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Estado de Minas

Agricultor sem chance de se salvar em caso de rompimento de barragem em Congonhas pede socorro

Morador de Congonhas que vive a 200 metros da Barragem Casa de Pedra teria imóvel atingido instantaneamente em caso de desastre. MP recomenda remoção de 2,5 mil pessoas ameaçadas


postado em 14/03/2019 06:00 / atualizado em 14/03/2019 07:32

Lézio de Oliveira perdeu clientela devido à preocupação com a barragem gigante diante de seu terreno (foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
Lézio de Oliveira perdeu clientela devido à preocupação com a barragem gigante diante de seu terreno (foto: Túlio Santos/EM/DA Press)


A conta apertada não sai da cabeça das cerca de 4,8 mil pessoas de Congonhas que moram sob a ameaça da Barragem de Casa de Pedra, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Em aproximadamente 30 segundos, as primeiras casas de bairros como Residencial Gualter Monteiro, Cristo Rei, Eldorado e Royal Park podem ser soterradas caso o represamento de rejeitos de minério de ferro se rompa, liberando 21 milhões de metros cúbicos do material armazenado em uma das maiores represas em área urbana do mundo. Mas esse prazo, apesar de exíguo, não é sequer considerado por pelo menos uma pessoa: o eletricista Lézio Domingos de Oliveira, de 59 anos, mora a exatos 200 metros do barramento. Em caso de rompimento, a chegada da avalanche de lama à sua propriedade seria instantânea. “O que eu queria mesmo era que a CSN comprasse meu terreno. Não quero abandonar o que tenho aqui, mas a gente não tem sossego, não dorme, não tem qualquer condição”, disse.

A situação da barragem, que já teve a sua estabilidade questionada pelo Ministério Público de Congonhas por duas vezes, em 2013 e 2017, fez com que o eletricista perdesse a clientela que tinha montado em seu imóvel. “Quando comprei esse terreno, em 2011, montei um pesque e pague. Desde que os problemas da barragem começaram a assustar todo mundo, não recebi mais nenhum cliente. Agora, estou sobrevivendo de vender as hortaliças que planto. Mas, pelo jeito, o mais certo e seguro é ir embora. Mas quem vai comprar esse meu terreno? Só a CSN mesmo”, afirma.

Desde terça-feira, a situação da barragem, que há muito preocupa moradores e autoridades, tem tirado o sono de pessoas dos bairros ameaçados. Anteontem, o Ministério Público recomendou que a CSN removesse habitantes de 600 casas, cerca de 2,5 mil pessoas, moradoras dos bairros Cristo Rei e Residencial Gualter Monteiro, devido ao perigo de serem atingidas, sem chance de evacuação ou socorro por meio de equipes de resgate do poder público, como Bombeiros e Defesa Civil.

O diretor da União das Associações Comunitárias de Congonhas (Unaccon), Sandoval de Souza, não vê saída que não seja mesmo a evacuação. “As reclamações são uníssonas: população, líderes comunitários, vereadores e até o prefeito não se dizem devidamente esclarecidos sobre as condições e planos de resposta a eventuais problemas na barragem.” Para ele, cabe à CSN garantir a segurança e a tranquilidade da comunidade. “Quem é responsável por tudo é o grupo empresarial que fez a barragem. Eles a construíram, ampliaram, operam, monitoram e dão manutenção. O povo não pode viver na incerteza. Diante dela, o melhor é seguir a recomendação do MP. Precaução é muito mais racional que reagir depois do problema”, afirma.

Na recomendação do MP expedida terça-feira, à qual o Estado de Minas teve acesso, a promotoria de Congonhas recomenda que a CSN retire os moradores dos bairros Cristo Rei e Residencial Gualter Monteiro, “que assim desejarem” – ou seja, a mudança é voluntária, ao contrário de outros processos de evacuação ocorridos desde a tragédia com a represa da Vale em Brumadinho – e forneça aluguel no valor de R$ 1,5 mil para cada núcleo familiar, além de arcar com todas as despesas das mudanças.

A mineradora deverá ainda ter um plano para remoção voluntária dos moradores dos dois bairros, “seja por meio da compra de imóveis em Congonhas/ou outra cidade; ou mediante a criação de bairros, com toda infraestrutura prevista em lei, e/ou mediante a indenização dos proprietários”. Na avaliação dos imóveis, a promotoria também recomenda que não seja considerada a desvalorização devido aos rompimentos das barragens em Mariana e Brumadinho. A CSN tem 10 dias para se manifestar sobre as recomendações. Caso não as acate, o MP deve ingressar com ação judicial para forçar a mineradora a agir. 

