Jornal Estado de Minas

RECUPERAÇÃO

Retomada do turismo e da economia é teste desafiador para Tiradentes


O barulho inconfundível das charretes circulando pelas pedras capistranas voltou a ser trilha sonora em Tiradentes, um dos principais destinos turísticos de Minas Gerais, depois de longo tempo de fechamento do comércio da cidade imposto para barrar a COVID-19. A circulação do meio de transporte, tradicional atrativo da cidade histórica, dá sinal da retomada da principal atividade econômica do município. Foram cinco meses, de março a julho, nos quais lojas e serviços ficaram paralisados.





A reabertura foi marcada esta semana pelo primeiro evento público realizado em Tiradentes durante a pandemia, a I Feira Literária de Tiradentes (Fliti), que termina hoje, sob coordenação da empresa de marketing cultural Korporativa. A força da retomada do turismo surpreendeu as autoridades e comerciantes locais. Os turistas voltaram a apreciar a beleza arquitetônica da cidade emoldurada pela Serra de São José. O charme de Tiradentes encorajou muita gente.

Durante a noite, bares e restaurantes ficaram cheios. A maior parte das pessoas usava máscaras. Visitantes também circulavam ao ar livre para apreciar a decoração de Natal nas praças. “Tem surpreendido bastante, devido às incertezas que passamos durante o início da pandemia. Também em uma pesquisa que fizemos, no início, não imaginávamos que o movimento voltaria tão intenso” afirma o secretário de Cultura de Tiradentes, Henrique Rohrmann.

Na sexta-feira, casal de Santa Catarina aproveitou o dia de sol para conhecer a cidade histórica, aproveitando a beleza da cidade para fazer selfie com a filha, a pequena Iza, de 10 meses. O cenário escolhido foi a Matriz de Santo Antônio, de onde se tem uma das vistas panorâmicas mais belas de Tiradentes.  O casal estava devidamente protegido e as máscaras não foram retiradas nem sequer para registrar a viagem em fotos. “É a nossa primeira vez aqui. A cidade é muito linda e o povo, muito acolhedor”, disse o funcionário público Vinício José dos Santos, de 37 anos.




 
O passeio entre casarões e templos coloniais foi aprovado por Vinício Santos e a mulher, Sirlene Letur, com a filha Iza (foto: Fotos Leandro Couri/EM/D.A Press)
 
O casal, que ficou quatro dias na cidade, se sentiu protegido com os protocolos sanitários adotados. “Nos sentimentos bem seguros nos estabelecimentos que tomam todo cuidado”, afirmou Vinício Santos. A médica Sirlene Letur, de 32, concorda com o marido e, ainda, destaca a infraestrutura para receber os turistas. “Cidade muito bem organizada e estruturada. Nós passamos em Ouro Preto e gostamos mais daqui”, disse.

A Prefeitura de Tiradentes ainda não tem estatística para medir a intensidade da retomada, mas os sinais são positivos. De acordo com o secretário de Cultura, as pousadas e hotéis estão funcionando com 50% das ocupações. “Durante a semana ficam mais vazios. Porém, de quinta a domingo, estão ficando com a ocupação máxima permitida. Não tenho dados ainda, mas tenho visto a cidade bastante cheia”, diz.

A decisão do governo municipal de fechar a cidade por cinco meses foi contestada por parte dos comerciantes, no entanto, a estratégia trouxe resultados positivos.  De acordo com o boletim epidemiológico com os dados mais recentes dos municípios, divulgado pela Secretaria de Estado de Saúde na sexta-feira, Tiradentes registrou 39 casos de contaminação e uma morte provocada pela COVID-19. “Durante boa parte da pandemia, concentramos forças em cuidar do nosso povo para que quando a retomada viesse, o tiradentino estaria bem para receber todo mundo”, conta o secretário.





Proteção

No Largo das Forras, o condutor de charrete Daniel Teixeira Elias, de 31, animado com a retomada do turismo, aguardava os primeiros clientes do dia. “Graças a Deus reabriram depois de cinco meses. Todo final de semana a cidade está bem movimentada.” Ele confessa que fica temeroso com a pandemia, mas acredita que é necessário adotar medidas de proteção enquanto a vacina não chega. “Até sair a vacina, a gente vai ter que conviver com essa doença, querendo ou não.”

E ele não se descuida, usando máscara de proteção facional todo o tempo.Um recipiente de álcool em gel fica a disposição para quem quer conhecer o município de uma forma especial. “Varia muito. Há dia que roda bem. Há dia que fica o dia inteiro parado. Temos o passeio completo. Fazemos dois ou três num dia e temos as voltas menores”, conta. As 30 charretes que oferecem o serviço aos turistas podem fazer pequenos trajetos ou todo o circuito, que mostra seis pontos: chafariz, Museu de Sant'ana, Igreja Nossa Senhora do Rosário, Igreja dos Escravos, Casa de Tiradentes, Estátua de Tiradentes e Matriz de Santo Antônio.
 
A turismóloga Aparecida Nascimento comemora a reabertura, mas lamenta afastamento de moradores (foto: Fotos Leandro Couri/EM/D.A Press)
 

Êxodo no próprio quintal

Da janela de casa, a turismóloga Maria Aparecida do Nascimento, de 52 anos, observa toda a movimentação do turismo em Tiradentes. Ela faz parte da nona geração que vive em um casarão na Rua Direita. O imóvel pertencia ao avô, Zé Moura, que dá nome ao beco, transformado em ponto turístico. Ela comemora a retomada do turismo, mas lembra que a principal fonte de renda na cidade traz consigo mudanças para os tiradentinos.





A cidade vive mudança com o movimento dos moradores que deixaram o centro histórico para viver nos bairros adjacentes. “O turismo é muito bem-vindo, mas ele retirou a população local, que foi viver nos bairros das adjacências. Temos duas cidades: o centro histórico, que é uma vitrine, e a cidade dos bairros onde vive a comunidade, os tiradentinos”. A transformação ocorreu, principalmente, devido ao aumento do custo de vida no centro histórico.  Muitos imóveis foram adquiridos por pessoas que se encantaram com a cidade e resolveram investir em bares e restaurantes.

“Antes, as pessoas eram proprietárias dos imóveis e passaram a ser empregadas das pessoas que compraram”. Há um conflito da população de dentro com aqueles que chegaram. “Além da perda da identidade local, há uma interferência do uso e ocupação”, diz Maria Aparecida. Resultado disso, ela lembra que apenas cinco famílias ainda vivem na rua Direita. A via abriga, na maioria de seus imóveis, restaurantes, pousadas, lojas e bares. “É muito caro morar aqui. Tudo é voltado para quem vem de fora”, diz a turismóloga.

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