Com 240 anos, o Caraça, em Catas Altas, na Região Central, foi erguido por Irmão Lourenço de Nossa Senhora, português de passado nebuloso. Natural de Penedo, Félix da Costa veio de Alagoas, há três séculos, para erguer em Santa Luzia, na Grande BH, um recolhimento feminino. No encontro dos rios São Francisco e da Velhas, teve uma visão mística e ganhou força para concretizar seu sonho. Já em Congonhas, que guarda obras-primas de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1737-1814), cujo bicentenário de morte é lembrado este ano, o português Feliciano Mendes fundou o Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, depois de conseguir cura milagrosa. Assim, a construção do templo, hoje reconhecido como patrimônio da humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), é um grande ex-voto ou pagamento de promessa.
Nas comemorações do tricentenário de sua história, há duas semanas, o Mosteiro de Macaúbas exibiu um estandarte com a figura de Félix da Costa, cópia do quadro existente na porta da clausura e pintado no século passado por uma religiosa da Ordem da Imaculada Conceição.
Mas antes disso, no encontro das águas do Velho Chico com o Rio das Velhas, em Barra do Guaicuí, em Várzea da Palma, no Norte do estado, Félix da Costa teve a visão de um monge com hábito branco, escapulário, manto azul e chapéu caído nas costas. “Ele se viu ali. Foi o ponto de partida para a fundação do Recolhimento de Macaúbas”, conta a freira Maria Imaculada de Jesus Hóstia.
MILAGRE A paisagem vista do alto da Serra da Piedade arrebata de imediato, mas é na ermida dedicada à Nossa Senhora da Piedade que os olhos do visitante se arregalam para apreciar a bela imagem da padroeira de Minas e muitas histórias chegam aos ouvidos. A fama do lugar teria começado entre 1765 e 1767, conforme a tradição oral, com a aparição de Nossa Senhora, com o Menino Jesus nos braços, a uma menina, muda de nascimento, cuja família vivia na comunidade de Penha, a seis quilômetros da serra. Nesse momento, a menina teria recuperado a fala. Em 1773, o templo seria construído pelo ermitão português Antônio da Silva Bracarena, com autorização do bispado de Mariana. Antes de subir a Serra da Piedade, Bracarena, que era mestre de obras, trabalhou na construção da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Bom Sucesso de Caeté, antiga Vila Nova da Rainha, diz a professora de história da arte da PUC Minas, Mônica Eustáquio Fonseca.
Na viagem de Portugal ao Brasil, o ermitão Bracarena conheceu o Irmão Lourenço de Nossa Senhora, que tomou o rumo do Arraial do Tijuco, hoje Diamantina, e depois fundou o Caraça, hoje centro de peregrinação, cultura e turismo. Esse, certamente, é um dos homens mais enigmáticos daqueles tempos e ainda desafia os pesquisadores. O irmão, segundo a lenda, seria o nobre português D. Carlos Mendonça Távora.
ORATÓRIO A história de Congonhas também trilha os caminhos de fé e arte . Em 1757, o minerador português Feliciano Mendes, que chegara à região em busca de riquezas após cura de grave enermidade, finca uma cruz no alto do Morro Maranhão. Com oratório pendurado no pescoço, ele passa a esmolar para construir o templo em homenagem ao Bom Jesus. Nessa empreitada que dura alguns anos, os sucessores de Feliciano, que morreu em 1765, convocam Aleijadinho, responsável por obras-primas na cidade: os 12 profetas em pedra-sabão, no adro da basílica, e as 64 esculturas em tamanho natural representando os Passos da Paixão de Cristo. O local se torna alvo de peregrinação social, econômica e cultural.
Depois de tantas histórias, só mesmo recorrendo ao bardo inglês William Shakespeare e à sua frase emblemática, em Hamlet, para jogar mais luz: “Há no céu e na terra, Horácio, bem mais coisas do que sonhou jamais vossa vã filosofia”..