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Estado de Minas O CASO BACKER

Detetive movida por dupla dor

Com duas vítimas na família, o marido e o pai, as pequisas de Camila Demartini e sua articulação com parentes de outros pacientes foram o ponto de partida para direcionar investigações policiais


postado em 10/02/2020 04:00 / atualizado em 09/02/2020 20:04

 

 

A situação que Camila Massardi Demartini vem enfrentando desde a intoxicação do pai e marido depois de consumir a cerveja Belorizontina, da Backer, poderia paralisar muita gente. Mas não foi o que ocorreu com essa farmacêutica de 29 anos. Ela é um dos entrevistados na série especial de podcast O caso Backer, publicada desde ontem no Estado de Minas. Foi Camila quem percebeu a coincidência dos graves sintomas apresentados por Paschoal Demartini e Luís Felippe Teles, respectivamente pai e marido dela, e iniciou uma busca por outras pessoas com o mesmo quadro, por meio de redes sociais. Dessa articulação entre as vítimas, surgiu a suspeita de contaminação a partir da cerveja artesanal. “Era a única coisa que havia em comum entre todos os pacientes. O fato de terem sido meus dois braços arrancados foi o que possibilitou toda essa descoberta. Se não fosse isso, talvez até hoje eu estaria bebendo a cerveja. E você também”, analisa. Aqui, você lê os principais trechos da entrevista.

Os sintomas

Primeiro você começa com essas dores, com esse mal-estar. Depois descobre a insuficiência renal. Depois, eles (pai e marido) começaram com uma paralisia facial unilateral, foi do lado esquerdo. Em seguida, uma insuficiência respiratória, e tiveram de ser entubados e depois traqueostomizados. Então vem a tetraplegia, que é a paralisação do pescoço para baixo. O Felipe, meu marido, chegou a ficar sedado, inconsciente. Depois tiraram a sedação aos poucos, muito devagar. Ele ficou vários dias assim, totalmente paralisado, sem abrir os olhos, sem se movimentar. A gente não sabia o que estava acontecendo, se ele estava consciente ou não. Meu pai na mesma situação, mas ele já estava em Ubá, tinha passado o Natal na minha casa, tinha participado do mesmo churrasco. Começou a sentir dores fortes também, foi internado e posteriormente transferido para Juiz de Fora. Ele dormiu, sedado e não acordou.

Da apuração à cerveja

Eu pensava: ‘Coincidência, né? Meu pai e meu marido doentes, internados, com problemas renais’. Aí isso me fez pesquisar por conta própria por que os dois estavam dessa forma e eu não estava, minha mãe não estava... Os CTI’s mantêm contato, um médico fala pro outro, eles têm grupos em que comentam casos: ‘Estou com um paciente assim, assim, assim’. Aí o Dr. Fabrício me disse: ‘Camila, estou sabendo de um paciente (de outro hospital) que mora perto da sua casa e de um outro que está aqui mesmo, que mora em frente à sua casa’. Em contato com a Flávia, que é esposa do Cristiano (nome do paciente), perguntei a ela em 3 de janeiro: ‘Flávia, o Cristiano bebeu cerveja? Ele gosta de cerveja? O Cristiano tomou Belorizontina?’. Ela respondeu: ‘Sim, só tomou Belorizontina’. A única coisa (em comum) era que todos os quatro tinham bebido a Belorizontina, todas compradas em supermercado do Buritis, todas compradas na Black Friday. Então isso não poderia ser uma coincidência. E o que esses agentes químicos tinha a ver com a cerveja? Aí a gente também fez essa ligação. Poxa, dietilenoglicol é usado na produção de cerveja para resfriar no processo de fermentação. Então pronto. A gente ligou o que eles comeram/beberam com o que causava essa sintomatologia que eles apresentavam.

O sacrifício do pai

Quando cheguei à Polícia Civil para prestar depoimento a primeira vez já falei isso. ‘Vocês vão entrar lá e procurar metanol, dietilenoglicol e organofosforados. Porque nas nossas pesquisas, foram esses compostos que a gente tinha encontrado que causariam os sintomas que eles tinham. No dia 9, quando eu já estava indo pra Ubá, levando o corpo do meu pai, que tinha vindo pro IML pra passar por necropsia, vi a notícia (relacionando a cerveja aos casos de intoxicação, a partir de coletiva de imprensa da Polícia Civil). E esse exame ajudaria a desvendar tudo: depois foi comprovado que tinha dietilenoglicol nele. Então tinha dietilenoglicol na cerveja, na Backer e no meu pai. Foi um sacrifício o meu pai ter ido. Acredito muito em missão, a missão dele foi brilhantemente cumprida.

