Jornal Estado de Minas

Estrutura em Congonhas é a quarta da CSN a ter estabilidade questionada

- Foto: Edésio Ferreira/EM/DA Press

 

Congonhas – Como se não bastasse que três barragens do grupo Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) tragam preocupação para o poder público, moradores vizinhos aos empreendimentos e ambientalistas, uma quarta estrutura ameaça contaminar o meio ambiente e a água consumida por comunidades em Congonhas, na Região Central do estado. Trata-se do Dique do Engenho, que contém rejeitos de minério de ferro e pertence à Minerais Nacional, integrante do grupo CSN. A falta de garantia sobre a solidez dessa construção gerou um processo movido pelo governo de Minas Gerais, que se encontra em segunda instância, para que obras que garantam sua estabilidade sejam realizadas, bem como um plano para situações de emergência. O empreendimento fica na Bacia do Ribeirão Santo Antônio, um dos formadores de uma queda d’água turística de mesmo nome e que é a principal atração do Parque Natural Municipal Cachoeira de Santo Antônio, e que também abastece populações curso abaixo.

De acordo com o Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema), a Barragem do Engenho não teve estabilidade garantida pelos auditores, conforme relatório concluído em agosto de 2017. A empresa, no entanto, informou à Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam), por meio do Banco de Declarações Ambientais (BDA), do ano passado, que a barragem tinha estabilidade. “Uma fiscalização foi realizada pela equipe técnica da Feam em 5 de março de 2018. Nessa vistoria, a irregularidade foi constatada por meio da conferência de dados do relatório de auditoria.
Um auto de infração foi lavrado em decorrência desse fato. A CSN foi autuada pela Feam por prestar informações falsas ao estado”, informou o Sisema, por meio de nota.

Nos últimos meses, a CSN tem enfrentado questionamentos públicos e na Justiça sobre a segurança de seus empreendimentos. Em 20 de março, como noticiou o Estado de Minas, a Minerais Nacional teve duas barragens interditadas judicialmente a pedido do Ministério Público da comarca de Nova Lima, justamente por apresentarem “risco iminente de rompimento”, de acordo com a avaliação dos promotores de Justiça embasada em laudos técnicos do MP. Caso as barragens B2 e B2 Auxiliar, no complexo minerário de Fernandinho, em Rio Acima, se rompam, podem despejar quase 9 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro em um afluente que deságua no Rio das Velhas, pondo em risco inclusive a captação da água que abastece quase 80% da capital mineira e 48% da Grande BH. Caso não cumpra as condicionantes de estabilidade e de treinamento de segurança, a empresa está sujeita a multa diária de R$ 30 mil, podendo atingir R$ 1 milhão.

Já a Barragem de Casa de Pedra, da CSN, esta também no município de Congonhas, tem sido alvo desde o fim do ano passado de questionamentos do MP da comarca sobre a estabilidade e segurança da estrutura.
Um acordo foi firmado com a companhia, que apresentou laudos de suas intervenções e prometeu instaurar um plano de emergência para a evacuação de 4.800 pessoas que vivem nos bairros abaixo do barramento, ameaçados por quase 10 milhões de metros cúbicos de lama e rejeitos de minério de ferro, logo após a crista de 84 metros do reservatório.

Contudo, mesmo esses laudos tendo sido apresentados dentro do prazo estipulado, o MP afirma ainda não ter tido como confirmar sua veracidade, tamanho o volume de documentos para verificar. O plano de emergência, que precisa contar com o treinamento da comunidade da chamada Zona de Autossalvamento (ZAS) – onde todos deveriam ser instruídos com procedimentos de segurança para escapar de um eventual rompimento – só teve uma etapa, há mais de quatro meses, que consistiu no acionamento de duas sirenes. Como mostrou em sua edição de ontem o Estado de Minas, uma delas não funcionou a contento. Uma reunião de trabalho com a empresa, integrantes da prefeitura, Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Cedec) e Corpo de Bombeiros foi cancelada há mais de um mês. Nesse encontro, que ainda não foi reagendado, seria marcado o próximo exercício, que também não tem data prevista para ocorrer. 

Abastecimento e atração ameaçados

Já a barragem Dique do Engenho, cuja falta de garantias estruturais agora vem a público, fica ao largo de uma via aberta e sem controle de tráfego, acessível pela MG-422 (estrada de Belo Vale). O reservatório aflora como uma clareira de 22.800 metros quadrados no meio de uma floresta fechada de mata atlântica e, a princípio, devido a esse isolamento, não parece ameaçar nenhuma pessoa. Contudo, alguns quilômetros abaixo, o córrego de sua bacia hidrográfica se torna a Cachoeira de Santo Antônio, em um balneário municipal que é apreciado por milhares de pessoas da região.

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Turistas pagam R$ 8 de ingresso individual para visitar e se banhar naquelas águas, mas ultimamente têm encarado um poço de areias escuras, tingidas pelo minério de ferro que pode vir justamente dos empreendimentos minerários que ficam nas cabeceiras do curso d’água. O volume de minério é tanto que forma bancos e tinge o cascalho de cinza.

“A gente fica muito preocupada, porque imagine se uma beleza natural dessas acabar, igual lá em Mariana? Debaixo de minério de ferro, sem ter como ninguém usar... Os governos tinham de cuidar da natureza, porque ela também dá lucro. A gente não paga para entrar aqui?”, reflete a dona de casa Rosa Aparecida do Carmo, de 43 anos, que foi com a família de Conselheiro Lafaiete para conhecer as belezas da Cachoeira de Santo Antônio, mas se decepcionou com o que viu.

Muitas dúvidas e poucas respostas

 

Mesmo após ter quatro barramentos considerados perigosos ou sob risco iminente, a CSN prefere não comentar a situação em seu conjunto, atendo-se pontualmente a questionamentos sobre cada estrutura. O Estado de Minas perguntou se essa sucessão de ameaças e de instabilidades questionadas pela Justiça, pelo Ministério Público, pelo governo mineiro e por ambientalistas é também alvo de apuração interna. Porém, não houve resposta.

A mineradora se limitou a afirmar que, no caso do Dique do Engenho, a estrutura “possui estabilidade atestada por auditores externos”, o que já constaria no Sistema de Controle de Barragens do Departamento Nacional de Produção Mineral. “Trata-se de uma estrutura de pequeno porte, que não contém água e não oferece riscos. É usada para reter sedimentos e evitar que sejam carreados”, informou a CSN.



Sobre a possibilidade de a barragem ameaçar o Parque da Cachoeira ou afetar o abastecimento de comunidades de Congonhas, a prefeitura do município informou, por meio de seu secretário de Meio Ambiente, Neylor Aarão, que foram solicitadas à mineradora informações “acerca da estabilidade ou não da estrutura da barragem”. “Documentos nos foram remetidos informando sobre a condição atual de segurança e estabilidade. A documentação encontra-se ainda em avaliação, mas a princípio os estudos afastam risco de qualquer evento negativo”, disse.

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