Jornal Estado de Minas

PATRIMÔNIO

Órgão histórico e único no mundo é alvo de embate em igreja de Tiradentes

A publicação em redes sociais e na revista Concerto, especializada em música clássica, e no endereço eletrônico Change, sobre suposto uso e manuseio de órgão histórico na Paróquia de Santo Antônio, em Tiradentes, por pessoas inabilitadas,  provocou reações na igreja que pertence à Diocese São João del-Rei, na Região do Campo das Vertentes.





Em carta aberta, o organista Robson Bessa, que a convite do Câmpus Tiradentes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), realizava concertos no órgão histórico abrigado pela igreja, entre 2019 e julho de 2022, aponta situação crítica que envolve o uso e preservação do instrumento.

O órgão foi construído na cidade do Porto, em Portugal, pelo organeiro português Simão Fernandes Coutinho e inaugurado em 1788. Em 2009, passou por uma ampla restauração supervisionada por Elisa Freixo, considerada uma das mais importantes organistas do Brasil.

Em 2019, Elisa deixou o trabalho que realizava por uma década na cidade, em razão de discordâncias com a direção da paróquia, conforme noticiado à época na revista Concerto.



Segundo a artista, o padre Álisson André Sacramento afirmou que havia a "necessidade de dar apoio aos músicos da cidade de Tiradentes e da região, que até então não tinham acesso ao órgão", e que "foram feitas reuniões com as partes interessadas, onde se estabeleceu um critério democrático no uso do órgão".

A discordância desses critérios por parte da organista foi manifestada publicamente, e ela decidiu por se afastar. 

Elisa morou na região por mais de três décadas, pouco depois de retornar dos estudos na Europa, e se tornou a organista oficial da Sé. Procurada, a organista disse que já se passaram três anos e que sua posição foi manifestada à época de seu afastamento.

Em documento público, Robson Bessa reclama de "reiterados"aumentos na porcentagem da bilheteria que deve ser repassada à paróquia, dirigida pelo padre Álisson André Sacramento. "Não concordamos e por isso passamos a ser perseguidos, e então descobrimos que a democratização do órgão era uma farsa." 

Bessa alega que o órgão está sendo destruído: "Com a reabertura para casamentos, inúmeras pessoas tiveram acesso ao coro e começaram a mexer com o fole, que não tem uma proteção adequada. Reiteradas vezes alertei os responsáveis, que nada fizeram.  Além disso, o órgão tem sido tocado por pessoas que nunca tiveram uma formação específica, e por todos esses motivos, uma tecla está com sérios problemas de entoação. A administração atual e o uso caça niqueis do órgão está destruindo rapidamente um instrumento histórico de mais de 240 anos."





O músico e organista disse que se reuniu virtualmente com Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que ficou de fazer uma vistoria. E acionou o Ministério Público (MP), que ainda não se manifestou.

Robson Bessa organizou, em julho deste ano, um festival para formação de jovens e adultos a partir de 15 anos para tocar o instrumento, que é único. "Não é um instrumento qualquer, criamos um movimento com apoio da comunidade e das autoridades de Tiradentes para formação de organistas e cravistas. Aquele órgão requer perícia única, são afinação e estética barroca totalmente únicas."

O músico reclama que foi boicotado durante o festival. Ele atribui o boicote "à ganância do padre, que decidiu aumentar a porcentagem recebida na bilheteria arrecadada nos concertos públicos de 45% para 70%, o que tornou os concertos inviáveis. A igreja nunca investiu nada nem anunciava os eventos. O mais grave é que o padre aceita pessoas despreparadas para tocar o órgão, são pianistas, não organistas, como ele fala em seu site. Não existe um único órgão como esse em todo o mundo. A paróquia abriu para casamentos e os músicos ficam no coro, onde está abrigado o fole, que não tem qualquer isolamento. Vi cadeiras embaixo dos bastões do fole que o travavam, o que pode provocar explosão e se isso acontecer não haverá outro igual."





Em nota oficial, a Paróquia de Santo Antônio, classificou como falsas as denúncias quanto ao repasse e afirma que o organista "repassou dos concertos executados por ele 30% da bilheteria à paróquia, ficando o mesmo com os 70% restantes. Lembrando que os custos com funcionários, limpeza, energia elétrica, a manutenção do órgão dentre outros, ficam a cargo da Paróquia." 

Segundo a nota, houve um "início de diálogo entre o Conselho Administrativo Paroquial e os organistas autorizados que se apresentam nas noites de Concerto," sobre divisão de recursos arrecadados com retirada de percentual com propósito de criação de um fundo próprio do instrumento para "arcar ou minimizar os custos com visitas técnicas, manutenções preventivas e eventuais manutenções corretivas do instrumento, uma vez que os custos destes serviços são extremamente elevados, devido à singularidade do órgão que exige escassa mão de obra qualificada." E que o acesso ao fole é restrito e conta com sistema de vídeo monitoramento como em toda a igreja. 

