Jornal Estado de Minas

ENTREVISTA EXCLUSIVA

Advogada do caso Brumadinho: 'Prevemos audiência ainda na 1ª metade de 21'

Enquanto o governo de Minas Gerais e a mineradora Vale buscam acordo mediado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a multinacional Tüv Süd, que atestou a segurança da Barragem B1 da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, na Grande BH, é processada pelos danos provocados às vítimas e ao município mineiro na Alemanha, sede da empresa.





O rompimento da barragem provocou 270 mortes, sendo que 11 corpos continuam sendo procurados pelo Corpo de Bombeiros. Na segunda-feira (25/01) a tragédia completa dois anos e ninguém ainda foi preso e poucos foram indenizados. A Tüv Süd foi acionada na Alemanha pelo escritório PGMBM, o mesmo que processa a BHP Billiton no Reino Unido, pelo rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana. A advogada do escritório PGMBM, Mariana Malaquias concedeu uma entrevista exclusiva ao Jornal Estado de Minas.

EM: Em qual estágio se encontra essa ação contra a Tüv Süd na Alemanha?

Mariana Malaquias: O processo foi ajuizado em outubro de 2019 e a Tüv Süd apresentou sua defesa em março de 2020. Em setembro de 2020, a corte alemã levantou a possibilidade de realizarmos uma audiência de mediação, como forma de buscar uma solução mais ágil e sem o intermédio direto do poder judiciário. Mas a tentativa de mediação foi repelida pelos advogados da Tüv Süd, em outubro de 2020. Também em outubro de 2020, apresentamos a primeira parte da resposta dos autores à contestação e vamos apresentar dentro das próximas semanas a segunda parte dessa resposta à contestação. Prevemos uma audiência ainda na primeira metade de 2021.

EM: Quem são os clientes representados na ação?

MM: A ação foi ajuizada em nome do Município de Brumadinho e da família de Izabela Barroso Câmara (três irmãos, pais e cônjuge), engenheira morta na tragédia. Ela tem como objetivo inicial o reconhecimento da responsabilidade da Tüd Süd pelo rompimento da barragem, enquanto certificadora da estabilidade de uma barragem sabidamente instável.





Com o reconhecimento da responsabilidade da Tüv Süd pela corte alemã, dá-se início a uma outra fase processual, em que são discutidos os danos sofridos por mais de mil clientes, vítimas do desastre.

EM: Foi divulgado inicialmente que a causa teria valor aproximado de 1 bilhão de dólares (R$ 5,4 bilhões). Há uma expectativa de valor?

MM: Como ainda não apresentamos os valores definitivos à corte, infelizmente não podemos passar essa informação.

EM: Quais são as responsabilidades e transgressões pelas quais a Tüv Süd foi acionada? E por que acionar a empresa na Alemanha e não no Brasil?

MM: Apesar de ter conhecimento das anomalias e problemas das estruturas da Barragem, a Tüv Süd Bureau emitiu Declarações de Condição de Estabilidade (DCEs) para a Barragem B1, em junho e em setembro de 2018. Essas DCEs não retrataram a verdadeira situação crítica da barragem. Consequentemente, tiraram do radar do poder público e da sociedade as reais condições da estrutura que veio a colapsar e causou centenas de mortes e sério dano ambiental.





A Tüv Süd Bureau é subsidiária da Tüv Süd AG, sediada na Alemanha, e contra a qual a ação foi ajuizada. Ajuizar a ação naquele país visa dar uma resposta efetiva e suficientemente célere a todos os afetados.

EM: Quais as etapas pelas quais o processo vai passar e há uma expectativa de sentença em quanto tempo?

MM: Há que se considerar as dificuldades que a pandemia impõe ao sistema judiciário no mundo todo, mas prevemos que a audiência ocorrerá ainda na primeira metade de 2021.

EM: Quais as diferenças mais notáveis do processo na Alemanha para um que corre no Brasil?

MM: Grandes ações para tratar de desastres ambientais no Brasil costumam ser ineficientes e podem levar até décadas de espera por uma decisão. A Alemanha, nessa perspectiva, é um caminho viável para garantir justiça aos atingidos.





EM: Por que a Alemanha aceitou o processo contra a Tüv Süd, mas a Inglaterra ainda não admitiu o processo contra a BHP Billiton?

MM: A Tüv Süd AG, empresa mãe da empresa brasileira que emitiu a certidão de estabilidade, tem sua sede na Alemanha, o que atrai a competência da Alemanha para julgar o caso.

No processo ajuizado contra a BHP, na Inglaterra, a competência da corte inglesa foi contestada pela BHP e, por isso, a corte teve que decidir se tem ou não competência para ouvir o caso. Já na Alemanha, a competência foi estabelecida quando a Tüv Süd não a contestou ao apresentar sua defesa.

Em outras palavras, a Tuv Sud, ao não impugnar esse ponto, aceitou a competência da corte alemã para ouvir o caso. Não há que se falar, dessa forma, em aceitação pela corte uma vez que ela não precisou decidir se tinha ou não competência, como ocorreu na Inglaterra.

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