Cientistas anunciaram nesta quarta-feira a adição de duas letras produzidas pelo homem ao código genético que forma o DNA, um feito inédito no mundo.
Eles indicaram ter modificado uma bactéria para que ela incorporasse e replicasse dois ingredientes de DNA que não são encontrados na natureza.
De acordo com eles, o experimento foi concebido para mostrar que o alfabeto do DNA, que existe há centenas de milhões de anos, pode ser expandido por intervenção humana.
Este seria o primeiro passo de um caminho mais longo que pode levar à produção de remédios revolucionários e inovações na nanotecnologia.
O ácido desoxirribonucleico (DNA) é o conjunto de instruções hereditárias que geram e sustentam a vida.
Situada no coração da célula, esta longa moléculao contém uma dupla hélice na forma de um zíper torcido.
A adenina se une à timina para criar o par de base A-T, enquanto a citosina se liga à guanina para formar o par de base C-G.
O novo trabalho, publicado na revista científica Nature, adiciona à dupla hélice um terceiro par de base, produzido pelo homem.
No entanto, as inclusões só sobrevivem com ajuda externa e são removidas do genoma uma vez que esta sustentação é removida.
"A vida na Terra, em toda a sua diversidade, é codificada por apenas dois pares de base de DNA, A-T e C-G", afirmou Floyd Romesberg, do Instituto de Pesquisas Scripps, em La Jolla, Califórnia.
"O que produzimos é um organismo que, de forma estável, compreende aqueles dois, mais um terceiro par de bases não natural", prosseguiu.
- O novo par -
Cientistas trabalharam por quase duas décadas para descobrir novas moléculas que servem como bases novas de DNA, com a finalidade de criar proteínas que nunca existiram antes.
Mas a pesquisa traz muitos desafios.
O novo par de base teria que se ajustar comodamente ao longo de bases naturais do código do DNA e não interromper a replicação ou a transcrição, primeiro passo na criação de uma proteína.
Durante esses processos, o "zíper" do DNA é aberto, segmentos dele são copiados para fornecer um modelo e o zíper volta a se fechar.
Outro problema é garantir que os pares de base inseridos não sejam atacados e removidos pelo mecanismo de reparo de DNA celular.
No novo estudo, os cientistas fizeram uma peça circular de DNA denominado plasmídeo, que continha as combinações naturais A-T e C-G, assim como um bar de base artificial, denominado d5SICs e dNaM.
O plasmídeo foi, então, inserido em uma bactéria comum, a "Escherichia coli".
Mas, então, outro problema veio à tona: como o par de base não existe na natureza, os tijolos moleculares para reproduzi-lo na célula também estão ausentes.
Os cientistas encontraram a resposta ao adicionar estes tijolos à solução na qual a "E. coli" estava em suspensão.
Eles também manipularam geneticamente a "E. coli" de forma que exalasse uma proteína de alga que, como um burro de carga, carregasse estes tijolos através da membrana celular.
O novo plasmídeo recém-criado se replicou suavemente e com poucas falhas - algo essencial para manter o DNA saudável -, e os pares de base artificiais não foram extirpados do código.
O cientista Denis Malyshev reforçou que o processo foi controlado por dois mecanismos: os "tijolos" no fluido e o transportador da proteína.
Sem eles, os novos pares de base saíram do DNA, deixando a bactéria funcionar normalmente com sua combinação A-T, C-G. Em outras palavras, pode não ser possível replicar o código artificial.
O próximo passo será levar as novas letras para o RNA (ácido ribonucleico), um derivado enxuto do DNA que ajuda a produzir proteínas.
Em um comentário também publicado na Nature, os biólogos Ross Thyer e Jared Ellefson, da Universidade do Texas, em Austin, alertaram que os cientistas tinham que responder aos temores do público sobre a manipulação do DNA ou a criação de organismos artificiais.
"Tentativas de expandir o alfabeto genético questionam a ideia da natureza universal do DNA e, potencialmente, despertam críticas sobre a prudência ao manipulá-lo", afirmaram.
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