Jornal Estado de Minas

Consciência negra: veja como mineiros contribuem para luta que é de todos

Anos depois da instituição do Dia Nacional da Consciência Negra, ainda há quem questione os motivos para a existência de uma data dedicada ao tema. O movimento negro, no entanto, costuma dizer que não deve existir apenas um dia ou um mês para que a produção cultural, intelectual de parcela significativa da população brasileira ganhe visibilidade e holofotes. Apesar de o povo negro ter contribuição significativa em todos os campos da vida brasileira – com indígenas, portugueses e outros grupos de migrantes – da literatura à música, da culinária à engenharia, da religião ao saber científico, muitos feitos têm sua visibilidade prejudicada. Nem todo mundo sabe, por exemplo, que nomes importantes nessa luta nasceram em Minas.



As referências são inúmeras, mas, nesta data dedicada à contribuição dessa importante parcela da população para a formação da sociedade brasileira, elegemos nove personagens e suas histórias, para que as novas gerações possam saber sobre os feitos desses homens e mulheres cujas existências engrandecem toda a humanidade. Conheça pessoas que inovaram, criaram e sobretudo que abrem caminhos para muitos outras.

Diva Moreira


(foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press - 22/5/09)
É importante conhecer Diva Moreira para saber mais sobre a implementação de políticas públicas para a promoção da igualdade racial em Belo Horizonte. Aos 73 anos, a cientista política segue atuante. Natural de Bocaiuva, é formada em jornalismo pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) com especialização em ciências políticas. Começou cedo na militância na juventude, antes do golpe militar de 1964. Conheceu o marxismo na Igreja Católica e entrou para o Partido Comunista. Militou em movimentos sindicais e de bairro. Em Belo Horizonte, criou a Casa Dandara, de cidadania do povo negro, e a Secretaria Municipal para Assuntos da Comunidade Negra. Na linha de frente na luta pelos direitos dessa parcela da população, Diva se destaca pela elegância, pela fala calma e o jeito acolhedor e agregador.

Conceição Evaristo


(foto: Marcos Vieira/EM/D.A Press - 5/4/18)
Aos 73 anos, Conceição Evaristo é uma das maiores escritoras da literatura brasileira, embora o reconhecimento por instâncias literárias formais tenha vindo tardiamente. Nasceu no Morro do Pindura Saia, na Região Centro-sul de Belo Horizonte, que acabou sendo desapropriado. Costuma dizer que a primeira recepção de sua obra foi feita pelo movimento negro, notadamente professores que levavam sua literatura para a sala de aula. A mineira que se radicou no Rio de Janeiro foi agraciada com o Prêmio do governo de Minas Gerais de Literatura 2017 pelo conjunto da obra, foi tema de ocupação cultural do Itaú em São Paulo e é reverenciada em saraus Brasil afora. No mesmo ano, foi a estrela da Flip em Paraty. Venceu o Prêmio Jabuti em 2015, com Olhos D'água (Pallas) e este ano retorna ao maior prêmio da literatura brasileira como grande homenageada. Também neste ano, recebeu a láurea da 6ª edição da Olimpíada de Língua Portuguesa. Na obra que inclui romances como Becos da Memória (Pallas), Ponciá Vicêncio (Pallas), Insubmissas lágrimas (Nandyala), destacamos o poema “De mãe”, uma cartografia afetiva de sua obra. “Cuidado de minha poesia / aprendi foi de mãe mulher de por reparo nas coisas e de assuntar a vida. A brandura de minha fala / na violência de meus ditos ganhei de mãe/ mulher prenhe de dizeres fecundados na boca do mundo”.





Mãe Efigênia


(foto: Bruno Vasconcelos/Divulgação - 3/6/19)
Mãe Efigênia tem 73 anos e é natural de Ouro Preto. Senhora de grande saber e conhecimento, formou diversos filhos e zeladores do Candomblé no terreiro Manzo Nguzo Kaiango. É guardiã de práticas sociais e culturais fundamentadas na religiosidade de matriz africana, fundamental para que os negros trazidos à força da África conseguissem lutar contra a escravidão. Na década de 1970, fundou a comunidade quilombola Manzo Ngunzo Kaiango. A Comunidade tem identidade e território indissociáveis, na qual o terreiro é percebido e experimentado como centro vital. A cultura diferenciada e a organização social própria constituem patrimônio cultural afro-brasileiro. Em outubro de 2018, Manzo Ngunzo Kaiango foi registrada como patrimônio cultural do estado de Minas Gerais.

Nilma Lino


(foto: Edésio Ferreira/EM/D.A/Press -11/3/16)
Nascida em Belo Horizonte em 13 de março de 1961, Nilma Lino é um dos principais nomes para a implementação das cotas raciais no Brasil. Foi a primeira mulher negra do país a comandar uma universidade pública federal, ao ser nomeada reitora da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), em 2013. Em outubro de 2015 foi nomeada ministra das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, que uniu as secretarias de Políticas para Mulheres, Igualdade Racial, Direitos Humanos e parte das atribuições da Secretaria-Geral. Em 2019, tornou-se a primeira mulher negra a receber o título de professora emérita da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ingressou na Faculdade de Educação (FaE) da UFMG em 1984, no curso de pedagogia, e concluiu o mestrado em educação na mesma instuição em 1994. É doutora em antropologia social pela Universidade de São Paulo (USP). Cumpriu estágio pós-doutoral na Universidade de Coimbra, supervisionada por Boaventura de Souza Santos. De 2002 a 2013, coordenou o Programa de Ensino, Pesquisa e Extensão Ações Afirmativas na universidade.

