Jornal Estado de Minas

Perueiros voltam a atuar em Belo Horizonte usando carros de passeio


À sombra da disputa entre taxistas de Belo Horizonte e parceiros do aplicativo Uber – de transporte particular em sedãs de luxo, com ar-condicionado e água mineral –, um grupo de motoristas atua fora da lei e sem ser incomodado pela fiscalização. Seja em trajetos dentro da capital ou em viagens intermunicipais, perueiros estão agindo livremente em pontos estratégicos da cidade, captando passageiros atraídos pelo preço e pela alegada economia no tempo de viagem. Mas, para evitar suspeitas, mudaram de roupagem. Diferentemente das conhecidas vans de vidros fumê, que levavam muitos passageiros, agora são carros de passeio que fazem o serviço clandestino, conduzindo quatro ou seis pessoas. Outras duas modalidades também passaram a desafiar autoridades e fiscais. O serviço Uber já começou a ser detectado em trechos intermunicipais pela fiscalização. Em outra vertente, motoristas em carros particulares têm captado passageiros no aeroporto de Confins, na Grande BH, usando contratos de prestação de serviço que não têm validade reconhecida.

Em todos os casos, o Departamento de Estradas de Rodagens de Minas Gerais (DER-MG) diz estar multando e apreendendo os irregulares. Segundo o DER, neste ano foram feitas 435 blitzes apenas na Grande BH, com 78 veículos retirados de circulação.
No estado, foram 3.202 fiscalizações e 364 apreensões. Porém, a situação verificada em pontos como o entorno da rodoviária da capital deixa claro que a repressão não é eficaz. Sem se preocupar, perueiros anunciam o serviço aos gritos e agem sem constrangimento dentro de estacionamentos particulares, que servem de pontos de embarque e desembarque. Abordados ontem pela equipe do Estado de Minas, que simulou interesse  em uma viagem, motoristas clandestinos foram categóricos: não há fiscalização, nem risco de o veículo ser parado no caminho, disseram dois deles, que atuam em diferentes trajetos.

Os próprios motoristas ou outros agenciadores abordam passageiros, geralmente aqueles que se dirigem à rodoviária em busca do serviço convencional de ônibus. Nas imediações, é vasta a lista de destinos: Ipatinga, Governador Valadares, Montes Claros, Paraopeba, Sete Lagoas, Teófilo Otoni, entre tantas outras. As rotas são, principalmente, para cidades das regiões Norte e Leste de Minas, segundo o DER. Nos arredores da Região Metropolitana de Belo Horizonte, os principais destinos dos ilegais são rumo a Sete Lagoas, Ribeirão das Neves e Betim.

Em uma das abordagens feitas pela reportagem, o perueiros, que faz a rota Governador Valadares/BH diariamente, explicou as “vantagens” de viajar no transporte clandestino.
Na propaganda, apostou no preço, na redução do tempo para chegar ao destino e ainda destacou uma suposta “segurança”. “É tranquilo. Os motoristas são experientes e rodam todo dia no trecho”, afirmou (veja diálogo), oferecendo um serviço que na verdade não tem garantias quanto à manutenção de veículos, segurança de passageiros e seguro de viagem.

CONEXÃO SETE LAGOAS Em outra rota, para Sete Lagoas, o esquema é ainda maior e distribuído em mais de um ponto no hipercentro. Dentro ou na porta de estacionamentos, passageiros esperam pelos carros do transporte clandestino, que têm preço compatível com o coletivo intermunicipal. Fazem o percurso em cerca de 50 minutos, enquanto o ônibus que sai da rodoviária leva uma hora e meia. “Tem saída a toda hora e não tem fiscalização”, disse um dos motoristas que se aventuram no trecho.

Quem faz transporte clandestino está sujeito às penalidades previstas no artigo 231 do Código de Trânsito Brasileiro, que prevê multa de R$ 85,13, além das sanções previstas na Lei 19.445/11: multa de R$ 1.361,45 e cobrança do valor em dobro no caso de reincidência (R$ 2.722,90). Podem sofrer ainda apreensão do veículo, com liberação condicionada ao pagamento de todas as despesas e pendências.

Segundo o DER, a nova forma de atuação dos perueiros já foi percebida pelos fiscais. Por meio de sua assessoria de imprensa, o órgão informou que todo tipo de veículo é fiscalizado, inclusive nos trajetos feitos para o aeroporto de Confins ou com uso do Uber.
“O DER trabalha com ações programadas, equipes alternadas e de modo itinerante, com horários diferenciados e pontos aleatórios, para que sejam evitadas as rotas de fuga”, informou.

Em todo o estado são 283 fiscais e na Grande BH trabalham, em média, 30 agentes. Ainda de acordo com o DER, à medida que os infratores mudam a forma de atuação, a fiscalização vai sendo aperfeiçoada. A BHTrans informou que não há responsabilidade do município no controle do transporte clandestino, que é atribuição exclusiva das autoridades de trânsito do estado. Tanto em Belo Horizonte quanto nos trechos intermunicipais, a Polícia Militar informou ter ações diárias e permanentes, que resultam em multas e apreensão de veículos do transporte clandestino.

VIAGEM DE RISCO
CONFIRA A NEGOCIAÇÃO FEITA COMUMDOS PERUEIROS NO ENTORNO DA RODOVIÁRIA DE BH


» Repórter: Quero ir para Governador Valadares. Como funciona?
» Perueiro: Pode vir a qualquer hora. Os carros saem a partir das 7h da manhã. De hora emhora.
» Repórter: E onde pego o carro?
» Perueiro: Naquele estacionamento (aponta para um estabelecimento ao lado da rodoviária). Basta chegar lá, que
não demora nem meia hora pra juntar o número de passageiros.
» Repórter: Mas é seguro? E não tem risco de ser parado no caminho?
» Perueiro: É tranquilo. Os motoristas são experientes. Rodam todo dia no trecho.
E não tem fiscalização. Nunca param,
porque não tem como desconfiar de um carro de passeio. Se parar, é só dizer que você está viajando a passeio..