Jornal Estado de Minas

DESPEJO

Ocupação Vila Maria: moradores vivem tensão com ordem de despejo


Os moradores da ocupação Vila Maria, na Região Oeste de Belo Horizonte, estão assustados em razão de uma ordem de despejo que pode ser cumprida a qualquer momento pela Polícia Militar. As 120 famílias que habitam o local aguardam para saber quais serão seus destinos.



Segundo Samuel Costa, 51 anos, coordenador da ocupação Vila Maria, os moradores estão assustados e apreensivos. “É uma tortura o que estão fazendo. Estamos aqui, só os moradores, cerca de 45 pessoas. Famílias não foram trabalhar, crianças estão assustadas. A qualquer momento a polícia pode chegar”.

Nessa segunda-feira (20), o Tribunal de Justiça de Minas Gerais emitiu uma ordem judicial de reintegração de posse, após requerimento da Prefeitura de BH. No parecer do juiz, o território é considerado parte do Parque Jacques Cousteau, de propriedade do município, que integra uma Área de Preservação Permanente.

Porém, de acordo com Vera Lúcia de Andrade, cabeleireira e moradora da Vila Maria, o terreno é uma propriedade privada da Continental Materiais de Construção. O antigo dono da empresa, Eduardo Frizzola, teria concedido o uso do espaço - em documento assinado em cartório - há 20 anos, para uma mulher, a Dona Maria, que trabalhou para ele por décadas. Desde então, outras famílias foram ocupando o terreno, com aval da primeira moradora.



Em novembro de 2021, um número maior de famílias chegou ao local até somarem um total de 120 no terreno, com cerca de 300 moradores. Vera afirma que a terra era improdutiva, sem cuidados. Após a chegada dos ocupantes, a prefeitura passou a reivindicar o território como seu.

“Até agora ninguém mexeu porque está bem claro que a área não é parte do parque. A área era cuidada pela família , sem nenhuma manutenção da prefeitura – o parque eles cuidam, tem trabalhadores que fazem a manutenção. Agora que viram uma quantidade de gente crescendo, incomodou”.
 

Imbróglio jurídico


Conforme Cláudia Amaral, promotora de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais, o juíz considerou a área como pública com base nos documentos juntados pela PBH, sem perícia técnica própria. Os moradores apresentam um documento particular do proprietário autorizando a permanência deles, mas o Executivo entende que essa autorização é em uma área diversa da do parque.



“Daí a confusão. O juíz não quer discutir isso no processo. Ele entende que essa discussão deve ser feita em um processo próprio”, afirmou Cláudia.

“Queremos uma perícia do terreno. Pra ver se realmente é um terreno da prefeitura. Nós temos documentos, declarações da antiga Continental Material de Construção, registrado em cartório de Belo Horizonte, com matrículas que aparecem como terreno privado e não público. Sem falar na família que mora aqui há 40 anos. Como estão morando no parque se tem portão, casas, estrutura?”, destacou o coordenador Samuel Costa.
 

Acolhimento das famílias


Em nota, a Prefeitura de Belo Horizonte informou que “fornecerá o auxílio-moradia, até o reassentamento dos ocupantes com moradia consolidada, e também o auxílio pecuniário no valor de R$ 500,00, por 6 seis meses, aos demais ocupantes da área, desde que comprovada a vinculação da família à edificação e limitada a um abono por edificação”.

No entanto, a PBH reconhece somente nove edificações recentes, além das três famílias que moram no terreno há muitos anos. Com isso, a comunidade questiona o que as demais 112 famílias farão após o despejo.

“É a especulação imobiliária. Querem tirar o povo pobre para abrir a janela e ver o parque, e não o povo humilde”, lamentou Samuel. “Ao invés de o Estado garantir o direito à proteção, inclusive das crianças , estão fazendo o contrário, tirando todos os direitos das crianças à liberdade, educação, convivência familiar. Quem está violando os direitos é o Estado”, acrescentou.

*Estagiário sob supervisão do subeditor Rafael Arruda