Jornal Estado de Minas

Indígenas enfrentam a COVID-19 em Belo Horizonte

Cacique Hayó: famílias indígenas em risco (foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
 
Famílias dos povos pataxó e pataxó-hã-hã-hãe que moravam na região de Brumadinho, na Grande BH, estão vivendo há quatro meses na periferia de Belo Horizonte em situação de vulnerabilidade. Três dos indígenas de um dos grupos, que se mudou para o Taquaril, Região Leste de BH, contraíram a COVID-19.



O ancião Geovais e sua filha Quiçá estão internados há uma semana na Santa Casa da capital. O marido dela, também com a doença, se recupera em casa. “Estamos esperando o resultado dos exames”, diz  Quiçá, afirmando estar “bem melhor”. No Taquaril, vivem seis famílias da etnia pataxó.
 
Já os pataxós-hã-hã-hães, ao deixar a região de Brumadinho, se dividiram em três locais: 13 famílias se mudaram para uma comunidade no Bairro Jardim Vitória, Região Nordeste da capital, três para Ibirité, também na Grande BH, e sete famílias foram para casas de parentes em Coroa Vermelha, no Sul da Bahia. Ao todo, a aldeia conta com 122 pessoas.
 
“Neste momento, a situação é complicada, pois a vila onde estamos vivendo já tem 120 casos de outros moradores. Só na rua em que estamos são 13 casos confirmados. Eu mesma estou aguardando o resultado do exame, pois estou com suspeita da COVID-19. Todos do nosso grupo estão fazendo o teste”, comenta Ãngohó, liderança dos hã-hã-hães e mulher do cacique Hayó.


 
As famílias, que viveram por três anos e meio na aldeia pataxó-hã-hã-hãe Naô Xohã, em São Joaquim de Bicas, no Vale do Rio Paraopeba, deixaram a região no início do ano em decorrência de conflitos internos posteriores ao rompimento da Barragem da Mina Córrego do Feijão, em janeiro de 2019, na vizinha Brumadinho.
 
Mapa informativo que mostra a situação de Minas Gerais com o COVID-19 (foto: Mapa informativo que mostra a situação de Minas Gerais com o COVID-19)
Desde 27 de abril de 2019, o povo hã-hã-hãe recebe ajuda emergencial mensal da Vale, mineradora responsável pela estrutura que se rompeu: um salário mínimo por adulto, R$ 500 por adolescente e R$ 250 por criança. Mas a situação do grupo se agravou depois da pandemia. “Esse dinheiro era para ajudar na subsistência na aldeia, para nossas necessidades de comida, pois a gente não tinha mais o rio para pescar, água para plantação. Mas estamos largados, sem saúde”, queixa-se a líder indígena. O futuro é incerto pois, de acordo com  Ãngohó, a duração prevista da ajuda emergencial é até outubro.
 
Em Belo Horizonte, o grupo que está vivendo no Jardim Vitória paga aluguéis que variam de R$ 600 a R$ 800 por unidade. “Tem barracão com seis, sete, oito pessoas”, ela acrescenta. Integrantes do Grupo de Apoio aos Pataxós-hã-hã-hães, que nasceu do coletivo “Eu luto, Brumadinho vive”, vêm trabalhando junto à comunidade que está em BH. A necessidade de material de higiene e de limpeza, alimentação, cobertores e roupas de frio é grande. “Mas a gente não quer viver de doação, quer é viver do nosso braço”, conclui Ãngohó.



Plano de emergência


Por meio de sua assessoria, a Vale informou, em nota, que uma equipe multidisciplinar de saúde foi contratada para o diagnóstico e atendimentos emergenciais para os grupos indígenas. Com o início da pandemia, foi implementado um Plano de Contingência para COVID-19, com orientações sobre o enfrentamento da doença, atendimento psicológico remoto, monitoramento diário dos sintomas por meio de plataformas virtuais e contatos telefônicos e apoio no contato com os serviços de saúde municipal e estadual, ao sinal de qualquer caso suspeito.
 
A empresa informa que equipe de saúde contratada em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde de São Joaquim de Bicas promoveu vacinação do grupo contra gripe, a fim de proteger os indígenas e afastar sintomas que possam ser confundidos com o novo coronavírus.
 
Sobre a questão fundiária, a mineradora esclarece que conforme termo assinado com o Ministério Público Federal, Funai e lideranças indígenas da aldeia, contratará uma consultoria independente, que será responsável pelo diagnóstico socioeconômico e a avaliação dos impactos do rompimento da barragem sobre essa comunidade, a fim de criar um plano efetivo de reparação. A contratação da consultoria está em andamento, sob a condução do MPF e Funai.