A passarela que liga a Praça Vaz de Melo ao Terminal Rodoviário, passando pelo acesso da estação de metrô na Lagoinha, na região Noroeste de Belo Horizonte, testemunha todo dia o vai e vem de milhares de pessoas que chegam e partem da rodoviária e do metrô. Nos últimos dias, porém, os passos apressados deram lugar ao caminhar vagaroso e a um olhar atento ao que tem no entorno. Os passantes param para ver as pinceladas de três artistas de Belo Horizonte, Clara Valente, João Gabriel dos Santos Araújo e Gabriel Dias, e da italiana Alice Pasquini, que fazem um grande mural na extensão de toda a passarela e no baixio do Complexo da Lagoinha.
As pinturas também terão a Noiva do Bonfim, a lendária fantasma do cemitério do mesmo nome; Cintura Fina, figura mítica do Bairro da velha guarda da cafetinagem e malandragem, e a vila Pedreira Prado Lopes, de onde foram retiradas as pedras para a construção de Belo Horizonte no fim do século 19. “Vou usar símbolos para representar, como o calango para fazer referência à Pedreira e à navalha do Cintura Fina”, conta João Gabriel. O mural começou a ser feito na segunda-feira e deverá ser entregue à população de BH em 2 de maio.
O mural é uma das ações propostas pelo Movimento Gentileza, que há um ano e meio, sob a coordenação da primeira-dama da capital, Ana Laender, realiza ações de inclusão cultural e para requalificação do espaço urbano por meio da arte.
O Bairro Lagoinha foi fundado por imigrantes italianos, que vieram trabalhar na construção da capital mineira. A participação dos italianos nesse momento histórico fez com que o Consulado da Itália se tornasse parceiro do Movimento Gentileza, com convite feito à artista Alice Pasquini, que está empenhada na pintura dos pilares do baixio do Complexo da Lagoinha.
Ela concebeu para os desenhos imagem de duas mulheres e um homem, representando a composição múltipla dos fundadores do bairro: italianos, africanos e brasileiros. “É como se fossem os pilares. Queria expressar cada uma dessas identidades no meu trabalho”, afirma a artista, que pintou murais em Roma, sua cidade natal, em Los Angeles, na Califórnia (EUA), e em São Paulo (SP).
Moradores
A criação do mural vai ao encontro de ações empreendidas pelos coletivos locais, como o Viva Lagoinha, para valorizar o bairro do ponto de vista arquitetônico, cultural e, sobretudo, valorizar os moradores que lá viveram e ainda vivem. “A gente recebe de muito bom grado e de coração muito aberto as cores no Lagoinha. Começar a por cor em lugar que exala cultura é uma coisa muito boa. A história da cidade começa na Lagoinha”, afirma Filipe Thales, um dos idealizadores do Viva Lagoinha.
As paredes da passarela foram transformadas em telas à céu aberto, o que faz com que os artistas tenham contato com as milhares de pessoas que circulam por ali. “Tem um fluxo de pessoa muito grande. Elas vão poder apreciar a arte na rua o tempo todo”, diz Clara Valente. E aposta nos desenhos como alívio para o estresse da cidade grande. “É um descanso para os olhos. Queremos fazer da passarela um lugar acolhedor”, completa.
Gabriel Dias está habituado com a interação com as pessoas enquanto pinta. “Meu trabalho é na rua”, diz. As pinceladas atacam a “a monotonia da cidade”, desbancando o cinza do concreto que toma conta de tudo.
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