Jornal Estado de Minas

TEMPORAIS

Chuva em BH: deslizamentos e inundações ameaçam ao menos 10,8 mil pessoas



Ao menos 10,8 mil pessoas em Belo Horizonte enfrentarão este período chuvoso sob risco de perder a vida, o teto ou o patrimônio. O grupo habita as mais de 2,7 mil residências situadas em áreas de perigo geológico e pontos sujeitos a alagamento na capital, mapeados pela Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (Urbel) e pela Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), órgãos ligados à prefeitura.





Em muitas dessas localidades, os moradores temem novas tragédias, vivem em constante estado de alerta e se queixam de descaso do poder público, já que ainda convivem com os rastros de destruição em janeiro de 2020.

Deslizamentos

Nas áreas de risco geológico – ou seja, ameaçadas por escorregamentos de terra, erosão, solapamento de margens e fenômenos afins – a Urbel estima haver ao menos 1.100 residências classificadas como de alto risco, localizadas em 218 vilas, favelas e conjuntos habitacionais. O número estimado de moradores afetados é de, no mínimo, 3 mil.

A diretora de Áreas de Risco e Assistência Técnica na Urbel, Isabel Volponi, explica que os dados são parciais, já que o diagnóstico da situação de risco geológico da capital, realizado com periodicidade média de dois anos pela prefeitura, ainda está em fase de atualização.



“Diversas ocupações recentes, por exemplo, ainda não foram contabilizadas nesse levantamento. Ele também exclui regiões que, até a chuva histórica do ano passado, eram consideradas seguras, mas tiveram as condições do solo alteradas e se tornaram áreas de risco. Ainda não conseguimos fechar um novo balanço por causa dos temporais de janeiro de 2020, que geraram muitas demandas emergenciais, como realocação de famílias, concessão de bolsa aluguel, entre outras do gênero. Nossos esforços, por enquanto, ainda estão concentrados nessas questões e na gestão do risco para este período chuvoso. Acredito que, ao longo de 2021, poderemos nos dedicar ao novo diagnóstico”, pondera a dirigente.

As áreas de risco geológico estão espalhadas pelas chamadas Zonas de Especial Interesse Social, catalogadas pela Urbel, cuja última atualização é de 17 de setembro do ano passado. A lista inclui 192 aglomerados e 26 conjuntos habitacionais. A região com a maior lista de pontos de atenção é a Oeste (37), seguida pelo Barreiro (30), Leste (23), Pampulha (22), Venda Nova (21), Centro-Sul (21), Nordeste (20), Noroeste (17) e Norte (18).

Uma das novidades da lista é a Vila Bernadete, no Barreiro. Sete pessoas morreram, nove casas foram destruídas e 50 famílias foram removidas do local durante as chuvas do último verão, conforme dados da Defesa Civil. O bairro, até então, não era considerado como área de deslizamento pelo município.





Isabel Volponi esclarece que a localidade era classificada como de risco médio, situação que mudou após a ação de um grupo de moradores. “Naquela região que deslizou, as pessoas cortaram uma encosta para construir casas com fossas. Esse fator, associado à chuva forte, fez com que o risco ali evoluísse”, afirma a diretora.

Marcados por décadas de tragédias decorrentes das chuvas, os aglomerados da Serra, na Região Centro-Sul, Taquaril, na Leste, seguem na relação das mais perigosas. Apesar de expressivo, o número de construções vulneráveis do levantamento atual é menor em relação ao estudo de 2016, quando a PBH encontrou 1501 casas em situação de alto risco.

Indundações

A Sudecap contabiliza 98 áreas sujeitas a alagamento em  Belo Horizonte. A região mais castigada pelas enchentes é a de Venda Nova, com 20 pontos, incluindo a Avenida Vilarinho. Em seguida, vem a Pampulha, com 14 gargalos – em grande parte concentrados em torno dos córregos Mergulhão e Engenho Nogueira. No Barreiro e Norte, há 13 pontos. A lista segue com as regiões Oeste (11), Nordeste (10), Noroeste (7), Leste (7) e Centro-Sul (3).



Os locais estão mapeados nas chamadas cartas de inundações, documentos em que o traçado das ruas é sobreposto ao dos córregos que cortam a capital, permitindo melhor identificação de situações críticas.

O total de pessoas afetadas tanto pelas inundações, como pelos deslizamentos é de 10,8 mil pessoas, abrigadas em 2.715 domicílios. A PBH não soube precisar a população atingida exclusivamente pelos alagamentos e enxurradas, uma vez que algumas regiões oferecem risco duplo.

“Ninguém dorme”

Edson Rosa, de 48 anos, descreve cotidiano de catástrofes e cobra atenção da prefeitura à comunidade local (foto: Jair Amaral/EM/DA Press)
Ao longo de 2020, a Defesa Civil informou ter realizado 5 mil vistorias em áreas de risco, nas quais providenciou a remoção preventiva de 800 famílias em toda a cidade. Desde 2017, início do primeiro mandato do prefeito Alexandre Kalil (PSD), a Urbel contabiliza 443 remoções definitivas de áreas críticas. O total está aquém da proposta feita em 2016 pelo então candidato à PBH. “Tem que retirar 2 mil famílias em zona de risco. Na prática, tem que correr na Defesa Civil e na Prefeitura para que essa catástrofe que se tornou rotina na vida do pessoal de BH passe a ser exceção”, disse o político na ocasião.



