Brumadinho – “Estou vivendo fases, não sei como será amanhã. Vivo um dia de cada vez.” Elaine Gomes Costa Santana, de 41 anos, perdeu o filho mais velho, David Marlon Gomes Santana, de 24, vítima da barragem do Feijão, em Brumadinho, na Região Metropolitana de BH, que se rompeu na última sexta-feira e levou tudo que estava pela frente. Passado o sepultamento precoce do jovem, Eliane busca forças e ajuda psicológica para seguir em frente. Tratar a saúde mental torna-se prioridade para aqueles que ficaram. Aplicação de Reiki, de auriculoterapia e uso de florais também estão sendo recomendados.
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Funcionários que estavam em caminhonete contam como sobreviveram ao tsunami de lamaBombeiros afirmam que nenhum metro de lama ficará sem ser verificadoVeja os perfis das vítimas identificadas após rompimento da barragem de BrumadinhoPalestra sobre psicologia de emergências e desastres aborda atendimento em BrumadinhoDepois de Mariana, licenciamento ambiental em Minas ficou mais flexívelMinistério Público do Trabalho e sindicatos se mobilizam para garantir direitos de empregados da ValeA preocupação tem fundamento. No ano passado, o Núcleo de Pesquisa e Vulnerabilidade em Saúde da UFMG (Naves) e a Cáritas Regional Minas Gerais, divulgaram uma pesquisa que avaliou o quadro psicológico dos atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão, em 2015, em Mariana, na Região Central do estado. Os dados indicaram um quadro de depressão em 28,9% da população de indivíduos afetados, percentual cinco vezes superior ao constatado na população geral do país (5,8%) segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). A depressão é um transtorno que afeta 11,5 milhões de brasileiros.
Para evitar que o índice se repita com as vítimas da tragédia de Brumadinho, muitos voluntários de diferentes frentes – ONGs, igrejas, instituições – e profissionais contratados pela Vale estão tentando ajudar os atingidos a superar ou assimilar o que ocorreu no dia 25 de janeiro. Por toda parte na cidade é possível encontrar pessoas com um adesivo ou um crachá improvisado com a identificação “psicólogo”. Muitos batem de porta em porta para oferecer atenção aos que mais precisam. Uma das iniciativas é da ONG Nação, que trouxe dezenas de profissionais para tratar a saúde mental dessas pessoas. “Temos várias frentes. Equipes acompanhando velórios e outras acompanhando pessoas que estão no pior do momento: a tortura de não saber onde está seu ente querido”, explicou a psicóloga da ONG, Rosana Dório, que é pós-doutora em luto em situação de tragédia e atuou no acolhimento das famílias das vítimas da Boate Kiss, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, há seis anos. “O impacto de uma notícia dessa já é terrível, mas, quando o impacto se prolonga, essas pessoas vão se machucando cada vez mais”, acrescentou.
Por isso a busca ansiosa por listas atualizadas com os nomes angustia tantas famílias.
Tristeza sem fim Elaine, que perdeu o filho David, procurou ajuda psicológica em um posto de saúde da zona rural de Brumadinho.
Johnny de Andrade, de 25, acompanhou a avó ao mesmo posto onde estava Elaine. “Graças a Deus, todos nós sobrevivemos. Mas, a lama pegou duas casas e três chácaras. Desde então, ela está desnorteada”, contou, enquanto a senhora era atendida pelo psicólogo. “Ela já tinha problema com glicose, mas, desde então, a taxa começou a subir muito. Fica muito nervosa, cabeça fraca. Melhor vocês (reportagem) nem falarem sobre isso com ela, porque começa a passar mal”, lamentou o jovem.
De acordo com a psicóloga Rosana, sintomas são considerados “normais” em situações “anormais”, como o rompimento da barragem. “Sono, grito, choro, pesadelo, falta de apetite, diarreia e vômito são sintomas esperados em caso de situação traumática. O evento traumático causa um impacto na pessoa. Em alguns casos, a estrutura psíquica suporta e as vítimas conseguem sair sem adoecimento”, informou. Para isso, no entanto, o trabalho precisa ser ininterrupto: “O acompanhamento tem que ser continuo. Atuamos há seis anos como voluntários com as vítimas do incêndio da Boate Kiss”.
No Espaço Conhecimento, em Brumadinho, onde as vítimas estão concentradas, aguardando a notícias dos entes queridos, a Vale contratou 45 psicólogos da empresa Optum para ficar 24 horas à disposição de quem necessite. De acordo com Carmem Cremonezi, gerente de operações de bem-estar da empresa, a procura é significativa. Não foi possível levantar números. Psiquiatras e psicólogos da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) também fazem plantão para dar suporte às famílias. Os profissionais estão atuando também no apoio a parentes no Instituto Médico-Legal (IML) de Belo Horizonte.
TRATAMENTO ALTERNATIVO Outro trabalho importante oferecido pela Secretaria de Saúde de Brumadinho é o tratamento com auriculoterapia – técnica de acupuntura em pontos do ouvido externo – para diagnóstico e tratamento, além de aplicação de Reiki e uso de floral. “A auriculoterapia trabalha o estresse, o medo e aumenta a imunidade. Também trabalhamos com terapia de florais, distribuindo as doses emergenciais para trabalhar e centrar a pessoa”, contou Zuma Borsato, enfermeira acupunturista da rede de saúde da cidade. Os medicamentos psiquiátricos ainda podem ser necessários em alguns casos, mas o trabalho psicológico e terapêutico pode ajudar no alívio momentâneo dessas famílias. Elaine Gomes Costa Santana terminou a sessão com o psicológico e fez os três procedimentos. “Estou muito mais relaxada, fiquei até com sono”, relatou ela. Zuma atende cerca de 10 pessoas por dia..