Jornal Estado de Minas

Interdição de oito horas da BR-040 expõe a falta de plano para liberação de vias vitais

Acidente com caminhão-tanque fecha pela 7ª vez, em uma semana, a BR-040. Interdição por causa de caminhão tanque revela ainda incapacidade de atendimento em casos de emergências ambientais nas estradas

Valquiria Lopes

Com o caminhão tombado ao lado do túnel sob a 040, foram necessários três guinchos para a remoção. - Foto: Fotos: Sidney Lopes/EM/D.A.Press


Um acidente envolvendo um caminhão-tanque, no início da madrugada dessa quinta-feira, demonstrou novamente a falta de planejamento para a liberação de trechos rodoviários vitais para o transporte no entorno de Belo Horizonte, ao fechar a BR-040 por oito horas e submeter motoristas a engarrafamentos de até 20 quilômetros. Porém, além do transtorno e dos prejuízos, o tipo de veículo envolvido expôs um problema ainda maior: de todas as emergências ambientais envolvendo produtos perigosos atendidas este ano pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas (Semad), 61% foram causadas por acidentes no transporte rodoviário, com riscos de explosão, contaminação e intoxicação. De janeiro a agosto deste ano, dos 111 atendimentos, 68 ocorreram nas estradas. Em segundo lugar está a mortandade de peixes (16%), seguida por atividades industriais (9%) e acidentes no transporte ferroviário (6%). Em 2013 foram 191 emergências ambientais, das quais 132 foram relacionadas ao transporte rodoviário de cargas perigosas.

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Apenas nos últimos sete dias, a BR-040 sofreu sete intervenções que fecharam o trânsito por várias horas, três delas provocadas por acidentes envolvendo transporte de cargas perigosas, incluindo o de ontem. Na quinta-feira da semana passada, a rodovia ficou interditada nos dois sentidos por quase 18 horas no km 756, em Ewbank da Câmara, na Zona da Mata, onde uma pessoa morreu na batida frontal entre duas carretas, uma delas carregada com líquido inflamável. O desvio aumentou o trajeto em cerca de 80 quilômetros para motoristas. Há dois dias, também no trecho da rodovia que liga BH ao Rio de Janeiro, um caminhão de combustível tombou no km 602, em Congonhas, na Região Central, e um pessoa morreu.

No acidente de ontem, o caminhão-tanque ficou pendurado em uma lateral próximo a um túnel sob a BR-040, em Contagem, Grande BH, no acesso a Brasília, fechando a estrada até o meio-dia.

Acidentes envolvendo transporte de cargas perigosas têm sido comuns em período chuvoso e de tempo seco e frio, quando há neblina. Mas, segundo a superintendente de Controle e Emergência Ambiental da Semad, Zenilde Guimarães, há também questões ligadas a infrações de normas de segurança. “Ocorrem problemas como motoristas incapacitados para esse tipo de transporte e outras irregularidades”, alerta Zenilde, citando imprudência dos caminhoneiros, cansaço e falta de fiscalização nas estradas.

O aumento de acidentes com cargas perigosas nas estradas levou a Semad a criar, em junho de 2012, a Comissão Estadual de Prevenção, Preparação e Resposta Rápida a Emergências Ambientais com Produtos Perigosos (P2R2 Minas). Hoje, são 21 instituições efetivas na comissão, envolvendo órgãos públicos estaduais e federais e representantes de outros setores, como a Federação das Empresas de Transporte de Cargas de Minas Gerais, Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) e Conselho Regional de Química. Até hoje ocorreram 16 reuniões ordinárias e duas extraordinárias para estabelecer normas técnicas e padrões para prevenção e resposta rápida aos acidentes com ameaças ambientais. “Já foram feitas várias capacitações, entre elas sobre o transporte de produtos perigosos”, disse Zenilde.

Mas a superintendente da Semad reconhece que permanece a dificuldade no atendimento a esse tipo de acidente, segundo ela por haver várias instituições envolvidas. “Estamos elaborando o protocolo unificado de atendimento a emergência envolvendo produtos perigosos. Um terceiro comitê está abordando a questão do licenciamento ambiental no transporte de produtos perigosos e o que é preciso reformular para evitar acidentes”, disse Zenilde.

Devido ao risco de explosão, bombeiros resfriaram tanques até que o veículo de carga alcançasse a pista - Foto:
Estudo

Segundo a especialista, o comitê está fazendo um estudo-piloto na MG-010, considerando todas as estratégias relacionadas a emergências para apressar a liberação do tráfego em caso de acidentes com cargas perigosas. “Foi feita uma reunião extraordinária envolvendo todos os municípios com ligação com a MG-010, além de levantamento das empresas que trabalham com produtos perigosos. A expectativa é elaborar um plano de contingência e de auxílio mútuo em caso de ocorrências nesse sentido”, disse Zenilde.

Uma das ações consiste em planejar desvios e estudar ações para acelerar a limpeza e desobstrução da via.

“O plano de auxílio mútuo permite que municípios e empresas envolvidas tenham uma base estruturada, com materiais e equipamentos necessários para uma remoção rápida do produto”, disse a representante da Semad. Dependendo da substância química, segundo ela, não é possível simplesmente usar água para lavar o local. Os acidentes mais comuns envolvem transporte de combustíveis, disse.

Projeto elaborado pelo comitê, em parceria com o Ministério do Meio Ambiente, vai mapear áreas de risco no estado pelas quais passam cargas perigosas. “O trabalho vai identificar áreas de mananciais e quais as medidas a serem tomadas, como sinalização do local e providências como a construção de bacias de contenção. No caso de acidente que resulte em vazamento, é preciso reter o material para que não atinja cursos d’água”, disse a superintendente de Prevenção da Semad.

Transtorno hora a hora
A retirada do caminhão-tanque acidentado na BR-040 durou oito horas e exigiu interdição da rodovia, em uma operação demorada, que está se transformando em rotina. Acompanhe o passo a passo

4h - O caminhão-tanque que seguia de Sete Lagoas para Betim sai da pista, bate em um poste, ultrapassa a mureta sobre o túnel do Bairro Água Branca, no km 529 da BR-040, em Contagem, Grande BH, e fica dependurado. Polícia Rodoviária Federal e Corpo de Bombeiros se deslocam para o local, que fica interditado. Desvio é feito usando pistas laterais dos bairros Água Branca e Morada Nova.

8h - Só quatro horas depois o primeiro dos três guinchos que seriam usados no içamento do caminhão chega ao local; inicialmente, a estratégia sugerida foi encher os tanques com água e espuma para expulsar os gases formados de resíduos de combustível, pois havia risco de explosão.

9h - Mais uma hora e outros dois guinchos – um dos Bombeiros e outro da transportadora – chegam ao local do acidente. A proposta de encher os tanques com água é revista e os militares optam apenas por resfriar o veículo com jatos de água, já que a carga adicional poderia dificultar o içamento.

10h20 -
O trânsito nos desvios é bloqueado e qualquer veículo fica proibido de passar pelo trecho. Começa o processo de retirada do caminhão.
Amarrado em duas partes pelo tanque, ele é içado até a pista da 040. O congestionamento chega a 20 quilômetros no sentido Sete Lagoas/Belo Horizonte

11h - Com o caminhão já na posição horizontal, mas ainda no ar, bombeiros dão aval para liberar o trânsito nos desvios. Depois de 20 minutos o veículo de carga é colocado na pista da BR-040.

12h -
Oito horas depois do acidente o trânsito é totalmente liberado nos dois sentidos da rodovia.   

 

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