Jornal Estado de Minas

Fundadora do Grupo Galpão se encontra com artistas que fizeram grafite dela em BH

Sentada à mesa de plástico no Bar do Edmundo, a atriz Teuda Bara, de 76 anos, se diverte com um copo de cerveja e com quem passa e reconhece nela o rosto estampado na parede do outro lado da Rua Guaicurus. “Cê gostou?”, pergunta a um transeunte, que exclama rápido, com as duas mãos em sinal de joinha: “Mil grau!”. A convite do Estado de Minas, a lendária fundadora do Grupo Galpão foi conhecer o grafite que a homenageia no Centro de Belo Horizonte. Como parte da comemoração dos 120 anos da capital, o mural, obra e arte do coletivo As minas de Minas, ficou pronto esta semana.

A famosa risada de Teuda, quase um patrimônio imaterial de BH, agora ocupa 11 metros de largura por oito de altura. De volta à rua, onde o trabalho do Galpão nasceu e cresceu, desta vez a gargalhada se cristalizou, mas continua contagiando, só que agora de forma bidimensional. Nika, de 30 anos, e Krol, de 28, duas das artistas, sentaram-se para a cervejinha com Teuda, num encontro onde as tais risadas se multiplicaram. Eram 15h de uma quarta-feira útil e antes que o leitor venha com qualquer julgamento moral, registre-se que Krol bebeu apenas água. De repente, as três se tornaram melhores amigas de infância.

Como o boteco do Edmundo fica ao lado de uma Igreja Pentecostal, o volume das risadas confrontava os cantos de louvor e os gritos de demônios exorcizados em série.
Quem passava e via a cena não diria que, 10 minutos antes, Teuda tinha mandado um: “Eu sei nada docês, gente!”. As minas se apresentaram. Conheceram-se em 2012, em evento de grafite e integram coletivo que colore a cidade, junto a outras duas colegas; Viber, de 31, e Musa, de 30. “Nossa! Que coisa mais linda!”, exclamara a atriz ao descer do carro e ver o mural pela primeira vez. "Veio o convite da Fundação Municipal de Cultura para fazer um painel para os 120 anos de BH. Já temos um projeto para retratar mulheres poderosas, chamado ‘Nós podemos tudo’. E queríamos alguém que representasse bem a cidade e tivesse essa história forte como mulher, na luta contra padrões”, conta Krol.
Misto de lisonja e humildade salta da resposta de Teuda: “Na verdade eu nem me sinto tão poderosa assim, porque a luta é um negócio diário. Cê levanta pensando na conta que tem que pagar. É o carinho, reconhecimento, amor das pessoas. Foi batalha? Foi. Mas a minha história não é diferente da sua, da outra”.

A fundadora do Grupo Galpão se surpreendeu diante do grafite; 'Nossa! Que coisa mais linda!' - Foto: Fred Bottrel/EM/DA Press

Ao saber que o processo levou três dias, Teuda disparou: “Que isso? Três dias eu não pintava nem aquelas manchas ali do vestido!”. Colocar uma risada no meio do caminho de quem passa foi também o objetivo das minas. “A Guaicurus tem uma história importante para a cidade,é legal a gente poder transformar o lugar, por isso que o Centro é um lugar bom para essas intervenções, porque todo mundo passa sempre correndo”, pontua Nica. Ela revela, durante o papo, feliz coincidência: a imagem que serviu de base para o layout das Minas é de autoria do fotógrafo Beto Novaes, do Estado de Minas, para a matéria sobre o lançamento do livro Comunista demais para ser chacrete, biografia da atriz, escrita por João Santos: “A gente queria referência que destacasse a risada.
E vou te falar, quando começou a aparecer o rosto na pintura, toda hora alguém passava e falava ‘É aquela, do teatro!’”

Sobre a marca registrada, Teuda guarda sempre um novo caso: “Eu sou mais aborrecida hoje em dia, mas sou feliz. Outro dia dormi na casa de uns amigos, aí de manhã o gato pulou em cima de mim, morri de rir e eles: ‘Tem que levantar nesse bom humor?’ Eu vou ser infeliz para quê? Quando eu tô p. com uma coisa que aconteceu, ferrada mesmo, sabe o que eu faço? Vou para um restaurante ma-ra-vi-lho-so, como uma comida ma-ra-vi-lho-sa, tomo um vinho ma-ra-vi-lho-so, dou risada, fico feliz, acabou aquela encheção de saco!”.
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