Tragédia em Mariana

MP investiga se Samarco desprezou alerta de instabilidade na Barragem do Fundão

Leitura de alguns piezômetros, que medem condições de consistência da lama, apontavam para situação de emergência nos últimos dois anos. Suspeita de omissão da mineradora é apurada por promotores de meio ambiente

Fernanda Machado
O promotor de Justiça Carlos Eduardo Ferreira Pinto, coordenador das Promotorias de Meio Ambiente e do Núcleo de Resolução de Conflitos Ambientais do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), afirmou que a Samarco foi omissa em relação a indicadores de instabilidade da Barragem do Fundão, que se rompeu em 5 de novembro do ano passado em Mariana, na Região Central de Minas.
De acordo com laudos que estão sendo investigados pelo MP e que foram divulgados em reportagem do programa Fantástico, neste domingo, a mineradora já tinha registros de que algo estava errado com a barragem há pelo menos dois anos, por meio de medições feitas por aparelhos chamados piezômetros.

Para o engenheiro Joaquim Pimenta Ávila, responsável pelo projeto original da Barragem do Fundão, uma das hipóteses é que o rompimento tenha ocorrido por causa da liquefação da lama que estava represada. O piezômetro mede justamente a pressão dos fluidos dentro do maciço da barragem, e pode identificar essa liquefação. Segundo laudos da empresa VogBR, especialista em engenharia geotécnica e recursos hídricos, nos últimos dois anos alguns dos aparelhos instalados ao longo da represa já emitiam alertas de emergência. Além disso, o relatório da empresa de engenharia não apresentou dados de todos os piezômetros localizados em pontos críticos da barragem.

"Isso é um sintoma de que algo não vai bem na estrutura da barragem, o que deveria gerar uma obrigação da Samarco no incremento do sistema de monitoramento", disse o promotor. " Houve um desprezo em relação à leitura desses piezômetros localizados no eixo da barragem.
Uma omissão extremamente grave, que compromete a segurança da operação e que não foi levada em conta nos relatórios de estabilidade", completou.

O engenheiro Joaquim Pimenta Ávila afirmou ainda que alertou a Samarco sobre o risco da lama ficar muito liquida um ano antes do rompimento. Ele também garantiu que seu projeto previa uma barragem reta, situação diferente da encontrada no local nos anos antes da tragédia. Em 2013 a estrutura ganhou um alteamento e passou a ter uma curva em formato de S. O ponto preocupante é que o recuo teria ficado apoiado sobre areia, material mais sujeito a liquefação. "Se isso não for drenado, para ficar bem firme, a estrutura pode ficar instável. Esse recuo, se for bem controlado, em termos de nível de água dos rejeitos de fundação, pode ser seguro. Mas é necessário que se tenha um controle efetivo, rigoroso e frequente", disse o engenheiro. Pimenta Ávila ainda afirma que o desprezo desses dados comprometeu, de maneira decisiva, a estrutura da barragem.

SAMARCO Em nota divulgada neste domingo, a Samarco afirma não ter tido acesso a laudo ou documento referente às investigações das causas do acidente com a Barragem do Fundão e diz que repudia especulações sobre o conhecimento prévio de risco de ruptura. "A Barragem do Fundão sempre foi declarada estável. Em nenhuma oportunidade, qualquer inspeção, avaliação, relatório de consultorias especializadas internas ou externas registraram ou fizeram qualquer advertência de que a operação da Barragem estivesse sujeita a qualquer risco de ruptura. Alertas contidos em relatórios de consultores jamais indicaram risco iminente de ruptura ou necessidade de interdição das operações, tendo ensejado apenas proposição de recomendações nos mesmos relatórios técnicos em que foram registradas para melhoria das condições de segurança da barragem, sempre consideradas pela empresa", diz a nota.
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