Morador da Vila Bernadete, no Barreiro, Edson Rosa, de 48 anos,  descreve seu cotidiano de catástrofes e cobra atenção da prefeitura à comunidade local. Ele mora na Rua Treze, ao lado de uma das nove residências que desabaram na Vila durante as chuvas de janeiro de 2020. O zelador conta que, na época, a Defesa Civil avaliou que seu imóvel, cercado de encostas íngremes, não corria risco de desabar. Mas ele não se sente seguro. “Aqui, ninguém dorme. Qualquer barulhinho, a gente acorda assustado. Começou a chover, a gente fica de sentinela e desce para a casa do meu irmão”, relata o trabalhador, que vive com a esposa e dois filhos em meio às ruínas provocadas pelos temporais do último verão.

Ele se queixa de que a PBH deixou os reparos dos estragos provocados pelas últimas enchentes na região pela metade. “Em um ano, eles só vieram aqui para tirar os entulhos das casas que caíram e chegaram a fazer uns furos para sondagem do terreno. Falaram que, depois disso, iam finalizar as obras. Mas, até hoje, nada. Está desse jeito aí que vocês estão vendo”, reclamou.

Vizinho de Edson, o motorista de aplicativo Walace Marlom, de 28, diz que teve a residência condenada e, hoje, recebe bolsa aluguel no valor de R$ 500 da prefeitura. O jovem teme que a quantia, em breve, seja insuficiente para cobrir a locação, já que os aluguéis vêm sofrendo reajuste no lugarejo.



A falta de recursos para arcar com a moradia, aliás, foi o que trouxe a servidora Maria Antônia, de 51, de volta à sua antiga casa na Vila Bernadete, que fica bem próxima aos imóveis que ruíram. “Fiquei com medo e me mudei. Quando foi lá para outubro/novembro, voltei, pois vi que a prefeitura estava fazendo obras por aqui, e eu estava pagando aluguel do meu bolso. Só que eles começaram e pararam. Agora, estou com medo de novo. Quando chove, a gente fica de olho”, diz a funcionária pública.

(foto: Arte EM)


"Prontamente atendidas"

Procurada pelo Estado de Minas, a Urbel informou que todas as famílias afetadas pelas chuvas na Vila Bernadete e que tiveram que deixar as residências foram prontamente atendidas e assistidas pelos programas Bolsa Moradia e Auxílio Pecuniário.

O órgão também afirmou que realizou a limpeza do local, com remoção dos entulhos e escombros. Além disso, teria implantado na região drenagem pluvial paliativa e provisória para evitar o escoamento da água ao longo da encosta atingida pelas chuvas e, assim, mitigar a degradação dos terrenos. Outra providência informada foi a instalação de um anteparo na base do aclive para reter os sedimentos, evitando que os eles escoem e comprometam a via.



A PBH argumentou, por fim, que a intervenção de estabilização da encosta ao longo da Vila Bernadete demanda por obras de grande porte e de alta complexidade. ”Os projetos e estudos já realizados indicam a instauração de uma área verde com replantio para evitar a reocupação da área, que se mostrou bastante instável. Essa definição deve sair num prazo entre 60 e 90 dias, para que, ao final do período chuvoso, seja possível iniciar as ações necessárias”, diz a nota enviada à reportagem.

Questionado sobre as ações planejadas para garantir a segurança dos moradores de áreas de instabilidade neste período chuvoso, o município citou a realização de 80 obras de pequeno e médio porte de mitigação de risco geológico em toda a cidade de abril de 2020 até o momento. Outra providência mencionada foi a intensificação da emissão de alertas e do trabalho de conscientização dos moradores de pontos de risco geológico e de inundação.

Semana começa com pancadas de chuva

As chuvas continuam! A Defesa Civil de Belo Horizonte emitiu um novo alerta para a possibilidade de chuva (30 a 50 mm) com raios e rajadas de vento em torno de 50 km/h. O alerta é válido até 8h de hoje. A previsão é céu nublado com pancadas de chuva e trovoadas isoladas para esta segunda-feira. As temperaturas devem permanecer estáveis com a máxima de 28ºC e a mínima 19°C.  A tendência é que a possibilidade de chuvas diminua até terça-feira, mas que volte a intensificar na quarta-feira.





A cidade de Belo Horizonte registrou em oito dias do mês janeiro de 2021 um acumulado de precipitação de 194,2 mm, a média climatológica para janeiro é de 329,1 mm, portanto, já choveu 59% do esperado para o mês. Vale ressaltar que a estação de referência, tanto para a climatologia mensal quanto para o percentual acumulado, é a estação climatológica principal situada no Bairro Santo Agostinho, na Região Centro-Sul.

A previsão para outras regiões de minas não é muito diferente. Hoje, o céu deve ficar nublado a encoberto com pancadas de chuva e trovoadas isoladas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, Oeste e Sul/Sudoeste. No Noroeste, Central Mineira e Metropolitana, o dia deve ser nublado com pancadas de chuva e trovoadas isoladas. Demais regiões, parcialmente nublado a nublado com pancadas de chuva e trovoadas isoladas. As temperaturas devem ter um pequeno declínio: a máxima deve ser 35ºC e a mínima 14°C.

Para amanhã, a previsão é de céu parcialmente nublado a nublado com pancadas de chuva e trovoadas isoladas no Noroeste, Central Mineira, Oeste e Sul/Sudoeste. Demais regiões céu parcialmente nublado. "Haverá uma redução da possibilidade de chuva em todo o estado, incluindo a região metropolitana. Mas isso dura pouco", apontou a meteorologista do Inmet Anete Fernandes. Isso porque já na quarta-feira persiste a instabilidade, com chuvas frequentes, e pancadas no fim de tarde.

Ela explica que este ano deve ocorrer o "veranico" – um fenômeno meteorológico comum nas regiões meridionais do Brasil. Consiste em um período de estiagem, acompanhado por calor intenso, forte insolação e baixa umidade relativa em plena estação chuvosa ou em pleno inverno. "Sendo assim, pode chover acima da média. Mas não deve ocorrer como no ano passado em Belo Horizonte", acrescentou.




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