Jornal Estado de Minas

Pesquisa diz que girinos do Rio Doce concentram alto níveis de metais


Estudo divulgado pela ONG Greenpeace nesta quarta-feira aponta que girinos coletados na Bacia do Rio Doce estão bioacumulando metais pesados. Para os pesquisadores, esses metais são provenientes da lama de rejeitos de minério da Barragem do Fundão, da mineradora Samarco, em Mariana, Região Central de Minas, que se rompeu em novembro de 2015. De acordo com a pesquisa, a contaminação pode afetar potencialmente a cadeia alimentar da região.

Os levantamentos foram feitos por pesquisadores da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), na Bahia. As coletas foram realizadas em diversos pontos da Bacia do Rio Doce, no segundo semestre de 2016. As conclusões do estudo “Girinos como bioindicadores da qualidade da água do Rio Doce” foram publicadas hoje.

Os anfíbios anuros, como sapos e rãs, têm duas fases distintas de vida: uma aquática (como girinos) e uma terrestre (quando adultos). Em função de suas peles permeáveis e extremamente sensíveis, foram escolhidos para as análises, pois funcionam como bioindicadores da qualidade ambiental do local em que vivem.

Com peneiras de 20cm e 50cm, os pesquisadores coletaram 1.500 girinos de 24 espécies em 14 pontos amostrais de seis municípios no Espírito Santo e 12 pontos em Aimorés e Mariana, em Minas Gerais, entre setembro e dezembro do ano passado.

Eles constataram que os girinos estão absorvendo e concentrando em seus organismos altos níveis de metais pesados como ferro, bário, cádmio, manganês, zinco, níquel, cromo, alumínio, cobre e titânio. E, quanto maior a concentração de metais na água, maior a quantidade de metal bioconcentrado nos tecidos dos girinos, que será mantido na vida adulta.

Devido a esse alto potencial acumulador, os pesquisadores alertam que a tendência é essa contaminação alcançar outros animais na cadeia alimentar.
“Os resultados sugerem o comprometimento de uma parcela significativa da comunidade faunística silvestre da região”, afirma o relatório.

Segundo a coordenadora da pesquisa, a doutora em zoologia e professora de biologia da UEFS Flora Acuña Juncá, não há dúvidas de que o ferro absorvido pelos girinos seja produto do desastre, ainda que o mineral seja abundante na região.

“O ferro compõe as rochas e para ficar disponível no meio ambiente é necessário o processamento desse minério. A liberação de concentrações nessa magnitude só é possível em caso de contaminação pontual, proveniente de descarte do resíduo sem nenhum tratamento. Mesmo com o histórico de mineração na área e possíveis contaminações em menor escala no passado, o ferro não permaneceria disponível para contaminar os girinos da maneira registrada por nós”, afirma Flora.


Dados do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) classificam na região 28 espécies de anuros de sete famílias. O número de espécies coletadas em cada ponto de amostra variou de um a sete. O que se observou foi que aqueles pontos contaminados pela lama tiveram uma diversidade menor de espécies.

“Todas as poças sem contato direto com o rejeito apresentaram girinos de Elachistocleis cesarii, indicando que o período de coleta foi mais ou menos coincidente com período reprodutivo da espécie. Nenhuma poça que teve contato direto com o rejeito, entretanto, mostrou a presença de girinos desta espécie”, relatam os pesquisadores.

Fabiana Alves, da campanha de Água do Greenpeace, destaca a importância da pesquisa para detectar a dimensão dos danos decorrentes daquele que é o maior desastre ambiental do país.“A pesquisa evidencia a extensão e a complexidade dos impactos do desastre, que afetam todo um ecossistema e aqueles que dependem dele. Esperamos que estudos como este aprofundem as discussões e auxiliem a aplicação de políticas públicas a favor da recuperação das áreas degradadas e da reparação aos atingidos”, assinalou.

Fundação diz que água da bacia retornou a níveis semelhantes aos de antes do desastre

Por meio de nota, a Fundação Renova, instituição autônoma e independente criada para executar as ações de recuperação relacionadas ao rompimento da Barragem do Fundão, disse que “considera fundamentais as pesquisas que ajudem a mapear os impactos dos rejeitos e auxiliem na definição das medidas de reparação em andamento.”

E informou que realiza monitoramento sistemático em vários pontos ao longo do Rio Doce, incluindo coleta de dados em tempo real com estações automáticas, que envolvem análises da água e dos sedimentos.
“Um dos resultados já aponta que a água retornou a níveis semelhantes aos existentes antes do rompimento da barragem”, afirmou.

 

Acrescentou que, para avaliar os impactos, um monitoramento específico de biodiversidade aquática foi iniciado em abril no Rio Doce, em cerca de 40 pontos. “No caso específico dos anfíbios, serão feitas análises tanto das larvas quanto dos animais adultos. Com isso, será possível a avaliação de toxicidade tanto da fase aquática quanto na terrestre. No mesmo monitoramento, será feita a avaliação dos pescados. Os resultados devem indicar se estão ou não aptos para o consumo.”

RB

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