Jornal Estado de Minas

Feminicídio aumenta 5% em 2018 em Minas Gerais. Já são 106 mortes

- Foto: Jaciara Sousa Nascimento, de 30 anos, estava em casa, em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, quando foi surpreendida pelo ex-companheiro, de 21, acompanhado de um adolescente de 17. Acabou sendo assassinada a facadas. A quilômetros de distância dali, em Lajinha, na Zona da Mata, Michele Aparecida de Medeiros, de 40, foi assassinada na frente dos filhos. O principal suspeito é o ex-marido. O destino das duas se cruza em uma estatística a cada dia mais preocupante: somente nos primeiros nove meses deste ano, 106 mulheres foram assassinadas por menosprezo pela condição feminina, discriminação ou por violência doméstica. O quadro real de feminicídio, como são definidos esses casos, é ainda mais grave, já que não entram na estatística casos como os das duas últimas vítimas, mortas nesta semana.

Os números vêm subindo ano a ano. Em 2018, segundo dados divulgados pela Polícia Civil, a média é de uma morte de mulher enquadrada como feminicídio a cada três dias. Os 106 assassinatos registrados entre janeiro e setembro deste ano são 5% superiores aos 101 casos do mesmo período de 2017.
As tentativas de feminicídio também seguem altas, embora tenham registrado recuo. Nos primeiros nove meses foram 208 casos registrados, média de quase um por dia. Em comparação com o período anterior, houve queda de 11% no número de ocorrências.

Somente em setembro, Minas Gerais registrou 20 mortes de mulheres enquadradas nesta tipificação, 25% a mais que o mesmo mês do ano passado e o período mais violento em relação a esse tipo de crime no ano (veja quadro). Embora não haja estatística oficial, outubro também está sendo violento. Levantamento do Estado de Minas indica que ao menos cinco casos foram registrados, dois no mesmo dia.

Um deles foi o assassinato de Jaciara. De acordo com boletim de ocorrência da PM, testemunhas chegaram à casa dela, no Bairro Santa Helena, e encontraram  a mulher caída na entrada de um quarto. Os policiais entraram no imóvel e viram uma grande quantidade de sangue ao redor do corpo.

Militares dos bombeiros constataram a morte. Uma pessoa que disse ter ido à casa por volta das 13h observou que dois homens saíram correndo do local e fugiram em uma moto cinza. A vítima foi morta com duas facadas no rosto, três no pescoço e uma no peito.

Policiais da Delegacia de Homicídios encontraram mensagens no celular da mulher, em conversa via WhatsApp, de ameaças do ex-companheiro. Testemunhas também afirmaram que o relacionamento dos dois era conturbado. Diante da suspeita, a polícia se deslocou até a casa de D.S.R., de 21, e foi informado pela mãe dele que o jovem não aparecia no local desde a noite de terça-feira.

Indicou uma praça como um local que ele costumava frequentar, próximo a uma escola. Lá, policiais abordaram diversas pessoas. No celular do adolescente de 17 eles conseguiram ver uma mensagem do ex-companheiro da vítima, em que ele confessava o crime.

Os policiais seguiram o menor, sem ele perceber, e chegaram até uma mulher, de 27.

Ao ser questionada, segundo a PM, ela confessou que o suspeito de homicídio estava escondido na casa dela, mas que não sabia que crime ele teria cometido. O acusado foi encontrado e, de acordo com o boletim de ocorrência da PM, confessou o crime e disse ainda que estava acompanhado do adolescente.

Segundo a PM, em conversa com os militares, o menor afirmou que não agiu diretamente no crime e que somente deu apoio do lado de fora da casa. Ele mostrou vídeos aos policiais que mostram o assassinato da mulher e imagens com a moto, que havia sido roubada. No celular também foram encontrados outros vídeos de mulheres sendo esfaqueadas.

Crianças presenciam
assassinato da mãe

Nem mesmo a presença de dois filhos menores de 9 anos impediu o assassinato de Michele Aparecida de Medeiros, em um distrito de Lajinha, na Zona da Mata. Ela já tinha medida protetiva contra o ex-companheiro, Anderson da Silva Nascimento, de 37, acusado do crime. A possível motivação seria ciúme. A filha do casal contou que Anderson chegou acusando Michele de traição. Disse, ainda, que o pai chegou a falar há algum tempo que mataria a mulher e, em seguida, tiraria a própria vida. A avó da garota disse que o casal estava separado havia aproximadamente três meses e que Anderson não aceitava o fim do relacionamento.

As agressões de Anderson contra Michele já ocorriam havia pelo menos quatro anos. De acordo com a Polícia Civil, o primeiro boletim de ocorrência foi registrado pela vítima em 2014, por ameaça.

A PM informou, ainda, que em setembro outra denúncia de ameaça por parte do ex foi feita.

O assassinato aconteceu na noite de terça-feira em uma casa no distrito de Córrego Carvalho, na zona rural de Lajinha. De acordo com a PM, a filha do casal, que presenciou o crime, contou detalhes. Em conversa com os militares, informou que o pai estava escondido na casa e armado com uma faca quando chegaram a mãe, ela e o irmão mais novo.

Segundo a menina, Michelle tentou fugir abrindo a porta da casa, mas acabou alcançada. A mulher, então, correu para a cozinha, enquanto era esfaqueada pelo ex-marido. A menina conta que a mãe tentou pular uma janela da cozinha, mas foi puxada pela roupa e atacada novamente.

No boletim de ocorrência consta, ainda, que a garota chegou a implorar ao pai para parar as agressões, mas que acabou empurrada. A garota fugiu por uma janela, deixando o irmão mais novo. Ela seguiu até a casa da avó, onde contou os detalhes do crime.

 

o que diz a lei

A Lei 13.104/2015, conhecida como Lei do Feminicídio, foi sancionada em 9 de março de 2015, abordando a morte violenta de mulheres por razões de gênero. O termo se refere a assassinato que tem a mulher como vítima e como motivação o menosprezo ou discriminação ao gênero ou razões de violência doméstica. O texto altera o Código Penal, incluindo esse tipo de homicídio no rol dos crimes hediondos, o que sugere tratamento mais severo perante a Justiça. A pena pode ser aumentada em um terço até a metade, em caso de o crime ter sido praticado durante a gestação ou nos três meses posteriores ao parto, contra menor de 14 anos ou maior de 60 anos ou com deficiência e se ocorrer na presença de parente da vítima.

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