Jornal Estado de Minas

REFLEXOS DA PANDEMIA

Hábitos alimentares dos brasileiros mudaram durante o isolamento social

O aumento significativo no consumo de fast food, pães e refeições instantâneas; a diminuição da ingestão de frutas e vegetais; e o crescimento das refeições noturnas são algumas das mudanças ocorridas nos hábitos alimentares e no estilo de vida dos brasileiros a partir do isolamento social ocasionado pela pandemia da COVID-19.





A constatação foi feita por meio de pesquisa realizada por um grupo de profissionais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal de Lavras (UFLA), Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e Universidade Federal de Viçosa (UFV) e publicada na revista internacional Public Health Nutrition. A coleta de dados foi feita no auge da pandemia, em 2020.

O artigo intitulado “Lifestyle and eating habits before and during Covid-19 quarantine in Brazil” (traduzido como ‘Estilo de vida e hábitos alimentares antes e durante a quarentena de Covid-19 no Brasil’) foi publicado em junho deste ano.

O estudo, que contou com a participação de mais de mil voluntários on-line, revelou também que, com exceção do jantar e do lanche da tarde, o consumo de refeições mudou visivelmente em comparação com o período anterior ao distanciamento social.





Os participantes da pesquisa relataram que, durante a pandemia, passaram a consumir com menor frequência o almoço e lanches no café da manhã. Por outro lado, observou-se uma maior frequência de lanches noturnos e de outras refeições.

Mudança no estilo de vida

Além disso, a pesquisa observou diferenças significativas em aspectos do estilo de vida dos brasileiros, como o consumo de álcool, tabagismo, tempo de sono, tempo de tela (período de utilização de dispositivos de tecnologia digital) e a realização de atividades físicas. 

Os resultados mostraram um aumento na frequência de consumo de bebidas alcoólicas (com certa redução na dose), um certo aumento na frequência de tabagismo, um aumento de horas no período de sono e no tempo de tela e uma visível redução na prática semanal de atividades físicas em termos de frequência e minutos.




De acordo com o estudo, o aumento da frequência do consumo de álcool, por exemplo, pode estar associado a uma tentativa das pessoas de combater o estresse, o tédio e até mesmo possíveis emoções negativas decorrentes do isolamento. 

Já o aumento do tempo de tela (que inclui computadores, televisões, tablets e celulares) pode ser justificado pelo fato de que mais da metade dos entrevistados relataram que, durante a pandemia, seu tempo de trabalho aumentou. Além disso, muitos dos participantes estão estudando ou trabalhando remotamente em período integral ou parcial. 

Sobre a redução na prática de atividades físicas, percebe-se que essa é uma mudança ocasionada pela dificuldade de praticar exercícios, já que, com as medidas de segurança, academias, parques e centros de treinamento e de recreação foram diversas vezes fechados. A falta de equipamentos necessários e de orientação profissional também dificultam a prática de atividades físicas em casa.





Menos refeições diurnas

Com a análise dos resultados, a equipe responsável pelo estudo conseguiu observar como as medidas de isolamento adotadas no Brasil provocaram diversas mudanças no cotidiano das pessoas.

De acordo com Marina Martins Daniel, uma das responsáveis pela pesquisa, observar a redução no desempenho das refeições diurnas e o aumento no desempenho das refeições noturnas, dentre essas tantas outras mudanças, evidencia a necessidade de estudos que investiguem as repercussões da pandemia em diversos aspectos. 

“O distanciamento físico e social é uma medida de segurança altamente recomendada pelas autoridades de saúde. Porém, pesquisas realizadas com populações de outros países já vêm mostrando como essa medida pode acabar afetando a vida e os hábitos das pessoas. Para nós, brasileiros, não foi e nem poderia ser diferente”, diz a pesquisadora. 





Marina também comenta que diversos fatores podem justificar as alterações nos hábitos alimentares dos brasileiros, que, mesmo estando em casa, passaram a consumir alimentos menos saudáveis. 

“Durante a pandemia, muitas pessoas provavelmente passaram a procurar por alimentos mais reconfortantes. Quando essa pesquisa foi realizada, estávamos no auge da pandemia e quase tudo estava sob lockdown. Muitos estudos já mostraram que ficar em casa pode desencadear ou agravar quadros ou episódios de ansiedade e depressão nas pessoas, o que pode contribuir para essa alteração no comportamento alimentar, já que as pessoas podem passar a consumir alimentos que são ricos em açúcares e gorduras e que remetem a uma sensação de conforto”, pontua Marina.

Maior participação de mulheres na pesquisa

O estudo foi realizado remotamente, com voluntários brasileiros maiores de 18 anos, entre os meses de agosto e setembro de 2020, aproximadamente cinco meses após a implementação da quarentena no Brasil. 

Um total de 1.496 participantes responderam ao questionário, mas, após a validação dos dados, 1.368 respondentes foram incluídos no estudo. A participação foi principalmente de mulheres (80%), havendo voluntários de diferentes regiões do país. A maioria dos respondentes, no entanto, reside na Região Sudeste.




 

A equipe de pesquisa

Pesquisadoras de quatro universidades participaram do levantamento e análise dos dados: a doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos da Faculdade de Farmácia da UFMG, Tamires Cássia de Melo Souza e a professora adjunta do Departamento de Alimentos da Faculdade de Farmácia da UFMG, Lucilene Rezende Anastácio. 

Da Universidade Federal de Lavras (UFLA), está a mestranda do Programa de Pós-Graduação em Nutrição em Saúde da Faculdade de Ciências da Saúde Marina Martins Daniel e a professora adjunta Lívia Garcia Ferreira.

Da Universidade Federal de Viçosa (UFV), participaram a mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Nutrição do Departamento de Nutrição e Saúde Lívya Alves Oliveira e a professora adjunta do Departamento de Nutrição e Saúde Ceres Mattos Della Lucia.

A professora adjunta Juliana Costa Liboredo, do Departamento de Alimentos da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), também fez parte da equipe.

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