Só tenho muito orgulho e gratidão ao meu pai. Fico muito feliz por ter vivido por quase 30 anos ao lado dele e ele ter podido me ensinar tantas virtudes. Ele era um cara maravilhoso. E em relação à partida dele, acho que ele foi me ajudando a ajudar as outras pessoas que precisam. Não tive o Felipe que é a pessoa estaria do meu lado nesse momento de perda. Segurar essa barra sozinha não é fácil, mas não tive meu tempo de sofrer, não é hora de sofrer, é hora de eu fazer minha parte, de ajudar.


ENTENDA O CASO

  • No fim de dezembro, pacientes começam a apresentar sintomas de uma doença misteriosa. No início, problemas gastrointestinais (náusea e/ou vômito e/ou dor abdominal). Depois, insuficiência renal aguda de evolução rápida (em 72 horas) somada a alterações neurológicas, como paralisia facial e descendente, borramento visual, amaurose (perda da visão parcial ou totalmente), entre outros sintomas.

  • Em 4 de janeiro, começam a circular nas redes sociais, principalmente no WhatsApp, boatos sobre a doença grave entre moradores do Bairro Buritis, na Região Oeste de BH. Usuários ligam a enfermidade ao consumo de produtos de um supermercado e da Cervejaria Backer, que negaram os conteúdos compartilhados.

  • Em 5 de janeiro, a Secretaria de Estado de Saúde se manifesta, pela primeira vez, sobre o caso. A pasta abre um inquérito epidemiológico. No dia seguinte, confirma a internação de sete pacientes com o mesmo quadro, batizado de síndrome nefroneural, e emite nota técnica. A Polícia Civil informa que vai apurar o caso.

  • Até 7 de fevereiro, foram notificados 31 casos suspeitos pela SES, sendo seis mortes. Exames de sangue confirmaram a presença do dietilenoglicol em quatro pacientes, sendo um deles Paschoal Demartini Filho, morto em 8 de janeiro. Há notificações em 10 municípios mineiros.

  • O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) determinou a interdição da fábrica da Backer. E a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a proibição da venda de todas as marcas da cerveja Backer com validade a partir de agosto de 2020.

  • Análises do Mapa encontraram a presença do dietilenoglicol ou monoetilenoglicol, ambas substâncias tóxicas, em 41 lotes contaminados de 10 rótulos da cervejaria. Ele também encontrou os agentes químicos na água usada na fórmula do produto e em equipamentos da indústria.

  • O dietilenoglicol e o monoetilenoglicol são substâncias tóxicas usadas no processo de refrigeração de cervejarias. Elas circulam em uma serpentina, situada em volta de tanque de inox, e não podem ter contato com a bebida.
  • Laudos da Polícia Civil não encontraram as substâncias na água da cervejaria, mas apontam a presença na bebida e em equipamentos da Backer. Documento produzido por químico contratado pela cervejaria também descarta a presença das substâncias na água e encontra dietilenoglicol e monoetilenoglicol nas garrafas.

  • A Backer informa usar somente o monoetilenoglicol em processo de refrigeração na etapa de fermentação da cerveja. A Polícia Civil investiga denúncia que a fábrica que fornece o fluido congelante adulterava o material, misturando os dois agentes. Os resultados das análises não foram divulgados. E ainda não se sabe o que levou à contaminação da bebida.

  • A Polícia Civil já ouviu 24 pessoas, entre vítimas e familiares de pacientes com a intoxicação. Ainda não há previsão para a conclusão do inquérito. De acordo com a PC, há 33 casos em investigação sob responsabilidade do delegado Flávio Grossi, nenhum anterior a outubro de 2019.

  • Apesar disso, a Sociedade Mineira de Nefrologia orientou médicos a notificarem casos antigos compatíveis com os sintomas que não tiveram um diagnóstico. Começam a aparecer vários pacientes que se enquadram nesta situação que remetemo problema a dezembro de 2018.


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