Jornal Estado de Minas

PANDEMIA

Desigualdade social reflete na vacinação contra a COVID em Minas


A vacinação de ciclo completo contra o novo coronavírus (Sars-CoV-2) em Minas Gerais é um processo desigual e que segue as condições sociais predominantes nas regiões do estado. A imunização total necessária para combater a gravidade da COVID-19, seja por doses únicas (vacina da Janssen) ou duplas,  chega com muito menor abrangência nas regiões mais pobres, sobretudo Norte, Jequitinhonha e Mucuri. A maior parte das 89 microrregiões de saúde mineiras já concluiu entre 80% e 89% da imunização de pessoas acima de 12 anos, somando 41 desses conglomerados de municípios, segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) da última quarta-feira (15/12). 





Contudo, 10 ainda não conseguiram nem sequer chegar aos 70%. Sendo uma microrregião no Vale do Rio Doce (Itambacuri), quatro nos vales do Jequitinhonha e Mucuri (Almenara, Nanuque, Padre Paraíso e Pedra Azul) e cinco no Norte de Minas (Brasília de Minas, Coração de Jesus, Francisco Sá, Salinas e Taiobeiras). Por outro lado, sete estão acima de 90%.

Confira infográfico com os destaques positivos e negativos da vacinação em Minas

Enquanto a média mineira é de 82,51% de abrangência de ciclo completo de vacinação, 52 microrregiões estão abaixo desse índice. O infectologista Dirceu Greco, professor da Faculdade de Medicina da UFMG e presidente da Sociedade Brasileira de Bioética, destaca que a Organização Mundial da Saúde (OMS) é categórica em afirmar que ninguém está seguro até que todos estejam seguros.

“Quando sobram pessoas não vacinadas, por não ter chegado a hora, não ter a vacina disponível ou não terem ido receber a aplicação, mantém-se o vírus em circulação. Enquanto não estivermos perto dos 100% vai ter sempre alguns buracos que o vírus vai se aproveitar para se manter entre nós. É importante também a vigilância nos locais onde a cobertura está baixa, para que se possa intervir nos surtos”, afirma greco.





A pior é a Microrregião de Taiobeiras, no Norte de Minas, onde os dados mostravam alcance de 61,17% para ciclo completo vacinal. O que parece ruim se mostra ainda mais preocupante, pois, dentro da região, o município de Rio Pardo de Minas, o segundo mais populoso, com 31.171 habitantes, exibe 46,10% de cobertura de dose única ou duas doses e 74,78% relativas à primeira e incompleta aplicação dos imunizantes, segundo a SES-MG.

Observando a campanha no município por meio das médias móveis semanais de vacinação aplicada diariamente, em Rio Pardo de Minas o processo se iniciou irregular, mas declinou de forma consistente a partir de setembro. Em julho, a média móvel chegou ao ápice com 2.077 doses diárias aplicadas. Em 10 de agosto, chegou a 1.072 e iniciou seu declínio a seguir, mantendo um patamar variável de 350 a 150 aplicações médias a cada 24 horas, com o dado mais atual mostrando a média ministrada em 323,5 doses.

Baixa procura tem motivos variados

O principal problema tanto no município quanto na microrregião, segundo a coordenadora de imunização de Rio Pardo de Minas, Érica Santana de Sá Fiuza, tem sido as pessoas procurarem os centros de saúde para ser vacinadas. “Estamos muito preocupados, pois realmente a segunda dose e o reforço não estão sendo procurados pela população. Fizemos publicidade, campanhas em zonas rurais para aumentar essa porcentagem. Nosso público-alvo é de mais de 25 mil pessoas, mas boa parte está na zona rural, que é muito extensa, apesar de termos seis unidades de saúde nessas localidades”, afirma.





De acordo com a coordenadora, o público que mais falta é o dos mais jovens e adultos de 18 a 45 anos. “São vários os motivos. Ou por receio das reações da AstraZeneca ou mesmo porque tivemos muitas cheias de rios que deixaram comunidades sem acessos ou com dificuldade de circulação por causa das chuvas. Mas não são impossíveis de atingir e estamos com uma programação para isso. Conseguimos já fazer 600 aplicações em dois dias e isso deve subir a nossa média”, espera a coordenadora.

