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Estado de Minas

"Temos de aprender com o desastre", defende Leonardo Quintão, relator do novo Código da Mineração

Em entrevista ao EM, deputado federal pelo PMDB fala sobre o marco regulatório da mineração


postado em 28/11/2015 12:00 / atualizado em 28/11/2015 11:41

Depois da tragédia de Mariana, o novo marco regulatório da mineração (projetos de lei 37/11, 5.807/13 e outros) ganhará impulso para sair do papel. Emperrado pela queda de braço entre mineradoras – interessadas em manter as atuais alíquotas dos royalties e os direitos de preferência das jazidas que já exploram – e ambientalistas, a matéria em tramitação desde junho de 2013 não prosperou. Mas agora o ambiente é outro, diz o relator do novo Código da Mineração, deputado federal Leonardo Quintão (PMDB-MG), que trabalha para votar no próximo dia 9 a proposta reformulada depois dos danos ambientais, ainda incalculáveis, causados pelo rompimento da Barragem do Fundão, da Samarco, controlada por Vale e BHP. As sugestões incorporadas ao substitutivo vieram de procuradores federais de Minas e parlamentares que acompanham os desdobramentos ambientais e humanos da tragédia, e começaram por retirar dois artigos combatidos por ambientalistas. Esses trechos autorizavam as atividades minerárias em unidades de conservação de uso sustentável, como florestas nacionais, além de dar poderes à futura Agência Nacional de Mineração para autorizar ou não atividades que pudessem “criar impedimento” à mineração. “Retirei esses artigos porque, neste momento de crise, temos de usar a psicologia do que nos une, não do que nos separa”.

Leonardo Quintão, do PMDB-MG, é relator do novo código da mineração(foto: Alexandra Martins/Camara dos Deputados )
Leonardo Quintão, do PMDB-MG, é relator do novo código da mineração (foto: Alexandra Martins/Camara dos Deputados )
O que a tragédia de Mariana muda no novo Código da Mineração, que estava com a tramitação emperrada na Casa e agora retornará à pauta?

Não estamos mudando por causa da tragédia. Temos de aprender com o desastre. Isso nos ajudou a tirar a resistência que alguns parlamentares tinham dentro da comissão especial. Por exemplo: fiz vários debates sobre o tratamento de barragens. Sou sempre favorável que seja tratada e que use menos água. Agora o setor da mineração, mediante a tragédia, terá de se adequar a essa pressão política. Coloquei no novo texto a obrigatoriedade de tratar a barragem. Além disso, chamei as seguradoras do Brasil para conversar sobre a modalidade de seguro geral, que cubra danos contra terceiros e dano ambiental. Todos os grandes projetos minerários no Brasil têm seguro. Só que o seguro da Samarco não irá cobrir todo o dano ambiental, pois não existe seguro para R$ 30 bilhões. Esse tipo de dano ninguém vai cobrir. Não é economicamente viável.

É fato que a atividade gera profundos impactos sociais e ambientais. O senhor acaba de estimar em R$ 30 bilhões os danos de uma tragédia como a de Mariana. Qual seria a cobrança que compense impactos ambientais?

Não sei. Espero que não tenha outra tragédia como esta. Nela, a empresa negligenciou no aviso às cidades. Não tinha plano de contigenciamento, sirenes. Se for comprovado que a barragem estava se deteriorando e nada foi feito, tem de prender todos os gestores da empresa. Agora, a população vai ter de tomar uma decisão. Se vai querer ter mineração no Brasil ou não. Se não quiser mais mineração aqui, o carro vai aumentar, tudo o que leva aço vai aumentar, a água mineral vai aumentar, pois tudo será importado. Estamos priorizando no texto as técnicas que existem no mercado que usem menos água. Isso vai ajudar na redução das barragens. E estamos obrigando o início de um processo de tratamento dessas barragens, de esvaziamento das barragens. Sempre fui a favor. Mas enfrentei resistência do setor produtivo, de adiar essa questão da barragem. Agora isso me deu autoridade política de obrigar o tratamento da barragem. Mas entendo, por outro lado, que não existem técnicas que já tenham sido usadas de reciclagem desse material. O que tem hoje são projetos científicos que terão de se tornar produtivos. Coloquei tratamento da barragem, obrigação do seguro geral, plano de contingenciamento em caso de acidente e vários outras questões.

Que outras questões foram acrescidas ao texto?


O plano de fechamento de mina tem de ser apresentado periodicamente, durante o processo de mineração, para que tenha acompanhamento do órgão gestor, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). Se a empresa retirou o minério de uma área e ela se esgotou, automaticamente tem de recompor aquela área para inserção da flora. Isso minimiza o impacto. A mineração tem impacto ambiental, sim, tanto é que existe a Compensação Financeira pela Exploração dos Recursos Minerais (Cfem).

Atualmente, a alíquota da Cfem, do minério, por exemplo, é de 2% sobre o faturamento líquido. Qual será a alíquota prevista no novo substitutivo?

Eu já convoquei a bancada do Pará, para que democraticamente vote a sugestão de Cfem. A bancada de Minas irei reunir nesta quarta, para fechar coletivamente. Não cabe decisão unilateral do relator. Essa tabela flexível segundo o preço das commodities foi discutida no Congresso. Vamos discutir quarta e decidir em conjunto, em votação democrática. Uma coisa é certa: eu já havia colocado no primeiro substitutivo que 60% da arrecadação da Cfem irá para municípios em cujo território ocorre a exploração e 10% para os municípios afetados. E agora, dentro da parcela de 10% transferida para a União, estamos prevendo destinação de 20% ao Fundo Nacional para Recuperação de Passivos Ambientais de Mineração.

O senhor concorda que a riqueza do subsolo é do povo e que explorá-la deve resultar em compensação que possibilite o desenvolvimento social, humano e econômico das áreas atingidas? A Austrália, referência citada várias vezes pelos legisladores que defendem um modelo mais liberal, cobra uma alíquota compensatória muito maior...

Não é do povo. É da União. A Cfem lá na Austrália é de 7%. Mas lá tem descontos de fretes, que aqui não vai ter. Mas, se as bancadas dos estados mineradores quiserem colocar 20%, eu coloco. Sou relator e vou acolher o que a maioria quiser. Vou ouvir como sempre ouvi. As mudanças não foram da minha cabeça, coloquei em votação e em debate. Os deputados do Pará me deram proposta flexível, começando com 2,5% até 4%. E eu vou ouvir os parlamentares de Minas. Faço questão de uma votação democrática dentro da bancada.

A maioria dos deputados que discutem o marco regulatório, entre eles o senhor, recebeu financiamento das mineradoras. O senhor acredita que esse apoio do setor leve os parlamentares a ter um olhar mais inclinado aos interesses da atividade?

Em primeiro lugar, esse é o Código de Mineração, que vai reger o setor mineral no Brasil. É lei que vai gerar critérios sobre como deve ser feita a mineração. Em segundo lugar, não sofri influência do setor produtivo para beneficiar nenhuma empresa. Todas as doações foram dentro do critério, tanto é que são públicas. Em terceiro lugar, não cabe a mim entrar na queda de braço entre o setor ambiental e as mineradoras. As audiências públicas foram abertas e todos participaram, com igual tempo nos debates. Se as ONGs quiserem doar pra mim, recebo também, com o maior prazer. Nem por isso irei legislar para um setor ou outro.


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