Carolina Maria de Jesus


(foto: Arquivo O Cruzeiro/EM - 7/4/1971)
Carolina Maria de Jesus nasceu em Sacramento, no Alto Paranaíba, em 14 de março de 1914 e morreu em 13 de fevereiro de 1977. Tornou-se uma das primeiras escritoras negras brasileiras, ressaltando o valor intelectual da mulher negra e inspirando dezenas de gerações. É autora do livro Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada publicado em 1960 e já traduzido para 14 idiomas. Carolina viveu boa parte da vida no Canindé, favela na Zona Norte de São Paulo. Criou três filhos como catadora de papel, mas, mesmo diante da carestia, tornou-se escritora de destaque. Em inúmeros diários, mostrou para o mundo o que é sobreviver e lutar contra a fome.





Edimilson de Almeida Pereira


(foto: Flip Divulgação - 3/8/17)
Edimilson de Almeida Pereira é poeta, ensaísta, professor e pesquisador da cultura e da religiosidade afro-brasileiras. É hoje um dos grandes intelectuais brasileiros, com produção literária e acadêmica de destaque, a partir de uma perspectiva negra. Nasceu em 18 de julho de 1963, em Juiz de Fora, na Zona da Mata. Graduou-se em Letras pela UFJF em 1986 e se tornou especialista e mestre em ciência da religião pela mesma instituição. É doutor em comunicação e cultura pelo convênio UFRJ-UFJF. Autor prolífico, com dezenas de livros e artigos, estreou na literatura em 1985, aos 22 anos, com o volume de poemas Dormundo (1985). A partir de então, são inúmeras publicações no campo da poesia e na crítica, de cunho etnográfico, fruto de pesquisas de campo voltadas para a análise e compreensão da produção cultural baseada na diáspora africana no Brasil. É autor de Corpo vivido (1991); Livro de falas (1987); Árvore dos Arturos & outros poemas (1988); Corpo imprevisto & margem dos nomes (1989); e Ô Lapassi & outros ritmos de ouvido (1990).

Maria Mazzarello


(foto: Netun Lima/Light Press/Divulgação - 18/5/06)
Fundadora da Mazza Edições, uma das editoras mais importantes do Brasil, Maria Mazarello Rodrigues se baseou na experiência acumulada como uma das fundadoras da Editora do Professor e da Editora Vega, nos anos 1960 e 1970, e, logo após, com o mestrado em editoração realizado em Paris. A Mazza editou publicações sobre alguns dos principais acontecimentos da sociedade brasileira das últimas décadas. Conta em seu catálogo com vasta lista de escritores negros e livros que abordam a cultura afro-brasileira.

Pedro Valentim


(foto: Marcos Vieira/EM/DA Press - 25/6/09)
Pedro Valetim tem 36 anos e nasceu em 7 de setembro de 1983. Fez uma revolução em Belo Horizonte, quando com um grupo de jovens da cultura hip hop ocupou o Viaduto Santa Tereza, na região central, com arte. Jornalista de formação, integra desde a fundação, em 2007, a Família de Rua, coletivo que idealizou o Duelo de Mcs no espaço. O evento em forma de ocupação tem 12 anos no espaço público da capital e foi fundamental para a transformação da cena da cidade, junto a movimentos como Fora Lacerda, Praia da Estação e Carnaval de Belo Horizonte. O Duelo tem uma contribuição significativa na cena nacional do hip hop. Revelou nomes importantes para cultura da cidade, como Clara Lima, Hot e Oreia, FBC e Douglas Din. Embora nunca tenha duelado, também faz parte dessa geração o músico Djonga, nome que já faz parte do cenário nacional do rap. Pedro também integra a organização do Duelos de MCs nacional, maior batalha do gênero no Brasil que está na oitava edição. Em 2019, processo seletivo foi realizado nos 27 estados brasileiros, envolvendo 300 cidades, 500 batalhas e 3 mil MCs Brasil afora. A final de 2018 reuniu 40 mil pessoas no Viaduto Santa Tereza.





Cau Gomez


(foto: Solisluna Editora/Divulgação - 12/11/12)
Ilustrador, cartunista, chargista, caricaturista, artista gráfico e visual, Cau nasceu Cláudio Antônio Gomes, em Belo Horizonte, em 7 de fevereiro de 1972. Recebeu mais de 50 premiações nacionais e internacionais, incluindo dois mais recentes: 1º Prêmio/Caricatura, no 18º PortoCartoon World Festival, no Porto, Portugal e o 2º Prêmio/Cartum no 33º Aydin Dogan International Cartoon Competition, em Istambul, na Turquia. Radicado em Salvador, foi contemplado no fim de 2009 com o título de cidadão honorário, em reconhecimento pela atuação no jornalismo baiano. É coautor e ilustrador do livro Pastinha, o menino que virou mestre de capoeira, o único livro baiano infanto-juvenil a ser finalista do Prêmio Jabuti, em 2012, publicado pela Editora Solisluna. Também ilustrou os livros O dia em que os gatos aprenderam a tocar jazz (2012); Dias de tempestade (2013); e Eu, só uma pedra (2016) – esses pela Editora CEPE, em Pernambuco.

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