Em Minas Gerais, onde se atingiu 91,43% de aplicação de primeiras doses e 82,51% dos ciclos completos, a vacinação engrenou a partir de maio, deixando o patamar vacinal de 45 mil aplicações médias diárias para mais de 100 mil, até julho, e 200 mil até novembro, sendo que o pico dessa média móvel foi em 20 de outubro, quando se registraram 331.368. À medida que o estado se aproximou dos 80% de segundas doses, a vacinação caiu para a média móvel de 81.838 doses aplicadas em 13 de dezembro, segundo dados da SES-MG.

A segunda microrregião mineira com pior cobertura vacinal tanto de primeira dose quanto de ciclo completo por aplicação única ou dupla é a de Francisco Sá, no Norte de Minas. Foram 76,13% de pessoas que receberam pela primeira vez a vacina e 61,59% com imunização concluída. Os piores índices são em Josenópolis, de 4.911 habitantes, com 61,39% de vacinação parcial e 47,47% completa, e Botumirim, de 6.259 habitantes, com 81,85% e 58,18%, respectivamente. A reportagem não conseguiu contato em Josenópolis, mas a prefeita de Botumirim, Ana Pereira Neta, a Naninha (PSC), garante que esforços recentes resultarão em maior abrangência, sendo que parte dos resultados ainda não apareceram no sistema nacional que reúne os dados.





“Realmente, está tendo pouca procura da população. Antes, estávamos recebendo pequenas quantidades de doses de vacinas e na segunda-feira recebemos mais de 600 doses, e isso vai ajudar a melhorar. Mas é importante frisar que não deixamos de fazer a busca ativa pelas pessoas que precisavam de reforço e também realizamos a publicidade sobre isso”, afirma a prefeita. Segundo ela, os motivos para a baixa procura são variados. “Tem de tudo um pouco. Há pessoas que ainda têm a superstição e têm medo de introduzir o vírus no corpo, ou porque sentiram os efeitos adversos antes não querem mais agora, e até quem acha que com a primeira dose já está tudo resolvido ou porque perdeu o seu dia de ir e depois não se lembrou mais”, cita Neta.

Irregularidade

Apesar de ter uma cobertura razoável de primeiras doses, com 81,85%, Botumirim se manteve irregular durante toda a campanha vacinal, com picos e vazios de aplicação de doses. Em 15 de julho de 2021, chegou a registrar 221,2 aplicações médias por dia, batendo o pico de 229 em 8 de setembro, mas, atualmente, o último dado médio era de 56,8. O município de Francisco Sá, o maior da microrregional, com 24.911 habitantes, apresentou uma crescente de aplicações ao longo do ano até 9 de agosto, quando atingiu o pico de doses ministradas, com média de 1.601,2, mas, daí em diante, despencou, chegando a 75,25 doses em 8 de novembro e, atualmente, ao patamar estável e em baixa de 56 aplicações médias, em dezembro.

Já Josenópolis, que tem os piores índices, apresentou desde o início da campanha de vacinação um ritmo de aplicações que nunca foi alto, jamais chegando à média de 100 diárias, e seguiu irregular durante todo esse período, segundo a SES-MG. O ápice ocorreu em 1º de julho, quando se chegou a uma média móvel de 82,80. Em 17 de novembro, outro pico registrado cravou a média em 78,25 aplicações, mas o dado mais recente foi de 19,8.





A SES-MG informa que atualmente há vacinas suficientes para o atendimento da população-alvo da Campanha Nacional de Vacinação contra o novo coronavírus. “Entre as competências da esfera municipal está a coordenação e a execução das ações de vacinação integrantes do Programa Nacional de Imunizações, incluindo a vacinação de rotina, as estratégias especiais (como campanhas e vacinações de bloqueio) e atualmente a disponibilidade da vacina contra a COVID-19 está de acordo com a demanda de cada município. Ou seja, o município sinaliza para a Unidade Regional de Saúde o quantitativo de doses necessárias para o atendimento da população”, informou a administração da Saúde estadual.