A nota diz ser "mentira" as acusações de interferências da Paróquia na busca de maiores percentuais de repasse. "Registramos que o organista motivador dessa nota não era o único músico autorizado a tocar o instrumento."

E reitera ser "inconcebível imaginar que deixaríamos um instrumento singular de 240 anos sem os devidos cuidados de preservação. Por isso iniciamos o diálogo sobre a criação do fundo financeiro ao órgão oriundo de um percentual da bilheteria dos concertos".





Leia a íntegra da Nota Oficial Paróquia de Santo Antônio


"A Paróquia de Santo Antônio, na cidade de Tiradentes - MG, vem, por meio desta, manifestar-se sobre as falsas acusações publicadas no endereço eletrônico www.concerto.com.br, matéria com data de 11 de agosto do corrente ano, com o título "Uso inadequado ameaça órgão histórico de Tiradentes" bem como a carta aberta publicada na internet e ao abaixo assinado organizado pelo sr. Robson Bessa Costa, no endereço eletrônico www.change.org.

Primeiramente, sobre a supracitada matéria publicada no site www.concerto.com.br  causou-nos estranheza tal publicação, uma vez que não ocorreu nenhum contato com a Paróquia dando-lhe o direito do contraditório ou mesmo para buscar veracidade nas vãs acusações, conforme primícias do bom jornalismo e do bom senso. Importante registar que a Revista Concerto, no conteúdo da matéria registra que entrou em contato com a organista Sr.ª Elisa Freixo, porém, como já dito, a revista furtou-se de buscar contato com a Paróquia e ou com o pároco, as verdadeiras partes interessadas, uma vez que são os alvos das falaciosas acusações. Logo, a referida matéria baseia-se tão somente na carta divulgada pelo organista, tornando-se por tanto carente de apuração dos fatos, tornando a mesma sem nenhuma credibilidade.

Com relação às falsas acusações e alegações feitas pelo citado organista em suas redes sociais e no site www.change.org afirmamos que:

Sobre a queixa de reiterados aumentos repassados na porcentagem da bilheteria à Paróquia a mesma não prospera pois o organista repassou dos concertos executados por ele 30% da bilheteria à Paróquia, ficando o mesmo com os 70% restantes. Lembrando que os custos com funcionários, limpeza, energia elétrica, a manutenção do órgão dentre outros, ficam a cargo da Paróquia. A falsa alegação induz o leitor ao erro, levando-o a crer que havia constantes interferências da Paróquia na busca de maiores percentuais de repasse o que é uma mentira. Registramos, que o organista motivador dessa nota, não era o único músico autorizado a tocar o instrumento. Uma simples conferência com os demais organistas autorizados derruba tal narrativa.





O que ocorreu na verdade, foi o início de um diálogo entre o Conselho Administrativo Paroquial e os organistas autorizados que se apresentam nas noites de Concerto, sobre uma nova proposta da divisão da bilheteria, buscando equilíbrio na divisão, tornando-a exequível para as partes, e principalmente, a retirada de um percentual em favor do próprio instrumento, com o intuito da criação de um fundo financeiro ao órgão oriundo da receita levantada nos concertos, visando arcar ou minimizar, os custos com visitas técnicas, manutenções preventivas e eventuais manutenções corretivas do instrumento, uma vez que os custos destes serviços são extremamente elevados, devido à singularidade do órgão que exige escassa mão de obra qualificada.

Com relação à acusação de que as pessoas com acesso ao coro mexem no fole a mesma é infundada e registramos, para os devidos fins, que o acesso ao coro é restrito e o mesmo conta com sistema de vídeo monitoramento bem como toda a igreja.

Com relação à tecla do órgão, que o mesmo registra estar com "sérios problemas", temos documentos datados de 20 de setembro de 2019, onde está registrado que havia o problema em 2 flautas que funcionam de forma irregular, mas não prejudicam o resultado final, o documento ainda sugere que não haveria a necessidade de chamar um organeiro para resolver apenas esta questão sugerindo que quando o organeiro estivesse no Brasil poderíamos chamá-lo para resolver, como descrito no documento, "essa pequena pendência".





O documento em questão é assinado pela organista Sr.ª Elisa Freixo, citada na matéria, e que em 2009 supervisionou o restauro do mesmo. Logo não se pode atribuir o problema de entoação na tecla a qualquer tipo de negligência por parte desta Paróquia ou à dos atuais organistas, incluindo o autor do texto que aqui refutamos. Aproveitamos para registrar que em 2019, diferente do que consta no texto de autoria do Sr. Robson, a então organista do órgão da Matriz não foi expulsa. Pelo contrário, temos por total respeito pela grande organista que é e temos ciência de que a mesma muito corroborou para o restauro e preservação do órgão durante o período que aqui esteve.

