Jornal Estado de Minas

Beatificação de Padre Victor reúne cerca de 15 mil pessoas em Três Pontas


Sábado de festa religiosa e muita alegria em Três Pontas, no Sul de Minas. Depois da espera de 22 anos, milhares de pessoas – o número divulgado foi de 15 mil pessoas, apesar dos organizadores esperarem até 100 mil pessoas – participaram, numa tarde de céu parcialmente nublado, da cerimônia de beatificação do padre mineiro Francisco de Paula Victor (1827-1905), o Padre Victor, dono de uma legião de admiradores na cidade, na região e nos estados vizinhos. Realizada no aeroporto local, a pouco mais de um quilômetro do Centro, a solenidade foi presidida pelo bispo Diamantino Prata de Carvalho, com a presença de mais de 300 sacerdotes da diocese de Campanha e do secretário estadual de cultura, Angelo Oswaldo. O momento mais esperado, e de grande emoção, foi o rito de beatificação conduzido pelo prefeito da Congregação da Causa dos Santos da Santa Sé, o cardeal Angelo Amato, representante do Papa Francisco.

Um painel com a nova imagem de Padre Victor, em que ele está segurando a Bíblia e um crucifixo, foi colocado ao lado do altar e emocionou os fiéis. Assim que a celebração se iniciou pouco depois das 16h, o público pode relembrar um pouco da história do novo beato. Durante a beatificação, que durou aproximadamente duas horas e meia, a Igreja lembrou e pediu pelas vítimas dos atentados na França e da tragédia em Mariana. Segundo a organização, muitos fiéis, vindos de várias partes do país, se emocionaram e chegaram a chorar.

Na Praça da Matriz, no Centro da cidade, cerca de 7 mil pessoas assistiram à cerimônia, nos telões instalados, para ninguém perder um detalhe.
Para se tornar santo – e Padre Victor poderá se tornar o primeiro santo negro brasileiro – será necessário mais um milagre. O primeiro reconhecido pelo Vaticano foi o da professora Maria Isabel de Figueiredo, de 37 anos, moradora de Três Pontas, e que conseguiu realizar o sonho de ser mãe, depois de sucessivas tentativas para engravidar. Esse caminho culminou num aborto espontâneo, na descoberta de que uma das trompas era totalmente obstruída e numa gravidez tubária – decorrente de ovulação induzida.

Padre Victor é o terceiro beato com trabalhos pastoral e social fortes em Minas. O primeiro foi o holandês Beato Padre Eustáquio (1890-1943), numa cerimônia no estádio do Mineirão, em Belo Horizonte, em 15 de junho de 2005. Oito anos depois, o Sul de Minas também reuniu milhares de católicos para celebrar, em Baependi, a beatificação de Francisca de Paula de Jesus, a Nhá Chica (1810-1895). Igualmente postulador da causa de Nhá Chica, o italiano Paolo Villota esteve ontem em Três Pontas para acompanhar o rito.

SANTO NO CORAÇÃO
“Padre Victor já é santo no coração do povo”, afirma padre Mateus Arantes, vigário paroquial e integrante da comissão dos festejos em homenagem ao religioso nascido em Campanha e que trabalhou 53 anos em Três Pontas.
Ele tem esperança de que o beato, nascido escravo numa senzala, seja canonizado pelo Vaticano, o que necessitaria de novo milagre. “Temos registrados mais de mil relatos de graças alcançadas por intercessão de padre Victor. Para ser considerada milagre, uma graça precisa de comprovação científica, ser avaliada por uma equipe de médicos, enfim, outro processo”, disse o vigário paroquial. “Ele foi um grande evangelizador”, resumiu sobre vida e obra do beato. Ontem, a cidade recebeu devotos mineiros, principalmente da Região Sul, mas também de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Goiás, disse o vigário paroquial.

Satisfeita, Denise Barbosa Reis Abreu, integrante da Associação Padre Victor, de Três Pontas, se emocionou ao falar sobre o beato: “Essa festa é o coroamento das ações realizadas em duas décadas, com coleta de dados, depoimentos e demais informações.” A associação, vinculada à Mitra diocesana de Campanha, foi fundada há 20 anos para acompanhar o processo de beatificação e divulgar o trabalho do religioso. Na sede da entidade, há um memorial com objetos que pertenceram ao Padre Victor.

GRAVIDEZ
Na tarde de ontem, a professora Maria Isabel de Figueiredo, de 37 anos, era só emoção. Ela que teve seu milagre aprovado pelo Vaticano, estava acompanhada da filha mais velha Sofia, de 4 anos, e entregou a relíquia de Padre Victor no altar.
No mês passado, o Estado de Minas contou sua história de confiança e fé em Deus. Maria Isabel sempre quis ser mãe. O sonho se intensificou depois que ela se casou, em 2007, com o cabeleireiro José Maurício Silvério, hoje com 39 anos. Mas as várias tentativas de engravidar culminaram num aborto espontâneo, na descoberta de que uma das trompas era totalmente obstruída e numa gravidez tubária – decorrente de ovulação induzida –, que a obrigou, dois meses depois (em novembro de 2009), a retirar a trompa boa.

Cientificamente, estava inviabilizada qualquer chance de concepção natural. Maria Isabel perdeu o chão, mas saiu do hospital decidida a ser mãe. Se não conseguisse gerar um bebê, tentaria de outro jeito. Sua primeira providência foi, com o marido, entrar na fila de adoção. Nove meses depois, em agosto de 2010, o cadastro do casal foi aprovado. Mas, no mesmo dia, para sua surpresa, Maria Isabel descobriu que estava grávida.
“Foi um milagre inesperado”, resumiu a professora, que atribuiu a gravidez, impossível para a ciência, a um pedido que havia feito durante a novena de Padre Victor. A concepção foi a peça que faltava para a beatificação do pároco – autorizada pelo papa Francisco em junho deste ano e aprovada por unanimidade por cardeais um mês depois. Hoje, ela tem duas filhas, Sofia e Alice, recém-nascida.

Ao final da cerimônia, os fiéis deixaram o aeroporto de Três Pontas para se juntarem em uma procissão que seguiu pelas ruas da cidade. (Colaborou Ana Clara Brant)

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