ESCOLAS PARADAS
A preocupação com a Barragem Casa de Pedra já causou mudança na rotina de moradores dos bairros próximos. Em 15 de fevereiro, a Secretaria de Educação de Congonhas decidiu paralisar temporariamente as atividades da Creche Dom Luciano, devido à sensação de insegurança das famílias em relação à represa de rejeitos. Alunos da Escola Municipal Conceição Lima Guimarães também foram remanejados.

Por isso, segundo o MP, a empresa deverá apresentar ainda, em caráter emergencial, solução para o fechamento da creche e a transferência da escola. A recomendação é de que sejam alugados imóveis que comportem as instalações das duas unidades de ensino. Além disso, a companhia deverá “arcar com todas as despesas de mudança e ajustes dos prédios aos enquadramentos técnicos necessários”.

Por meio de nota, a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Cedec) informou que não foi identificado risco de rompimento da Barragem Casa de Pedra ou elevação do nível de emergência da barragem.

 

Reassentamento adiado em Mariana


A Justiça determinou que as mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton (empresas responsáveis pela Barragem do Fundão, em Mariana) reassentem, até agosto do ano que vem, as pessoas atingidas pelo rompimento da represa de rejeitos, no início de novembro de 2015. Inicialmente, as mineradoras deveriam garantir o reassentamento dos moradores de oito comunidades até este mês. Porém, as companhias alegaram problemas burocráticos que impediriam o cumprimento do prazo e conseguiram o adiamento. A decisão afeta 300 famílias que viviam nas comunidades de Bento Rodrigues, Paracatu de Cima, Paracatu de Baixo, Ponte do Gama, Pedras, Borba, Camargos e Campinas.    

Apreensão em capítulos


» Novembro de 2013
CSN e Ministério Público assinam Termo de Ajustamento de Conduta após detecção de problemas na obra de alteamento da Barragem Casa de Pedra. Questões teriam sido sanadas

» Novembro de 2016
Infiltrações são detectadas na barragem Dique de Sela, parte da Casa de Pedra, voltada para três bairros de Congonhas

» Outubro de 2017
Em fiscalização da Feam, foram detectadas infiltrações no corpo da barragem do Dique de Sela. Semad e DNPM informados

» 14 de outubro de 2017
Ministério Público do Trabalho determina paralisação das atividades da mina Casa de Pedra

» 9 de novembro de 2017
O Estado de Minas obtém documentos que mostram que o governo estadual criou força-tarefa para traçar um projeto próprio de evacuação em caso de rompimento do Dique de Sela

» 26 de novembro de 2017
CSN e Coordenadoria Municipal de Defesa Civil de Congonhas anunciam simulado do plano de segurança de barragens, mas tudo praticamente se reduz ao teste público de duas sirenes. Uma delas falhou. Placas para rotas de fuga são instaladas e seleção de locais supostamente seguros é feita

» 30 de novembro de 2017
CSN protocola laudo de segurança da Barragem de Casa de Pedra no Ministério Público, garantindo que os dois lados do Dique de Sela superaram o fator de segurança mínimo 1,5, chegando a 1,6 e 1,8

» 12 de abril de 2018
O EM divulga laudo do MP que reconhece a estabilidade da barragem

» 16 de junho de 2018
CSN, Prefeitura de Congonhas, Bombeiros, Polícia Militar e demais órgãos de Defesa Civil fazem novo teste de acionamento de sirenes. Prefeitura sugere ajustes e implementação de sirenes móveis em carros e motos

» Janeiro de 2019
Sob o impacto da tragédia de Brumadinho, a Prefeitura de Congonhas anuncia multa de R$ 2 milhões para cada uma das quatro mineradoras que atuam na região, por descumprir medidas de segurança, entre elas a CSN, responsável pela Casa de Pedra

» 12 de março de 2019
Promotoria de Congonhas expede recomendação para que a CSN retire aproximadamente 2,5 mil pessoas de 600 casas diretamente ameaçadas em caso de rompimento da represa. O prazo é de 10 dias, após os quais será proposta ação judicial, caso a mineradora não cumpra as medidas recomendadas 


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