Ficamos perplexos com o tratamento dado pelo organista em sua carta ao pároco bem como aos seus pares. Uma vez que o número de organistas autorizados a tocar o órgão da Igreja Matriz é muito reduzido e sendo o mesmo feito por músicos devidamente qualificados, os mesmos que nos últimos anos dividem as apresentações dos concertos com o organista.

Sobre a foto utilizada nas redes sociais do organista e no site www.change.org.

A foto divulgada pelo autor das acusações mostra o fole do órgão da Matriz abaixado sobre uma estante, tal imagem atesta o erro do próprio organista que ligou o motor do instrumento fazendo com que os foles abaixem automaticamente, sem o cuidado de observar primeiramente se havia algum obstáculo no caminho. Procedimento padrão antes de ligar o motor que envia ar para o órgão e os foles. Normalmente as manivelas ficam para cima quando o motor está desligado. Ao invés de fotografar e utilizar da foto, buscando desmerecer a Paróquia e ou os demais organistas autorizados a utilizar o órgão, deveria o organista ter tido o cuidado de observar essas questões mínimas do bom uso do instrumento. Contudo, como medida de segurança, já estamos providenciando um melhor sistema de isolamento nas proximidades à área dos foles, evitando assim a colocação de qualquer objeto que venha a atrapalhar ou danificar as manivelas do fole.





As atuais ações e realizações do pároco e do Conselho Administrativo da Paróquia de Tiradentes demonstram um grande apreço, zelo e preocupação com todo o patrimônio tombado sob sua guarda. Haja vista as muitas restaurações e ações feitas em prol do acervo da Matriz de Santo Antônio, como por exemplo: restauração da Capela do Santíssimo Sacramento, concluída em abril de 2020, limpeza de todo forro artístico das dependências laterais, concluída em agosto de 2020, restauração do Consistório dos Passos, concluída em maio do corrente ano, quase toda imaginária da mesma Matriz, e agora está em andamento a restauração do altar colateral de Nossa Senhora do Terço, tendo sido descoberta neste uma importante obra artística, até então desconhecida dos nossos contemporâneos.

Diante do acima exposto é inconcebível imaginar que deixaríamos um instrumento singular de 240 anos sem os devidos cuidados de preservação. Por isso iniciamos o diálogo sobre a criação do fundo financeiro ao órgão oriundo de um percentual da bilheteria dos concertos. Onde contraditoriamente às suas acusações, o organista foi contra, alegando que "esse tipo de instrumento não estraga fácil". Para fins de registro e conhecimento dos que realmente se preocupam com o nosso patrimônio, a Paróquia agendou, no início do corrente ano, visita técnica com o organeiro responsável pela restauração do órgão, aproveitando a sua vinda ao Brasil. Visita técnica que será realizada agora, no mês de setembro, e custeada integralmente por esta Paróquia.

Por fim, repudiamos veemente as acusações infundadas e falaciosas, bem como as injúrias e difamações propagadas pelo organista à pessoa de nosso pároco. Nenhum tipo de insatisfação pessoal, justifica tal postura. Afirmamos não existir nenhum tipo de perseguição ao organista, autor da carta que baseia a citada matéria. Seu desligamento se deu por uma série de situações, como a falta de transparência na prestação de contas, mal comportamento no interior da igreja, por faltar com respeito a funcionários da Paróquia, bem como a outros organistas, permitiu o uso do órgão a terceiros no dia de sua apresentação, sem prévia autorização. Tudo isso foi tornando a sua permissão ao uso do órgão insustentável. Fato, é que, o organista se põe no papel de perseguidor quando lança campanha difamatória, propaga "fake news" dizendo que não haverá mais concertos ao órgão na Matriz (A paróquia e os demais organistas estão recebendo inúmeras mensagens de pessoas preocupadas dizendo que o autor das acusações tem informado que não mais haverá os concertos) a postura adotada é tão desconcertante que o mesmo termina o texto de seu abaixo assinado no site www.change.org da seguinte forma: "Convoco a todas e a todos a combaterem o fascismo e a avareza do Pe. Alisson do Sacramento!!".





Esperamos que o mesmo possa fazer um sincero exame de consciência e repensar as atitudes tomadas. Manifestamos aqui que a Paróquia, por meio de seu Conselho Administrativo, se coloca pronta ao diálogo a todos que assim desejarem. Nossa real intenção nesta nota é trazer os verdadeiros fatos, sob a luz da verdade, ao conhecimento de todos.

Contudo solicitamos o nosso direito de resposta junto ao site www.concerto.com.br e informamos que este Conselho Administrativo estuda a possibilidade de tomar as devidas providências jurídicas cabíveis diante das graves acusações públicas feitas à "instituição", bem como as calúnias pessoais proferidas pelo organista.
Tiradentes, 19 de agosto de 2022."