Moradores de BH são os que mais contribuem para a poluição do Rio das Velhas

Expedição concluída neste sábado aponta que o contaminado Ribeirão Arrudas deixa as águas do manancial com qualidade ainda pior

Mateus Parreiras - Enviado especial
O lixo se acumula em trecho próximo à foz do Arrudas - Foto: Túlio Santos/EM/D.A Press
Sabará e Santa Luzia – Vem de Belo Horizonte a pior e mais vergonhosa contribuição para o Rio das Velhas. Na forma de uma água escura, contaminada principalmente por esgotos e lixo, o Ribeirão Arrudas, que corta a capital mineira de Oeste a Leste, foi considerado pelas medições do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) como o mais poluído tributário do Alto Rio das Velhas, um obstáculo químico e biológico que foi vencido a duras remadas pela dupla de navegadores de caiaques que fechou ontem a travessia da nascente, em Ouro Preto, até Santa Luzia, pela expedição “Rio das Velhas, Te Quero Vivo”.

A iniciativa busca a revitalização desse manancial, que é a principal fonte de abastecimento da Grande BH e o segundo mais volumoso afluente do Rio São Francisco. Hoje, ambientalistas e autoridades se reúnem para sagrar o compromisso pela revitalização, numa manifestação que fecha a Semana Nacional do Meio Ambiente, na Praça da Liberdade, e que vai terminar com uma caminhada até o Parque Municipal.

A reportagem do Estado de Minas seguiu os aventureiros desde o dia 29, nesta travessia de 107 quilômetros entre os municípios de Belo Horizonte, Itabirito, Nova Lima, Ouro Preto, Raposos, Rio Acima, Sabará e Santa Luzia. A iniciativa é promovida pelo Comitê Hidrográfico do Rio das Velhas (CBH-Rio das Velhas) e pelo Projeto Manuelzão, de revitalização do Rio das Velhas, numa parceria com as prefeituras dos municípios percorridos e apoio da Copasa.

Um dos momentos mais tensos da expedição ocorreu ontem, justamente na saída de Sabará, onde mais esgotos se concentram no Rio das Velhas. Um dos remadores, o voluntário Erick Sangiorgi, acabou virando o caiaque nas águas pútridas e perdendo o remo, precisando de auxílio da equipe de terra. “Foi um dos piores momentos, até pela qualidade das águas poder ser prejudicial à saúde. Mas ele se recuperou, se lavou e recebeu um remo novo. O problema ali é a baixa profundidade.
O caiaque se enroscou num ponto com galhos e virou”, conta Rodrigo De Angelis, que é um dos canoístas da expedição e também diretor de comunicação do CBH – Rio das Velhas.

Depois do susto, Erick conta que teve sorte por não ter ocorrido a queda num dos piores trechos, assim que o Arrudas encontra o Velhas. “Entrou muita água no caiaque, mas não era ainda aquela pior poluição do Arrudas, então deu para me limpar e continuar sem problemas. Se fosse mais adiante seria pior, porque o rio daquele ponto pra frente parece que não tem água, só esgoto”, considera.

Expedicionários se preparam para entrar na água em Sabará - Foto: Túlio Santos/EM/D.A PressDe acordo com a avaliação do Igam no Resumo Executivo da Qualidade das Águas Superficiais de Minas Gerais de 2016, lançado em março, próximo de sua foz, no Rio das Velhas, o Ribeirão Arrudas apresenta um Índice de Qualidade das Águas (IQA) de conceito “muito ruim”, o que pode “ser associado, além dos lançamentos de esgotos domésticos de Belo Horizonte e Sabará, também aos efluentes de indústrias metalúrgicas, siderúrgicas, químicas e têxtil”.

O monitoramento do Igam identificou na foz do Arrudas e também nos ribeirões do Onça e Isidoro os efeitos crônicos e agudos da eutrofização, que é o processo de superpopulação das águas por micro-organismos, o que leva a uma queda acentuada da disponibilidade de oxigênio nas águas, inibindo a proliferação dos peixes e da vida aquática. Mais uma vez, o resumo aponta esse desequilíbrio como resultado “dos lançamentos de esgotos domésticos e efluentes industriais dos diversificados polos industriais presentes nos municípios de Belo Horizonte, Sabará, Contagem, Baldim e Santa Luzia”.

Assoreamento
As paisagens naturais do Velhas vão recebendo os mais diversos elementos urbanos justamente no trecho entre Sabará e Santa Luzia, onde há canalizações, manilhas despejando esgotos e encanamentos em que escorrem efluentes domésticos e industriais. O lixo das casas de bairros próximos também se acumula nas margens, indo invariavelmente parar no leito do Velhas com as chuvas ou quando cede o empilhamento das sacolas plásticas de resíduos. Ainda que a qualidade da água seja péssima e o risco de contração de doenças bacteriológicas e virais grande, neste segmento fluvial ainda ocorre extração de areia, que acaba sendo vendida a depósitos de construção em toda a Grande BH.

Um dos piores trechos de assoreamento também se encontra em Sabará, onde três pontos do Bairro Borges despejaram entulho de construção civil e lixo nas margens, de forma tal que o material desabou e engoliu mais da metade da largura original do Rio das Velhas. Um deles era um aterro que parou de funcionar em 2015, e outros dois são deposições clandestinas, que foram alvo de denúncia do EM, em 21 de maio, resultando em multas da Polícia Militar do Meio Ambiente.

Enquanto os navegadores enfrentam as águas perigosas, voluntários, ambientalistas e lideranças do CBH-Rio das Velhas e do Projeto Manuelzão realizam exposições com fotografias de vários trechos do rio, exibem amostras da vida aquática, sedimentos e poluentes, chamando a atenção da população ribeirinha, sobretudo dos estudantes, para a importância da preservação do manancial. Alunos chegaram a ter aula sobre a importância do rio bem debaixo da ponte sobre a BR-381, em Capitão Eduardo, bairro de Belo Horizonte que faz limite com o município de Sabará..