Jornal Estado de Minas

Atraso dos novos abrigos de ônibus expõe população a estruturas precárias

Ana Carolina sob estrutura destruída no Bairro Esplanada. Depois da visita da reportagem, abrigo foi trocado, mas permaneceu no estilo antigo (abaixo) - Foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A PRESS
Nas ruas de Belo Horizonte, boa parte da população que depende do transporte público espera ônibus sob sol ou chuva, em estruturas quebradas, sujas, depredadas ou muitas vezes em pontos sem qualquer proteção. Enquanto passageiros aguardam sem o mínimo de comodidade, está atrasada a principal ação para minimizar esse problema e aumentar o conforto dos usuários do serviço. Para piorar, até abrigos que já foram trocados há pouco tempo representam problemas e em alguns casos obrigam o cidadão a ficar no tempo, bem ao lado de estruturas recém-instaladas.

Dos 500 novos abrigos com mais espaço, tecnologia e conforto que já deveriam estar funcionando na cidade até 31 de agosto, a empresa responsável havia instalado 436 até aquela data. A última atualização da BHTrans indicava que 488 abrigos estão colocados, com perspectiva de alcançar 500 até o fim do ano, com quatro meses de atraso.

A obrigação é chegar a 1,3 mil novos pontos em quatro anos, dentro de um serviço que começou em junho de 2016. Além da demora, muitos novos abrigos que já estão colocados nas ruas ainda não estão completos. O principal item ausente é o painel que informa o tempo de espera para os coletivos. O atraso na viabilização da novidade levou a BHTrans a advertir a empresa responsável pela colocação das estruturas, sob ameaça de multa caso a firma não entre com recurso e explique os motivos da demora.

Entre as estruturas consideradas antigas na cidade, no modelo anterior aos novos abrigos, é fácil encontrar exemplos de abandono do poder público. Na Rua 28 de Setembro, a principal do Bairro Esplanada, na Região Leste de BH, a situação do ponto de ônibus obrigou o estudante Glauber Castro, de 22 anos, a esperar o coletivo que o levaria até a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) no lado contrário da rua.
“Estou aqui justamente para aproveitar a sombra da árvore. Se ficar no ponto o sol incomoda bastante”, diz ele. Faltava cobertura na estrutura, assim como proteção no espaço destinado a publicidade.

Depois que a reportagem do Estado de Minas passou pelo local, a cobertura foi trocada, mas a estrutura antiga se manteve. “Tem dois anos e meio que pego ônibus aqui para ir à faculdade desse jeito. Não temos conforto, ficamos expostos a sol e chuva e não sabemos a que hora os ônibus vão passar”, disse ele. A indicação do horário dos coletivos, presente em vários pontos da cidade por meio de painéis eletrônicos, é importante para a estudante Ana Carolina Chaves, de14, que mora no Esplanada e estuda no Santa Tereza, ambos bairros da Região Leste. Ela usa o mesmo ponto de Glauber.
“Acho importante saber o horário para me organizar, já que estou sempre atrasada”, disse.

Cobertura do ponto no Bairro Esplanada foi trocada depois que reportagem do EM visitou o local - Foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A PRESS
- Foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A PRESS

O exemplo da falta de manutenção das estruturas mais antigas não se restringes a bairros, mas se repete em corredores mais movimentados da cidade, como a Avenida Getúlio Vargas. A cobertura do ponto de ônibus instalado em frente ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT), no Bairro Funcionários, Centro-Sul de BH, passou muito tempo completamente destruída, com placas quebradas. A estrutura também foi modificada após o registro da reportagem, mas, nesse caso, a instalação do novo abrigo ainda não representa melhoria. A antiga estrutura ficou largada no chão, praticamente embaixo da nova, deixando passageiros expostos a sol e chuva.

A principal solução lançada pela BHTrans para melhorar o conforto de quem espera ônibus na capital é a implantação dos 1,3 mil abrigos já contratados. A Emerge BH, que está atrasada com o serviço, venceu a licitação para instalar as estruturas, com a contrapartida de explorar publicidade nos locais. Com mais espaço, aumentou o conforto nos pontos contemplados, que oferecem maior proteção contra sol e chuva, prometem oferecer internet wi-fi e informar o tempo para a chegada de cada ônibus.

