Jornal Estado de Minas

Principais propostas de intervenção no Anel Rodoviário não avançaram



O trecho é conhecido, os riscos também, mas a descida do Anel Rodoviário no Bairro Betânia voltou a fazer vítimas ontem, com efeitos colaterais sobre o tráfego de toda a Região Centro-Sul de Belo Horizonte. Com o agravante de que um acidente ocorrido ainda na noite de domingo, com uma pessoa morta e outra ferida, contribuiu para um segundo em intervalo de menos de 12 horas: um engavetamento que deixou dois feridos e envolveu nove veículos. A sucessão de batidas expõe uma realidade que não é nova, nem para motoristas e passageiros, tampouco para autoridades municipais, estaduais e federais: as armadilhas de uma via de traçado superado, envolvida em debates que não avançam sobre reforma, municipalização e restrição ao tráfego pesado.

O problema é recorrente: de acordo com os últimos dados fornecidos pela Polícia Militar Rodoviária (PMRv), do início do ano até o último domingo foram nada menos que 725 acidentes na via, entre os quais 54 engavetamentos. O último deles ocorreu na manhã de ontem, depois que um caminhão-tanque bateu em oito veículos no km 540, na altura do Bairro Olhos D’Água, Região Oeste de BH. Outra batida, ocorrida à noite, no km 541, teria contribuído para o desastre, que afetou o trânsito, causando várias horas de lentidão.

“Por volta de 9h, o trânsito estava lento devido ao horário de pico e à ocorrência da madrugada, pois a carga do veículo ainda estava sendo retirada da pista. O tráfego fluía em apenas em duas faixas, quando surgiu um caminhão carregando óleo mineral, que não conseguiu parar a tempo e acabou se chocando com outros oito automóveis – uma viatura do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e sete veículos de passeio”, explicou o tenente Geraldo Donizete, da PMRv. Por volta das 9h30, o congestionamento no sentido Vitória-Brasília chegava a cinco quilômetros. Apesar dos estragos, não houve mortes.
Duas vítimas foram socorridas, ambas com ferimentos leves.

O primeiro acidente envolveu um caminhão que transportava vergalhões de metal. “O motorista não conseguiu mudar de marcha, bateu em uma mureta de proteção e em um carro. Com o impacto da batida, o passageiro da carreta morreu e a carga se espalhou na pista”, disse o tenente Donizete. Havia um radar no ponto do acidente, que foi destruído em outra batida, ocorrida em maio.

SUSTO E REVOLTA O economista Tiago Pinheiro, de 39 anos, que teve o carro mais destruído, escapou ileso. Ele seguia para o trabalho quando foi surpreendido pelo impacto. “Foi aquele acidente clássico do Anel, a que a gente está acostumado.
A batida de mais cedo parou o trânsito todo. Eu estava na pista do meio, parado por causa do congestionamento. Não deu nem um minuto quando senti a pancada na traseira do carro. O caminhão me arrastou por muitos metros”, relatou. Ele acrescentou que normalmente não passa pelo Anel, justamente por considerar uma rodovia muito perigosa. “Ontem, estava voltando de um sítio, deixei minha esposa em casa e resolvi pegar a via para evitar o trânsito e chegar ao trabalho. Mas não pretendo voltar a fazer este trajeto”, completou.

Washington Luis do Carmo, de 44, também teve o carro atingido pelo engavetamento. Após o susto, a revolta: “Vemos isso todo dia na TV.
Mas quando acontece com a gente é que vemos o quanto é perigoso. Fico revoltado, pois pagamos nossos impostos e não vemos retorno. Eu estava com o carro cheio, tinha cinco pessoas, poderia ter sido uma tragédia”, alertou.

IMPRUDÊNCIA O tenente Donizete explicou que não foi possível constatar as causas do acidente. “Mas todo condutor tem a obrigação, de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro, de dirigir com atenção indispensável à segurança do trânsito”, disse. Ainda, segundo ele, os motoristas que transitam pelo Anel precisam ter mais prudência e paciência, sabendo que estão em uma rodovia de fluxo intenso, onde pode haver retenções ou paradas repentinas.

O Anel tem 26 quilômetros de extensão e liga quatro rodovias que passam pela Região Metropolitana de Belo Horizonte. A maior parte da estrada fica a cargo do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e o restante, entre os bairros Califórnia (Região Noroeste) e Olhos D’água (Oeste) é administrado pela concessionária Via 040. A empresa atua na prestação de serviço de socorro médico e mecânico, manutenção contínua da sinalização e do asfalto, serviços de conservação e gestão do tráfego nos 10 quilômetros sob concessão – que incluem o trecho crítico, onde ocorreram os últimos desastres.

 

 

Como ficou?


Principais propostas de intervenção no Anel Rodoviário não avançaram. Confira a situação de cada uma

» A municipalização
A Prefeitura de BH propôs ação judicial cobrando a municipalização da rodovia, em setembro do ano passado, após um grave acidente que matou três pessoas no Bairro Betânia, na Região Oeste. Em abril deste ano, o pedido foi negado pela Justiça Federal. O município interpôs recurso e, ontem, informou que ainda aguarda julgamento.

» A restrição para caminhões
Em janeiro, a Prefeitura de BH informou que a restrição para veículos pesados deveria começar até março no Anel Rodoviário.
Na ocasião, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), em nota, sustentou que não havia decisão a respeito. O Ministério dos Transportes, Portos e Aviação, ao qual o Dnit está subordinado, informou em comunicado que haveria, sim, limitação na rodovia, mas no trecho sob concessão da Via-040, e que o percurso restante operaria normalmente. O Estado de Minas questionou a ANTT sobre as propostas de municipalização e de retirada de caminhões do Anel. “Existe um grupo de trabalho tratando do assunto, mas ainda não há previsão de quando ocorrerá a restrição, visto que demanda uma análise profunda  envolvendo vários setores da sociedade e órgãos de governo”, informou, em nota.

» A revitalização
Em junho deste ano, começou novo capítulo para o início da reforma da rodovia. Um acordo negociado entre o Ministério Público Federal (MPF) e a Ferrovia Centro-Atlântica (FCA) surge como esperança de acabar com gargalos e reduzir os graves acidentes que acontecem na rodovia. Dívida da empresa com a União pode ser revertida em recursos para as obras. O valor do repasse seria de R$ 600 milhões. Com o montante, seriam feitas intervenções no trecho entre o Bairro Betânia e a Avenida Amazonas. Ontem, o Estado de Minas entrou em contato com o MPF sobre o tema. Em nota, o órgão informou apenas que as negociações continuam.
Também questionado, o Dnit informou que lançará edital para contratação dos projetos executivos para obras no trecho sob sua responsabilidade, compreendido entre o acesso ao Bairro Califórnia
(BR-040) e o fim do Anel Rodoviário, na saída para Sabará. Mas não deu mais detalhes ou qualquer previsão de prazo.

 

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