Jornal Estado de Minas

Incêndio no maior albergue de BH deixa 200 pessoas desabrigadas

"Vi o fogo e saí correndo. Fiquei assustado", Luiz Carlos Spíndola, capixaba, de 54 anos - Foto: Paulo Henrique Lobato/EM/D. A Press Um incêndio por volta das 6h de ontem causou pânico em centenas de moradores em situação de rua que pernoitaram no Tia Branca, o maior albergue de Belo Horizonte, com 400 vagas – 366 pessoas dormiram no lugar, mas algumas já haviam saído quando as labaredas começaram. Ninguém se feriu, todavia, assustados, abrigados se refugiram no telhado e improvisaram teresas – cordas feitas com lençóis – para chegar ao solo.

A Polícia Civil investiga a origem das labaredas, que começaram no último pavimento do imóvel, na Rua Conselheiro Rocha, no Bairro Floresta, na Região Leste. O fogo ainda danificou o segundo pavimento. Móveis foram destruídos e parte da estrutura física foi consumida pelas chamadas. Os dois andares estão interditados.

Excepcionalmente, na noite de ontem, 100 pessoas foram acomodadas no primeiro andar. Outros 100 foram encaminhados para o Albergue São Paulo, no Primeiro de Maio, na Região Norte – o transporte foi garantido pelo município. Portanto, o incêndio reduziu a quantidade de leitos disponíveis em 200 vagas.

Vale lembrar que o universo da população em situação de rua (cerca de 2 mil pessoas) é maior que o de leitos disponíveis em abrigos (aproximadamente 1 mil vagas). Segundo a Secretaria Municipal Adjunta de Assistência Social (SMAAS), outros 200 leitos do Tia Branca serão remanejados hoje para outros abrigos.

A prefeitura não informou quando o segundo e o terceiro pavimentos do Tia Branca devem ser reabertos.

Ontem, no primeiro andar, o jantar foi servido a todos que bateram às portas do abrigo, como o capixaba Luiz Carlos Spíndola, de 54 anos. “Vi o fogo e saí correndo. Fiquei assustado”, recorda o homem.

Ele deixou Vitória, há uma semana, na esperança de conseguir uma vaga no mercado formal de trabalho. Pelo mesmo motivo, Edmar Iran, de 37, deixou Montes Claros, no Norte de Minas, há seis meses. “Ainda não consegui, mas não perco a esperança”. Ele estava dormindo quando o incêndio começou. Desesperado, saiu pela janela.
“Você tinha que ver o fumação”.

Homens que retornaram ao abrigo no início da noite, atrás da refeição e da esperança de conseguir uma vaga em outro abrigo, relataram cenas de desespero. Ânderson Vieira, de 43, contou que o medo foi tanto que ele derrubou uma porta para conseguir chegar à Rua Conselheiro Rocha.

Horas depois, já calmo, cobrou dos governantes brasileiros melhorias nas políticas públicas: “Meti o pé na porta. Escreve aí que, enquanto a gente trabalha e paga impostos, eles estão na mordomia, gastando errado o nosso dinheiro”. Ânderson trocou a cidade histórica de Mariana por Belo Horizonte, há duas décadas, em busca de uma vida melhor.

Seu colega Cleverson Silva, de 54, deixou a cidade vizinha Contagem e encontrou abrigo no Tia Branca, como diz, “há uma boa temporada”. Ele também estava no abrigo durante o incêndio. “Você tinha que ver. Ainda bem que a gente não se feriu”.

Mais pessoas vivem na rua

A chamada população em situação de rua em BH cresceu 57% em 10 anos, atingindo 1.827 homens e mulheres em 2013, ano-base do terceiro e último censo exclusivamente sobre o assunto. Problemas familiares (52% das respostas) são o principal motivo que levaram essas pessoas a deixarem seus lares.
Em seguida, o álcool ou drogas ilícitas (43,9%).

Mas a falta de moradia (36,5%) e o desemprego (36%) também foram relatados pelos entrevistados. A soma dos percentuais supera os 100% em razão de as pessoas responderem mais de uma opção.

Quase a metade (44,8%) passa o dia e a noite em bairros da Região Centro-Sul. Depois, aparecem as zonas Norte (15,6%), Nordeste (9,3%) e Pampulha (9,2%). As demais áreas da cidade apresentaram índice inferior a 6%.

O levantamento apurou que 43,4% dormem nos abrigos municipais. A maioria (94%) informou aos pesquisadores a vontade de encontrar um lar. Segundo o estudo, 64,2% vieram do interior de Minas Gerais. Uma estatística curiosa: 12% trabalham com carteira assinada.

Essa população é formada, predominantemente, por homens (86,8% dos entrevistados). A idade média é de 39,6 anos. Esse dado comprova o envelhecimento dos moradores em situação de rua na capital, segundo a prefeitura.

Apenas 5,9% dos entrevistados vivem na companhia de parentes. Em 1998, no primeiro censo, tal percentual era de 24,8%.
Na segunda edição, 13,6%.







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