A cuidadora de idosos Ellen Grace de Lima, de 31, diz que a diferença é enorme em relação aos pontos comuns. “Você fica protegido de sol e chuva, vê a hora em que seu ônibus vai passar e fica muito mais confortável.
Isso deveria se espalhar para a cidade inteira. Moro em Venda Nova e lá não tem isso”, afirma ela, que usa com frequência um dos novos pontos na Avenida Raja Gabaglia, no Bairro Luxemburgo, Centro-Sul de BH.

Um balanço feito pela BHTrans na quarta-feira apontava 488 abrigos instalados até então. A empresa que faz a gestão do transporte e trânsito na cidade já havia admitido atraso anteriormente, mas reviu alguns prazos, principalmente devido a problemas criados para deficientes visuais, que não estavam conseguindo detectar os novos equipamentos e esbarravam neles. Por isso foi suspensa a colocação das estruturas até que o escritório de arquitetura responsável pelo projeto desse uma solução para a questão. A BHTrans, então, publicou no Diário Oficial do Município de terça-feira uma advertência à Emerge pelo atraso no cronograma. “Fica aberto o prazo de 10 dias úteis, a contar da publicação desta, para recurso. A não apresentação de recurso é passível de multa”, informou a BHTrans.

- Foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A PRESS
Ponto da Savassi (acima) adequado à nova tecnologia, com o visor que aponta o tempo previsto para a chegada do transporte público (abaixo)

- Foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A PRESS

Outra situação que se observada nas ruas é que em alguns pontos já em formato novo, mais moderno, apesar de a estrutura metálica estar posicionada, não há o painel indicativo do tempo para a chegada dos ônibus. Um dos lugares onde que isso ocorre é o ponto da Avenida do Contorno quase em frente ao Hotel Mercury, no Bairro Santo Antônio, Centro-Sul de BH. Acostumada a pegar ônibus em vários lugares da cidade, a auxiliar de escritório Fabiana Reis, de 29, diz que sempre consulta o painel pelos pontos por que passa. “Quando não tem a hora, a gente fica ansiosa, sem saber se já passou.
Até tenho o aplicativo da BHTrans, mas meu celular vive sem bateria e por isso acabo muitas vezes sem informação”, afirma.

A BHTrans informou que essa é a primeira punição à empresa por atraso no cronograma de implantação, mas já houve outras sanções relacionadas à colocação de abrigos sem autorização e à não apresentação de garantias contratuais. A Emerge BH vai investir em 25 anos de contrato R$ 51 milhões, levando em consideração implantação e manutenção das estruturas. A empresa pagou R$ 1 milhão de outorga pelo serviço e também tem que gastar mensalmente R$ 58,59 por ponto instalado. Não há custos do poder público para consertar ou implantar abrigos no contrato. O retorno da empresa vem pela exploração da publicidade nos abrigos. O Estado de Minas  tentou contato com a Emerge BH, mas ninguém foi encontrado para comentar o atraso na colocação dos pontos.



SEM PADRONIZAÇÃO


Uma situação chama a atenção nos novos abrigos, pela falta de padronização em relação ao aplicativo que a BHTrans disponibiliza para que os passageiros acompanhem o tempo para a passagem dos ônibus. O App SIU Mobile (foto), que mostra quanto tempo falta para a chegada de cada veículo, leva em consideração o endereço dos pontos de ônibus. Já os novos abrigos são caracterizados por nomes, como o abrigo da Avenida Afonso Pena entre as ruas Ceará e Santa Rita Durão, sentido Mangabeiras. Ele traz a identificação “Praça ABC 1”, o que obriga o usuário a saber o endereço exato de onde se encontra para localizar a parada no App. Como muitas vezes só se sabe o nome da rua ou avenida e o número não é tão visível, o passageiro tem certa dificuldade de localizar a parada exata.


NOVOS ABRIGOS

Confira o que diz o contrato e o andamento dos serviços

» O contrato da BHTrans com a Emerge BH prevê a implantação, em quatro anos, de 1,3 mil novos abrigos na cidade, com mais espaço, tecnologia e design moderno.
Um dos diferenciais é a indicação do tempo para a chegada de cada linha de ônibus naquela parada.

» Até 31 de agosto, a empresa deveria ter implantado 500 abrigos, mas fez apenas 436, o que gerou advertência da BHTrans. Última atualização de 21 de novembro apontava 488 colocados.

» O contrato prevê investimentos da empresa, entre instalação e manutenção, de R$ 51 milhões em 25 anos de operação. Para ganhar a licitação, a empresa pagou uma outorga de cerca de R$ 1 milhão à PBH e precisa remunerar os cofres públicos em R$ 58,59 mensais por abrigo instalado..