Jornal Estado de Minas

Ibama indica que 15 km² foram devastados pela lama da barragem, mas traz dados conflitantes

O desastre provocado pelo rompimento de barragem da mineradora Samarco em Mariana, classificado como a maior tragédia ambiental do país, atingiu 15 quilômetros quadrados de terras, incluindo áreas de preservação permanente, e afetou diretamente pelo menos 663 quilômetros de rios, segundo laudo preliminar do Ibama. O estudo baliza a ação civil pública  de R$ 20 bilhões que o governo federal e os estados de Minas e do Espírito Santo movem contra a empresa.


O relatório, porém, traz números discrepantes em relação a dados que vêm sendo divulgados desde o desastre de 5 de novembro. O que mais chama atenção diz respeito ao volume de rejeitos que teria sido liberado pelo acidente. Segundo o documento do Ibama, o volume de lama que vazou foi de 34 milhões de metros cúbicos, de um total de 50 milhões que estavam na barragem. Porém, a própria Samarco afirmou que vazaram 55 milhões de metros cúbicos da represa. E até esse dado é questionado por especialistas, como o professor de oceanografia da Universidade Federal do Espírito Santo Agnaldo Martins. “Como essa informação é controlada pela empresa, eu diria que nada seria muito confiável neste momento.”

O colapso da barragem deu origem a uma onda de lama que percorreu 55 quilômetros do Rio Gualaxo do Norte até atingir o Rio do Carmo, onde escorreu por mais 22 quilômetros até o Rio Doce, no qual viajou outras centenas de quilômetros até atingir o mar, 16 dias depois, no Espírito Santo. “É indiscutível que o rompimento da barragem trouxe consequências ambientais e sociais graves e onerosas, em escala regional”, diz o laudo.

O estudo não menciona os impactos sobre o ambiente marinho.
O foco da análise se concentra nos rios e seus ecossistemas marginais, considerados áreas de preservação permanente (APPs). Em relação aos 1.469 hectares diretamente atingidos pela lama, cerca de 15 quilômetros quadrados, o documento não estima quanto era de vegetação nativa. Ainda assim, por se tratarem de APPs, esses locais deverão ser obrigatoriamente recuperados. “Considerando o porcentual de reserva legal de 20%, há um passivo de cobertura florestal (na Bacia do Rio Doce) da ordem de 760 mil hectares”, informa o relatório.

Com relação à diversidade de peixes, os técnicos do Ibama estimam haver mais de 80 espécies nativas, das quais 11 são classificadas como ameaçadas de extinção e 12 são endêmicas do Rio Doce – ou seja, não existem em nenhum outro lugar do mundo. “Muito mais do que os organismos em si, os processos ecológicos responsáveis por produzir e sustentar a riqueza e a diversidade do Rio Doce foram afetados”, diz o laudo.

Conforme mostrou o Estado de Minas em sua edição de domingo, a catástrofe ocorreu em pleno período da piracema, quando os peixes sobem os cursos d’água para desovar. Assim, não só a vida já existente foi dizimada, mas o repovoamento do rio também foi comprometido. “O fato de estarmos na piracema não aumentou o número de peixes mortos, mas vai afetar o recrutamento das populações, já que as espécies estavam prontas para a reprodução”, afirmou o biólogo da UFMG Ricardo Motta Pinto Coelho.

“Cabe ressaltar que os impactos ambientais não se limitam aos danos diretos, devendo ser considerado que o meio ambiente é um sistema complexo, no qual diversas variáveis se inter-relacionam”, diz o relatório do Ibama.
“As medidas de reparação dos danos, tangíveis e intangíveis, quando viáveis, terão execução a médio e longo prazo, compreendendo pelo menos 10 anos”, segundo o estudo.

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