Jornal Estado de Minas

PANDEMIA

Liderança confirma mais seis casos de COVID-19 entre indígenas em BH

Mapa informativo que mostra a situação de Minas Gerais com o COVID-19 (foto: Mapa informativo que mostra a situação de Minas Gerais com o COVID-19)
Liderança dos pataxó-hã-hã-hães e mulher do cacique Hayó, Ãngohó confirmou neste sábado (18) mais seis casos de COVID-19 entre os indígenas que atualmente estão morando na periferia de Belo Horizonte, totalizando oito infectados, entre eles um menino de 2 anos. O grupo aguarda novos resultados na segunda-feira (20) e número deve crescer. 



''O que a gente tinha mais medo infelizmente aconteceu. Seis pessoas já testaram positivo, inclusive uma criança. É muito triste o que estamos vivendo aqui, mas a gente crê que é possível sair dessa'', comentou a líder. 

Ela e Hayó testaram positivo para a doença há duas semanas. Depois de ficarem três dias internados, os dois já estão em casa e não apresentam falta de ar, apesar de outros sintomas da doença persistirem. 

''Estamos muito preocupados e desesperados. Tememos pela vida do nosso povo. Hoje estamos fora da nossa aldeia devido a contaminação da área em que morávamos, por isso não podemos fazer os nossos rituais, nossas crianças estão adoecendo, pedindo para ir para o rio. Estamos sem poder plantar, porque vivemos da terra; sem poder pescar e fazer os nossos rituais sagrados que tanto nos fortalecem'', lamenta.



As famílias, que viveram por três anos e meio na aldeia pataxó-hã-hã-hãe Naô Xohã, em São Joaquim de Bicas, no Vale do Rio Paraopeba, deixaram a região no início de 2020 em decorrência de conflitos internos posteriores ao rompimento da Barragem da Mina Córrego do Feijão, em janeiro de 2019, na vizinha Brumadinho.

Desde 27 de abril de 2019, o povo hã-hã-hãe recebe ajuda emergencial mensal da Vale, mineradora responsável pela estrutura que se rompeu: um salário mínimo por adulto, R$ 500 por adolescente e R$ 250 por criança. 

A situação do grupo, no entanto, se agravou depois da pandemia. Aos deixar São Joaquim de Bicas, os pataxós-hã-hã-hães se dividiram em três locais: 13 famílias se mudaram para uma comunidade no Bairro Jardim Vitória, Região Nordeste da capital mineira; três para Ibirité, na Grande BH; e sete famílias foram para casas de parentes em Coroa Vermelha, no Sul da Bahia. Ao todo, a aldeia conta com 122 pessoas



''A situação do grupo que mora na Periferia de BH é delicada porque moram três, quatro famílias no mesmo barracão. Diante do isolamento social, com todos em casa, se um é infectado, é muito provável que os outros também sejam'', analisa Cândida Vianna, membro do Grupo de Apoio aos Pataxós-Hã-hã- hãe Katurãma da Articulação Eu Luto Brumadinho Vive.

''Hoje eles vivem uma situação precária não só pela exposição à COVID-19, mas porque estão fora de seu local de poder e força. Toda a cultura deles está na proximidade com a mata e com a terra. Eles não são indígenas urbanos e, por isso, sentem muita falta do rio e a vida na cidade os impede de fazer os tradicionais rituais, colocando-os numa fragilidade ainda maior, principalmente nesse momento de adoecimento'', completa. 

A liderança pataxó-hã-hã-hães tem recomendado o isolamento às famílias, mas a precariedade das casas onde eles estão instalados impede ações mais efetivas, como isolar os infectados. ''Estamos aguardando o resultado dos exames do resto do nosso pessoal, sem otimismo'', afirma Ãngohó.


 

Plano de emergência


Por meio de sua assessoria, a Vale informou, em nota, que uma equipe multidisciplinar de saúde foi contratada para o diagnóstico e atendimentos emergenciais para os grupos indígenas. Com o início da pandemia, foi implementado um Plano de Contingência para COVID-19, com orientações sobre o enfrentamento da doença, atendimento psicológico remoto, monitoramento diário dos sintomas por meio de plataformas virtuais e contatos telefônicos e apoio no contato com os serviços de saúde municipal e estadual, ao sinal de qualquer caso suspeito.
 
A empresa informa que equipe de saúde contratada em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde de São Joaquim de Bicas promoveu vacinação do grupo contra gripe, a fim de proteger os indígenas e afastar sintomas que possam ser confundidos com o novo coronavírus.
 
Sobre a questão fundiária, a mineradora esclarece que conforme termo assinado com o Ministério Público Federal, Funai e lideranças indígenas da aldeia, contratará uma consultoria independente, que será responsável pelo diagnóstico socioeconômico e a avaliação dos impactos do rompimento da barragem sobre essa comunidade, a fim de criar um plano efetivo de reparação. A contratação da consultoria está em andamento, sob a condução do MPF e Funai.