Jornal Estado de Minas

Apenas uma das 42 ações de reparação do rompimento de Fundão é satisfatória

Os reassentamentos de atingidos e as condições de suas moradias temporárias estão entre os problemas mais críticos - Foto: Edésio Ferreira/EM/D.A.PressDas 42 ações de reparação incumbidas à Fundação Renova em 2016, após o rompimento da Barragem do Fundão, 4 anos se passaram e apenas uma foi cumprida a contento na avaliação da consultoria Ramboll, contratada pelo Ministério Público Federal (MPF) para acompanhar os trabalhos. Trata-se da Ação 37, de gestão de riscos ambientais. Enquanto isso, asquestões como reassentamento de 330 famílias desalojadas pela onda de lama e rejeitos desprendida do barramento operado pela mineradora Samarco, as indenizações aos atingidos e a recuperação do meio ambiente ainda estão abaixo da expectativa dos procuradores. 


A reportagem do Estado de Minas teve acesso aos mais recentes relatórios da consultoria, sendo que 19 foram detalhados por serem os mais impactantes. Parte desse relatório, referente à falta de condições de 56% das moradias dos atingidos auditados foi antecipada pelo EM, no último domingo, mostrando que muitas delas se encontram em áreas de risco biológico, ambiental e construtivo.

Na quarta-feira (6), a reportagem mostrou que o reassentamento de Bento Rodrigues também apresenta lotes em áreas de risco e que seus gastos são alvo da lupa do MPF por causa da previsão de que custe cerca de R$ 400 milhões, mais de 2,5 vezes o preço original, de R$ 160 milhões.

Entre os problemas mais graves são destacados, por exemplo, a desconsideração de 1.654 atingidos. Apenas 17,5% dos cadastros apresentaram informações completas sobre renda de quem foi afetado pelo rompimento. Dos 60.602 cadastros requeridos, 29.072 (48%) estão pendentes. "A falta de informação sobre o processo de cadastramento tem gerado insegurança, boatos e conflitos nas comunidades, principalmente tendo em vista o longo tempo entre a realização do cadastro e a obtenção da resposta de reconhecimento, ou não, da condição de atingido", consideraram os consultores.

As indenizações mediadas também apresentaram pequena abragência segundoe o relatório. Cerca de 11% dos mais de 330 mil que deveriam ser indenizados pela poluição da água ainda não chegaram a um acordo. De 30.062 núcleos familiares cadastrados, apenas 9.329 (31%) receberam indenização.
"As indenizações não são, via de regra, viabilizadas em tempo adequado com as condições de vida e vulnerabilidades da população à qual o programa deveria atender. Em campo o que se verifica é uma situação de disputa pelo direito de ser reconhecido como atingido e ter acesso a uma indenização justa, bem como atingidos em busca de alternativas de sobrevivência em codições iguais ou melhores àquelas que possuiam anteriormente ao desastre", informa a consultoria.

O rompimento da Barragem do Fundão, em 5 de novembro de 2015, devastou a Bacia Hidrográfica do Rio Doce despejando mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro, até o mar no Espírito Santo. Calcula-se que mais de 700 mil pessoas foram afetadas, sendo que 19 pessoas morreram, uma delas continua desaparecida.

O programa 37, de gestão de riscos ambientais foi considerado entregue em julho de 2018, cumprindo a apresentação de estudo para identificar riscos ambientais dos ativos da Samarco (barragens e diques) diretamente afetados pelo rompimento que possam impactar na Bacia do Rio Doce, bem como a proposição de ações preventivas e mitigatórias associadas a esses riscos.

 

A Fundação Renova informou, por meio de nota, que "o cronograma inicial definido pelo TTAC não considerou a complexidade e a extensão do território atingido, pois não havia um conhecimento preciso da dimensão da tragédia". Até agosto, foram destinados R$ 6,68 bilhões para as ações integradas de recuperação e compensação. Cerca de R$ 1,84 bilhão foram pagos em indenizações e auxílios financeiros emergenciais para cerca de 320 mil pessoas. Mais de 1.400 obras foram executadas ao longo de todo o território atingido. "Os mais de 6 milhões de dados coletados em dois anos do maior programa de monitoramento da água do país mostram que as condições da bacia do rio Doce são hoje semelhantes às de antes do rompimento.

Hoje, o rio Doce é enquadrado na classe 2 pelo Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), e isso significa que a água pode ser consumida após tratamento convencional e ser destinada à irrigação".

