Jornal Estado de Minas

VIOLÊNCIA URBANA

Crime aumenta medo em estação do Move

Uma mulher, de 51 anos, foi esfaqueada durante assalto quando entrava na Estação Pampulha do Move, no Bairro Jardim Atlântico, em Belo Horizonte, na manhã de ontem. Segundo a Polícia Militar, a vítima seguia para o trabalho quando foi surpreendida pelo criminoso, que aparentava ser um morador em situação de rua. A reportagem do Estado de Minas esteve no terminal e encontrou usuários do transporte coletivo inseguros e que reclamam de falta de policiamento na região.



O assaltante segurou a mulher pelas costas, aplicou um “mata-leão” e acertou uma facada na sua mão enquanto ela tentava se defender. O homem, então, conseguiu pegar o celular e fugiu. Até o fechamento desta edição, ele não tinha sido localizado. A mulher foi socorrida no Hospital Risoleta Neves com ferimentos leves. Durante a tarde, a equipe do EM esteve no local e encontrou manchas e respingos semelhantes a sangue, além de um lenço sujo de vermelho na escada da principal entrada da estação.

A insegurança é tema recorrente para quem utiliza o transporte coletivo em Belo Horizonte, aponta o presidente da Associação dos Usuários de Transporte Coletivo da Grande BH (AUTC), Francisco Maciel, para quem o quadro nas estações é insalubre e inseguro. “As pessoas estão sujeitas não só à violência, como a vítima de hoje, mas também a acidentes”, afirma Maciel, que considera que os itens são “negligenciados” pela gestão municipal. Na visão dele, os usuários dos coletivos só recorrem a esse meio de transporte porque não têm alternativa.

Poliana Glaucia, de 37 anos, doméstica: %u201DPego o máximo de ônibus que consigo para descer perto do meu serviço, porque tem muita gente usando droga aqui. É muito perigoso%u201D


O casal Maria de Fátima, de 55 anos, e Maurício Eustáquio, de 76, que estava na Estação Pampulha na tarde de ontem, concorda. Os dois contaram que estavam pegando ônibus pela primeira vez naquele ponto e que perceberam que o local “não tem segurança”.  “Só voltaríamos se fosse preciso, como agora. Se tiver condições de pegar um táxi, escolhemos ele”, afirmou a mulher.



Segundo a cozinheira Adriana Leite, de 46, dentro da estação há guardas municipais, mas os acessos não são policiados. Ela relembra que utiliza o terminal há anos e não passou por problemas, mas diz que uma amiga teve o celular roubado há pouco tempo, “em plena luz do dia”.

Quem já testemunhou situações de perigo confirma o risco de andar pelas escadas e avenidas próximas, como a doméstica Poliana Glaucia, de 37. Impressionada com o crime de ontem, ela relata o medo de andar no local. “Tem muita gente usando drogas de todo tipo perto das escadas; é muito perigoso. E, como não tem movimento ou policiamento, é fácil eles esconderem e pularem em alguém que esteja indo pegar ônibus”, avalia.

Diante de tantas reclamações diárias, o presidente da AUTC lamenta que “os únicos não-beneficiados pelo transporte coletivo sejam os próprios usuários”. Entre os problemas enfrentados, não estão só as questões de segurança, e ele lista as principais demandas. “Não há benefício nenhum, os usuários só estão ali por obrigação e, como se não bastasse, todas as questões de preço das passagens, insalubridade e transportes precários, ainda são vítimas de violência”, enumera.





Adriana Leite, de 46 anos, cozinheira: %u201DDentro da estação costuma ter guarda, mas nas entradas eu nunca vi. Uma amiga foi assaltada e levaram o celular dela. Precisa de um policiamento melhor, porque sentimos insegurança%u201D

Teia de problemas

O advogado criminalista e pesquisador em segurança pública Jorge Tassi considera que o assalto expõe um problema que é muito maior.  “O que vimos é a ponta de um iceberg”, diz. “A segurança das estações é de responsabilidade das polícias, porém, elas devem ser compreendidas pelo Estado como um ‘espaço de controle’, ou seja, o acesso precisa ser controlado de alguma forma.”

Para entrar nas estações de ônibus de forma legal, o usuário precisa de um bilhete comprado na hora ou cartão de passagem. Apesar disso, quem frequenta o ambiente diariamente constata outra a realidade, como afirmam os cozinheiros Pabline de Lima e Delmo Inácio. “Pegamos ônibus na Pampulha todos os dias e aqui é muito isolado, precisa de mais vigias”, diz Pabline. “Há muitos usuários de drogas próximo às escadas e já vimos, várias vezes, essas pessoas pulando a roleta. Mas nunca sendo retiradas da estação”, completa Delmo.

Bernardo Citavicius, de 24 anos, pesquisador: %u201DUso a estação somente durante o dia. Então, sinto que é seguro. Mas à noite nunca entrei e imagino que seja inseguro%u201D


O pesquisador Jorge Tassi diz que esse espaço deve manter apenas quem tem real interesse em utilizar o serviço e, provavelmente, a pessoa que pratica o crime de roubo não tinha essa intenção. Apesar da necessidade de policiamento, a culpa deve ser dividida com o Estado, para preencher as brechas que se formam sem o controle de acesso.



“Quando há um roubo de celular como esse, é miserável (de baixíssimo valor). A pessoa pega um aparelho de R$ 1 mil ou R$ 2 mil no mercado, mas recebe apenas cerca de R$ 50. O problema está, justamente, na superestrutura que absorve as demandas de crime organizado, que tem possibilidade de receber o aparelho. Ele encontra o celular barato e coloca no mercado como se fosse um produto seminovo ou desmonta para vender as peças”, explica.

Tassi reforça que, se o assaltante não tivesse quem comprasse o celular, não teria cometido o delito. Outro fator de destaque dentro de crimes do tipo, é que, para se submeter a uma ação arriscada, há grande chance de o criminoso ser um dependente químico. “A pessoa não está querendo um celular, ela quer o proveito do aparelho, que vai render pouco dinheiro. Se para ter um celular de R$ 50 está disposta a matar, é insanidade. É um risco muito grande para um proveito muito baixo.”

monitoramento A Prefeitura de Belo Horizonte informou que a Guarda Civil Municipal mantém, todos os dias da semana, uma equipe de quatro agentes na Estação Pampulha, das 6h às 18h. Após esse horário, a atuação da Guarda Municipal é feita com rondas periódicas, em viaturas, nas estações.

A BHTrans afirma que as estações de integração do Move contam com vigilantes, que se revezam em turnos durante 24 horas, e com a Guarda Municipal que realiza rondas diárias em todas as estações. “Nas estações do Move, em caso de ocorrência, os passageiros podem procurar os vigilantes, os agentes da BHTrans e da Sumob e a Guarda Municipal”, afirma, em nota.

A reportagem entrou em contato com a Polícia Militar para verificar qual é o esquema de policiamento no entorno de estações de transporte coletivo, mas não obteve retorno.