Jornal Estado de Minas

POLÊMICA URBANA

Instalação de pedras sob viadutos de BH pode parar na Justiça



Sem acordo entre a Prefeitura de Belo Horizonte e os movimentos de defesa da população em situação de rua sobre a colocação de pedras nos baixios dos viadutos, a pendenga pode ser decidida na Justiça. A possibilidade de judicializar a questão foi levantada em audiência pública na Câmara Municipal de Belo Horizonte, depois de a prefeitura não ter indicado representantes para participar da discussão feita na casa legislativa ontem. A defensora Júnia Carvalho, da Defensoria Especializada em Direitos Humanos Coletivos e Socioambientais, indicou que acionar a prefeitura na Justiça pode ser um caminho a seguir. “Nos caminhos do diálogo a gente não tem tido resultado. A Defensoria Pública busca o diálogo em primeiro lugar, mas a gente não tem tido resultado”, afirmou.



Participaram da audiência representantes dos movimentos da população em situação de rua, Pastoral de Rua, grupo de pesquisa Indisciplinar da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e por vereadores. “As pedras violam os direitos humanos de quem nada tem. Kalil insiste em tirar das pessoas que nada têm. Ele é o Robin Hood dos ricos, que quer tirar dos pobres para deixar a prefeitura com os cofres gordos”, afirmou Samuel Rodrigues, da coordenação do Movimento Nacional de População em Situação de Rua, em referência ao prefeito Alexandre Kalil.

Os movimentos pontuaram que a colocação das pedras fere a dignidade dessa população, além de trazer para a cidade uma “arquitetura hostil".
"Colocar as pedras é uma forma de violência, uma agressão. As pedras de Kalil são a retirada dos pertences, a negação do direito à água e ao banheiro público na cidade, a retirada de bebês das mães em situação de rua. As pedras do Kalil são as políticas de assistência social com vagas e atendimentos insuficientes diante da demanda das pessoas em situação de rua em Belo Horizonte", afirmou Samuel.

Ele ressaltou que os baixios dos viadutos não são locais apropriados de moradia, mas frisou que para resolver o problema é preciso criar políticas de moradia, como o aluguel social. A defensora Júnia Carvalho afirmou que a Prefeitura de Belo Horizonte não vem cumprindo determinações judiciais em favor da população em situação de rua. “Contamos com o Judiciário para ser firme com a prefeitura. Temos decisões muito importantes do Judiciário, como a que proíbe o recolhimento de pertences de pessoas em situação de rua, que têm sido ignoradas pela prefeitura”, afirma a defensora.

A pesquisadora Gabriela Bitencourt, do grupo de pesquisa Indisciplina, defendeu que a prefeitura precisa deixar claro qual a motivação e o quanto está sendo gasto para a colocação das pedras. A audiência foi convocada pelo vereador Pedro Patrus (PT), que lamentou a ausência de representantes da prefeitura.
"Mais uma vez a prefeitura se faz ausente em audiência pública, que é fundamental para Belo Horizonte", afirmou. O vereador desaprovou a ação da prefeitura, caracterizando-a como "política desumana e higienista". "Serão pedras e mais espinhos? Essa vai ser a política de BH?", disse, reforçando que a implantação tem objetivo de inibir a permanência da população de rua naqueles locais.

O vereador petista questionou o argumento de Henrique Castilho, da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), de que se trata de uma medida de segurança. O superintendente afirmou à imprensa que as pedras têm objetivo de evitar danos às estruturas causadas pela queima de materiais, como fios de borracha para extração de cobre.

Também presente na reunião, a vereadora Bella Gonçalves (Psol) relembrou protesto realizado na quarta-feira em frente à prefeitura. "Ao colocar as pedras, a arquitetura da cidade passa a mensagem de violência e exclusão. Quais as marcas que essas pedras passam? Pedra não é a solução", afirmou a vereadora. Ela defendeu que a resolução do problema passa pela implementação de políticas públicas de moradia. Segundo a vereadora, as pedras colocam em risco cerca de 10 mil pessoas que estão em situação de rua.

Outro lado


Em nota, a prefeitura não respondeu diretamente sobre as alegações de que as pedras colocadas nos baixios representam uma ação higienista.
A nota informou que: "a Prefeitura informa, por meio da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), que está executando obras no Boulevard Arrudas, no trecho que compreende a avenida do Contorno entre as ruas Vinte e Um de Abril e Rio de Janeiro e também o complexo viário formado pelas alças Leste (parte nova concluída em julho de 2018) e Oeste (parte antiga, também chamada de Nansen Araújo) do Complexo da Lagoinha. Estão sendo feitos serviços de urbanização, paisagismo, irrigação e iluminação. Os trabalhos se iniciaram em abril de 2019, com previsão de término para o final do ano. O investimento total é de aproximadamente R$ 5,7 milhões."

A nota ainda detalhou o tratamento urbanístico na área de abrangência do canal do Ribeirão Arrudas tamponado: realocação e/ou substituição de postes de iluminação pública em virtude de ajustes de algumas calçadas; implantação de canteiros permeáveis; readequação do mobiliário urbano; criação de percursos ajardinados e passeios confortáveis e acessíveis para circulação de pedestres, fornecendo estrutura para instalações de bancos; colocação de lixeiras e equipamentos de ginástica; plantio de árvores; implantação de sistema de irrigação; execução de pista de skate (área sob o viaduto da nova alça do viaduto); execução de quadras, arquibancadas e vestiário de apoio (área sob o viaduto Leste).

Por fim, a nota afirma que, no momento, não há programação de início de obras de tratamento urbanístico e paisagismo nos baixios de outros viadutos.
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