 

Confira a lista de programas com problemas mais críticos:


Programas submetidos ao Comitê Interfederativo (Cif), seu orçamento e problemas encontrados

  •  01 - Cadastro de atingidos Não aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 105,67 milhões. Gastos R$ 90,52 milhões (86%). Problemas: Foram incorretamente desconsiderados 1.654 atingidos. Apenas 17,5% dos cadastros apresentaram informações completas sobre renda. Dos 60.602 cadastros requeridos, 29.072 (48%) estão pendentes

  • 02 - Indenização mediada Não aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 3,5 bilhões. Gastos R$ 991,4 milhões (28%). Problemas: De 30.062 núcleos familiares cadastrados, apenas 9.329 (31%) receberam indenização, considerado um total reduzido em função do tempo já passado desde o desastre; 4.483 (15%) foram considerados atingidos indiretos ou não elegíveis. Foram considerados ausentes os artesãos, ribeirinhos, areeiros, lavadeiras, pescadores de subsistência, coletores de mariscos e agricultores com piquete.
    Ainda em estudos preliminares a inclusão das aldeias indígenas, piscicultores, faiscadores e comunidades quilombolas. Em discussão os camaroeiros da Enseada do Suá e pescadores
  • 08 - Reassentamentos Não aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 1,65 bilhões. Gastos R$ 305 milhões (18%). Problemas: O descontentamento é grande. Só em Bento Rodrigues, 102 das 251 famílias ouvidas (41%) estão insatisfeitas com o lote ou as condições de reassentamento. Das 232 famílias em moradias temporárias visitadas, 131 (56%) se encontram em situação inadequada, em risco geológico, ambiental e condições precárias
  • 09 - Recuperação de Candonga Não aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 1,13 bilhões. Gastos R$ 671,59 mihões (59%). Problemas: A retirada de parte dos sedimentos depositados no lago está paralisada desde agosto de 2018 por problemas em sua realização. No momento, o trabalho de remoção de rejeitos está sendo reformulado
  • 14 - Apoio à saúde mental Não aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 146,39 milhões. Gastos R$ 50,38 Milhões (34%).
    Problemas: Fundação Renova tem implementado ações parciais de apoio à saúde dos atingidos, que se restingem apenas aos municípios de Mariana e Barra Longa. Ações estruturantes de acesso à água potável para a população atingida ainda não foram realizada
  • 16 - Retomada da pesca e aquicultura Não aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 27,53 milhões. Gastos R$ 1,5 milhão (5%). Problemas: De 20 subprojetos, apenas a promoção de assistência técnica e extensão rural, o apoio ao processo de organização social das comunidades e a implementação dos projetos de Aquicultura e Aquaponia foram implantados. Desde o rompimento da barragem de Fundão até hoje, de 47 municípios que apresentaram pescadores atingidos, representando quase 29 mil pescadores cadastrados, o programa realizou ações estruturantes apenas nos distritos de Regência e Povoação, no município de Linhares (ES)
  • 21 - Auxílio emergencial Não aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 1,92 bilhão. Gastos R$ 1,08 bilhão (56%). Problemas: De 29.672 famílias cadastradas, 18.183 (61%) ainda não recebem o Auxílio Financeiro Emergencial. Encontram-se em análises os cadastros de 6.448 famílias (22%). Grupos sem políticas específicas de auxílio abrangem 8.199 famílias (28%) que não recebem auxílio. Atingidos indiretos e não elegíveis somam 3.371 famílias (11%)
  • 23 e 24 - Manejo de rejeitos Parcialmente Aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 1,3 bilhão.
    Gastos R$ 1,021 bilhão (77%). Problemas: Apenas 2,6% do rejeito total foi removido da bacia. Os Planos de Manejo de Rejeitos que foram aprovados não estão sendo implementados pois ainda demandam processos de licenciamento ambiental
  • 25 - Recuperação da área diretamente atingida Aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 462,93 milhões. Gastos R$ 331,19 milhões (72%). Problemas: Mortalidade das mudas foi de 50%, com relação ao que foi plantado pela Fundação Renova. A mortalidade se justifica pela falta de tratos culturais, como roçada, combate a formigas, baixa densidade de mudas plantadas e ocorrência de processos erosivos. Além disso, a Fundação Renova não executou a reposição das mudas mortas. Verificou-se que foram plantadas mudas de espécies de árvores exóticas em locais onde só deveriam haver espécies nativas
  • 32 - Melhoria dos sistemas de abastecimento Não aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 357,76 milhões. Gastos R$ 203,56 milhões (57%). Problemas: Aproximadamente 70.000 habitantes continuam sendo abastecidos por sistema emergencial, sendo que desses, aproximadamente 30.000 ainda necessita de abastecimento por caminhões pipa
  • 38 - Monitoramento do rio Doce e mar Não Aprovado pelo Cif. Orçamento de R$ 442,44 milhões. Gastos R$ 183,51 milhões (41%). Problemas: Foram apresentados apenas 61% dos resultados de amostras de água. Coletas automáticas não são apresentados de forma clara e objetiva de acordo com a necessidade dos atingidos, pois usam linguagem técnica e sem a descrição de possíveis riscos à população atingida e seus usos da água. Dos 46 municípios banhados, 16 não têm monitoramento

 

Fonte: Ramboll 

.