Jornal Estado de Minas

TRADIÇÃO

Serra da Piedade recebe celebração noturna que não era realizada há anos

 
Uma procissão luminosa, com número limitado de participantes e rigor nos protocolos sanitários devido à pandemia do novo coronavírus, marcou na noite de ontem o Dia de Nossa Senhora da Luz, a Festa da Apresentação do Senhor e o 25° ano da comemoração do Dia Mundial dos Consagrados (à vida religiosa). No alto da Serra da Piedade, em Caeté, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), 25 pessoas rezaram também pelas vítimas da COVID-19. O cortejo sem andor, apenas com velas, ocorreu no interior e no entorno da ermida do século 18, considerada a menor basílica do mundo, onde fica a imagem da padroeira de Minas, Nossa Senhora da Piedade. 





Pela manhã, o arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, dom Walmor Oliveira de Azevedo, que preside a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), disse que a data se torna especial para acender "a luz da esperança". Ele enalteceu os profissionais da área de saúde e os cientistas e condenou o negacionismo. "São profissionais corajosos, proféticos e solidários que atuam para preservar o bem maior: a vida. Aos governantes, suplicamos para que tenham conduta mais humanitária e menos político-partidária, pois a sociedade está pagando um preço muito alto pela falta de lucidez e grande polarização neste momento de pandemia do novo coronavírus." E mais: "A cada dia, o número de pobres se multiplica, e o de miseráveis aumenta, sendo necessário o coração solidário para minimizar a dor".

Às 19h, com as luzes acesas do Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade – Padroeira de Minas Gerais, o reitor padre Wagner Calegário e o pró-reitor, padre Felipe Carvalho de Macêdo, deram início ao cortejo, e, em seguida,  à missa solene e à bênção das velas. "Estamos valorizando experiências de mistério no meio da beleza, cultura,  arquitetura e paisagem, retomando tradições de forma bem diferente, pois não há aglomerações. As velas acesas simbolizam, neste momento, todos nós aqui nos apresentando a Deus. Nós somos o templo", disse o reitor.

Há muitos anos não ocorriam procissões noturnas na Serra da Piedade. Segundo a Arquidiocese de BH, a procissão revive antiga tradição cristã, que atravessa gerações – "as velas representam Cristo, luz dos povos".

Proteção

 

Moradora de Sabará (RMBH), a professora Fátima Natalina Basílio acompanhou o cortejo e pediu proteção "para o mundo, contra a COVID-19", ao lado da filha Gleicielle Basilio. O motorista Maicon Lucio Vieira de Souza, de Caeté, disse que, finalmente, conseguiu agendar a visita. "Estou rezando por um amigo que perdeu a mãe hoje (ontem)".





A missa e a procissão seguiram os protocolos de segurança para evitar a disseminação da COVID-19. Por isso os fiéis tiveram de marcar previamente a participação. Para visitar o santuário, é preciso fazer agendamento pelo telefone (31) 3319-6111 ou por meio do site santuarionossasenhoradapiedade.arquidiocesebh.org.br.  

Passagem bíblica, a fonte de inspiração


(foto: Marcos Vieira/EM/DA Press)
A Festa da Apresentação do Senhor relembra a passagem bíblica em que Maria e José, no cumprimento de um preceito hebraico, levaram o Menino Jesus ao templo. A tradição hebraica estabelecia que os pais deveriam levar seus primogênitos ao templo para serem apresentados aos sacerdotes e consagrados a Deus. Após a apresentação de Jesus, um senhor, de nome Simeão, guiado pelo Espírito Santo, entrou no templo. Acolheu o Menino em seus braços chamando-lhe de luz para iluminar as nações. Essa passagem bíblica inspira as procissões com as velas.

Segundo os padres, a procissão no Santuário Basílica da Padroeira de Minas Gerais, que guarda a imagem de Nossa Senhora da Piedade esculpida por Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814), "é vivida no contexto paisagístico, histórico, cultural e natural da Serra da Piedade".

Com altitude de 1.740 metros, a Serra da Piedade tem histórias de fé e até política. Foi no alto, por exemplo, que o ex-presidente Tancredo Neves (1910-1985) deu início a um dos atos da campanha de redemocratização do país, em 1984. Em dias muito claros, é possível vislumbrar a Serra do Caraça, o espelho d’água de Lagoa Santa, toda a cidade de Caeté, com o pontilhão ferroviário, e outros municípios da RMBH. O ponto principal, sem dúvida, é a ermida que dá exatamente o clima de “pedacinho do céu” de manhã bem cedo, quando nuvens baixas tomam conta do topo da serra.

A fama do lugar teria começado entre 1765 e 1767, conforme a tradição oral, com a aparição de Nossa Senhora, com o Menino Jesus nos braços, a uma menina, muda de nascimento, cuja família vivia na comunidade de Penha, a seis quilômetros da serra. Nesse momento, a menina teria conquistado a fala. Mais tarde, em 1773, o templo seria construído pelo ermitão português Antônio da Silva, o Bracarena.

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