. A conselheira de Segurança Nacional, Susan Rice, reforçou o posicionamento, dizendo que o governo Obama ficou “consternado” com as distorções sobre o trabalho de Kerry. O episódio pode estremecer as relações do Estado judeu com os EUA.

Pedidos de um “cessar-fogo humanitário imediato e incondicional” foram reforçados durante uma reunião do Conselho de Segurança das Nações, em Nova York.
A pressão irritou Netanyahu, que telefonou para o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon. O premiê criticou o texto que, segundo ele “relata as necessidades de um grupo de assassinos terroristas que ataca civis israelenses e não tem respostas para as necessidades de Israel”. Ban destacou que os moradores de Gaza estão cercados e não têm para onde fugir.

Kenneth Roth, diretor-geral da organização não-governamental Human Rights Watch, afirmou que Israel tem o direito a se defender dos foguetes do Hamas, "mas deve fazê-lo de modo consistente com as leis de guerra". Segundo ele, as graves violações das leis de guerra “estão por trás dos desproporcionalmente altos índices de mortes civis entre moradores de Gaza”..