Jornal Estado de Minas

SAÚDE PÚBLICA

Portaria do Ministério da Saúde pode prejudicar atendimentos em Sete Lagoas

O Ministério da Saúde publicou em 17 de dezembro, no Diário Oficial da União, uma Portaria que altera a tabela de valores dos procedimentos, medicamentos, órteses, próteses e material especial para atendimento a casos de Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) no Sistema Único de Saúde (SUS), bem como implantes de marcapassos e outros procedimentos em Alta Complexidade Cardiovascular.



A portaria vai entrar em vigor neste sábado (1°/1) e pode prejudicar os procedimentos de urgência e emergência cardiológica da cidade de Sete Lagoas, na Região Central do estado.
 
Desde a publicação da nova norma, a Angiosete Sociedade Médica Ltda., empresa contratada pela Irmandade de Nossa Senhora das Graças (INSG) para o atendimento a urgências e emergências cardiológicas a pacientes dos SUS de Sete Lagoas e região, já foi formalmente informada, por diversos fornecedores, sobre a interrupção do fornecimento de insumos a partir de janeiro de 2022, em função da incompatibilidade da tabela proposta pela portaria.
 
Na prática, a portaria determina uma redução de cerca de 50% no valor repassado pela União para a compra de material indispensável à realização dos procedimentos. A norma prevê uma redução de recursos que ultrapassa os R$ 290 milhões.
 
Segundo a prefeitura, o valor de investimento para implantação de marcapasso multissítio, por exemplo, teve um reajuste para baixo de R$ 15.720,16 para pouco mais de R$ 8 mil.

No caso dos stents farmacológicos, dispositivos utilizados para desobstrução de artérias coronárias, o valor repassado, que era de R$ 2.034,50 caiu para R$ 844,73, uma redução de quase 60%, insuficiente para a realização do procedimento.




 
Na portaria, publicada no Diário da União, o Ministério da Saúde explica que a alteração não proporcionará ônus à pasta, tendo, ainda, o potencial de gerar a otimização dos recursos públicos, já que eles serão deduzidos do Limites Financeiros de Média e Alta Complexidade dos Estados, Distrito Federal e Municípios, para serem aplicadas nas políticas da atenção especializada.
 
Por meio de nota, a Secretaria Municipal de Saúde da cidade, bem como a INSG afirmam que se mantêm comprometidas e empenhadas em garantir a continuidade do serviço, desde que haja condições de equilíbrio econômico-financeiro e probidade administrativa. No entanto, diante da manifestação de empresas fornecedoras de insumos, a continuidade do serviço está severamente ameaçada.
 

Impacto da norma no município

 
Com o risco de descontinuidade do serviço de urgência e emergência cardiológica, o secretário municipal de Saúde, e também médico, Flávio Pimenta, se reuniu com  Antônio Bahia, responsável técnico pela Angiosete, e com a INSG para cobrar do Ministério da Saúde uma solução para o problema.




 
“Enviamos um ofício conjunto à pasta, dando ciência também ao Ministério Público e à Secretaria de Estado da Saúde sobre o risco que nosso serviço corre, caso a União não volte atrás nessa decisão de reduzir os valores pagos pelos insumos. Como o serviço não atende apenas a pacientes de Sete Lagoas, é impossível para o município arcar com os custos da totalidade dos insumos sem se comprometer econômica e financeiramente, e sem incorrer em atos de improbidade administrativa”, declarou o  Flávio Pimenta.
 
De acordo com Antônio Bahia, a suspensão dos serviços de alta complexidade cardiovascular em Sete Lagoas representa um risco iminente de morte para pacientes com quadros cardiológicos graves, como é o caso daqueles que sofrem Infarto Agudo do Miocárdio.
 
“O infarto é a principal causa de mortes no mundo. Quando o paciente recebe atendimento imediato, e esse atendimento, no caso, é a intervenção cardiológica que realizamos aqui, suas chances de morte se reduzem em cerca de 34%. Entre 2019 e 2021, 1.425 casos de síndrome coronariana aguda foram atendidas no serviço, esse montante se refere tanto a pacientes de Sete Lagoas quanto de outros 24 municípios da região. A suspensão da assistência, decorrente das mudanças na tabela de preços pagos pela União, é uma sentença de morte para grande parte desses pacientes”, explica.




 
Importantes entidades ligadas à saúde, como a Sociedade Brasileira de Cardiologia, a Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista e a Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular já se manifestaram publicamente alertando as autoridades federais sobre efeitos da Portaria para a assistência a pacientes do SUS em todo o país.
 
 

Atendimento no município

 
Segundo a prefeitura, o serviço de urgência e emergência cardiológica oferecido a pacientes do SUS de Sete Lagoas é referência no Brasil e também já foi reconhecido internacionalmente, já que nem todas as cidades-pólo de saúde possuem o que é conhecido como unidades “porta aberta” para casos infarto agudo do miocárdio.
 
Por meio de contratualização entre a Secretaria Municipal de Saúde de Sete Lagoas e o Hospital Nossa Senhora das Graças, 100% dos casos são atendidos gratuitamente, 24 horas por dia, sete dias por semana.




 
De acordo com o Antônio Bahia, um paciente com sintomas de IAM que reside na capital ou na região metropolitana é, primeiramente, encaminhado para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), onde recebe os primeiros cuidados e aguarda vaga em um serviço especializado em hemodinâmica.

Diferentemente disso, pacientes de Sete Lagoas e da região já são acolhidos na unidade especializada a qualquer hora do dia ou da noite, em qualquer dia da semana.
 
“Esse acolhimento precoce, que permite a intervenção de alta complexidade na fase mais grave do episódio de infarto, pode representar a chance de sobrevivência a esses pacientes. Então esse é o risco que nossa população está correndo”, explica o médico, que em 2019 recebeu um título de honra da Sociedade Europeia de Cardiologista, honraria prestada a pouco mais de quatro mil médicos em todo o mundo, pela estruturação do serviço em Sete Lagoas.
 
 

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