Jornal Estado de Minas

Família que perdeu parente para a febre maculosa revive pesadelo com surto da doença



O colo do avô se tornou a referência paterna desde que a febre maculosa matou o pai da pequena Isadora Eduarda Moreira Lima, de 7 anos. “Não ando mais no mato, não passo nem perto. Morro de medo do carrapato e de a doença matar a gente”, diz a menina, um reflexo dos temores devido à febre maculosa ter se alastrado. Seu pai, o empresário Aristeu de Souza Lima, de 42, morreu vítima do mal em 2017 no Bairro Carajás, em Contagem, vizinho ao Bairro Nacional, que se tornou este mês foco da doença transmitida pelo carrapato-estrela, com quatro óbitos confirmados, um doente suspeito e 40 casos investigados. Aristeu deixou três filhos e a esposa, todos agora morando com o avô, o aposentado José da Conceição Moreira, de 71. Ontem, a prefeitura iniciou os banhos com carrapaticidas nos cavalos de carroceiros para tentar estancar o atual surto no município da Grande BH.

Em Minas, a febre maculosa já foi confirmada em nove pacientes e provocou seis óbitos de acordo com a contabilidade da Secretaria de Estado da Saúde. Além de Contagem, foram registradas mortes em Raul Soares e Faria Lemos, municípios da Zona da Mata. “Meu genro foi um dos primeiros a morrer dessa praga.
Teve dor no corpo e febre. Ninguém sabia o que era. Aí, ele piorou muito e não aguentou. A gente acha que pegou a doença dos carrapatos da Pampulha, onde ele ia muito a cavalo. Nosso medo voltou com esses carrapatos. Queremos que isso seja tratado para ter nossa vida de volta”, lamentou o aposentado.

A Prefeitura de Contagem iniciou o trabalho de aplicação de carrapaticida em cerca de 100 cavalos que trabalham na região do Bairro Carajás, em Contagem, na Grande BH. A ação visa ao controle do carrapato-estrela, vetor da febre maculosa.
Os carrapatos chegam por meio de capivaras que têm ligação com a bacia da Pampulha, em BH, e são transportados por esses animais até os cavalos de carroceiros, ganhando, assim, acesso a outras áreas de Contagem, onde os animais transportam entulho de construções, reformas e podas, de acordo com a administração municipal.

Segundo o diretor de vigilância ambiental e controle de zoonoses de Contagem, José Renato de Rezende Costa, todos os criadores de equinos da região podem ir até os ecopontos do município para o controle das pragas. “Os banhos de carrapaticida podem ocorrer de 15 em 15 dias, matando completamente os carrapatos instalados nos animais. Os proprietários não são obrigados a esses procedimentos, mas são responsáveis pela saúde dos animais”, afirma o diretor.

RECEIO No ecoponto do Bairro Carajás, além dos cavalos que transitam trazendo entulhos, há vários animais que por lá circulam em busca de pastos e da água de um dos córregos afluentes da bacia da Pampulha, apesar do esgoto lançado no manancial. De acordo com o lanterneiro Jairo Ferreira dos Santos, de 64, a população está apavorada, uma vez que são vizinhos do Bairro Nacional, onde os casos recentes ocorreram. “As pessoas evitam passar nos lugares, mantêm distância. Nos fundos dos nossos quintais tem mata e passam cavalos, por isso temos medo, estamos prendendo as crianças dentro de casa”, comenta.

Segundo José da Conceição, as capivaras contaminadas vêm da Lagoa da Pampulha pela tubulação que canaliza os córregos da região. “As capivaras chegam até a Lagoa da Gangorra.
Aqui, espalham os carrapatos para os cavalos dos carroceiros que pastam soltos e até para as pessoas que vêm aqui pescar”, diz. A população local cobra um tratamento especial contra a praga e também ações básicas de conservação da Rua Pedro Álvares Cabral, que se tornou ponto de bota-foras clandestinos e tem sido engolida por uma grande erosão. O espaço também é cruzado como atalho pelos moradores para acessar os bairros Bom Jesus, Amendoeiras, Nacional e Novo Horizonte..