Jornal Estado de Minas

Proposta de reajuste do metrô afeta população de menor renda

- Foto: "Vou ter que analisar se vale a pena mudar para o ônibus ou alguma possibilidade que não aumente tanto o gasto para trabalhar. Foi um reajuste muito alto e para dar conta de pagar vou ter de pedir para aumentar meu salário.”A reação da empregada doméstica Gilda Aparecida de Almeida, de 55 anos, ao saber que pagaria mais 88,9% na tarifa do metrô de Belo Horizonte, que havia saltado de R$ 1,80 para R$ 3,40, representa a preocupação de quem usa o transporte e está inserido na faixa da população considerada de baixa renda. Como muitos passageiros trabalham como autônomos e não recebem de empregadores o valor que gastam com o transporte, o receio é de que, se confirmados, os novos custos estrangulem as contas pessoais e aumentem a dificuldade que as pessoas já enfrentam.

Dados da pesquisa Origem e Destino de 2012, principal ferramenta para medir a mobilidade urbana na Grande BH, compilados pelo economista André Veloso, integrante do movimento Tarifa Zero, indicam que 74% das pessoas que usam o metrô recebem até dois salários-mínimos, o que indica que a principal afetada pelo possível reajuste, que seria o maior da história do transporte coletivo de BH, seria a população mais pobre.

Mas o gasto pode pesar também nos bolsos de empregadores. Gilda Aparecida mora em General Carneiro, em Sabará, na Grande BH, e vai todos os dias para o Bairro Calafate, Oeste da capital mineira. Ela recebe um salário-mínimo e diz que, se tiver de pagar R$ 3,40 no metrô, precisará achar uma solução com o patrão. “Paguei R$ 3,40 hoje (ontem) com dor no coração. O que me incomoda mais é que o metrô não tem qualidade para valer esse preço de passagem. Espero ter um aumento para conseguir pagar esse valor”, diz Gilda, que gastava R$ 13,10 por dia e, com os novos valores, passaria a desembolsar R$ 16,30, um impacto de cerca de R$ 70 por mês.

A cuidadora de idosos Marineide Silva Lopes, de 47, que trabalha como autônoma fazendo plantões em locais que a contratam frequentemente, conta que arca com 100% do valor gasto com transporte.

Moradora do Bairro Calafate, Oeste de BH, ela usa o metrô com frequência e já admite cortar alguma despesa para dar conta do aumento de 88,9% na passagem, caso ele se confirme. “Eu me mudei de Betim para o Calafate justamente para gastar menos, com a opção de ficar perto do metrô. O jeito vai ser diminuir algum gasto para compensar”, diz ela, que ganha pouco mais do que dois salários-mínimos, em média, por mês.

O economista André Veloso, que integra o movimento Tarifa Zero, fez um levantamento com base no banco de dados da Pesquisa Origem e Destino de 2012, conduzida pela Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de BH, e obteve números que mostram que 74% das pessoas que usam o metrô recebem até R$ 1.908, valor de dois salários-mínimos (veja quadro). A pesquisa é feita de 10 em 10 anos e é o principal retrato da mobilidade na região metropolitana.

Para chegar aos números, André agrupou todas as respostas à pesquisa que apontaram deslocamentos pelo modo “metrô/trem metropolitano” e, em seguida, o dado foi agregado pelas faixas de rendas estabelecidas e pelo somatório do campo “fator de expansão”. Esse campo dá a dimensão de representatividade no conjunto pesquisado para cada uma das respostas da pesquisa, feita por amostra. Além disso, as faixas de renda da pesquisa de 2012 foram agrupadas para possibilitar a comparação com o levantamento de 2002. Naquele ano, o percentual de pessoas que ganhavam até dois salários-mínimos e usavam no metrô era de 41,19%.

Para o economista, isso mostra que é importante investir em políticas de subsídio ao transporte público, com um modelo de financiamento que não seja composto apenas pela tarifa paga pelos que usam o serviço.
Apesar de não ter feito o mesmo levantamento, o coordenador técnico da Pesquisa Origem e Destino de 2012, Paulo Rogério Monteiro, informou que os dados compilados por André são reforçados pelas características do metrô. “Por não ser um transporte fácil, o metrô se torna diferencial para quem de fato precisa pagar uma passagem mais barata, que são as pessoas de renda mais baixa”, afirma. (Com Sílvia Pires e Simon Nascimento, estagiários sob supervisão do editor Roney Garcia).