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Estado de Minas

Mães vivem drama com filhos internados e sonham em levá-los para casa

EM visitou os CTIs de três grandes hospitais do estado e conversou com mães que revelam a angústia de ficar 24 horas por dia no hospital


postado em 15/07/2014 06:00 / atualizado em 15/07/2014 06:38

É uma situação triste, mas busco força em Deus e nas outras mães com as quais convivo aqui no CTI - Rosilene Custódia, 45 anos, mãe de João Pedro, de 1 ano e sete meses (foto: Fotos: Marcos Michelin/EM/D.A Press )
É uma situação triste, mas busco força em Deus e nas outras mães com as quais convivo aqui no CTI - Rosilene Custódia, 45 anos, mãe de João Pedro, de 1 ano e sete meses (foto: Fotos: Marcos Michelin/EM/D.A Press )

Com as mãos ao céu, às 3h, a mãe de coração partido decidiu dar início a uma corrente de oração pela salvação da filha, nascida com 27 semanas de gestação. Danúbia, de 31 anos, começou sozinha e escolheu a madrugada, inspirada em Davi – personagem bíblico, de joelhos nas primeiras horas do dia. Não demorou para que outras mães em apuros, longe de casa, se juntassem à professora na fé e na esperança pelo livramento de seus rebentos do centro de tratamento intensivo (CTI). Histórias de amor sem igual, que se repetem em três das maiores casas de saúde de Minas Gerais.

O Estado de Minas esteve no Hospital Sofia Feldman, no Bairro Tupi, na Região Norte, no Hospital das Clínicas (HC), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na Região Hospitalar, e no Hospital Municipal Odilon Behrens, no Bairro São Cristóvão, na Região Noroeste. A reportagem encontrou mulheres-fortalezas que não arredam a fé do leito de seus filhos – pequenos ou já crescidos –, monitorados 24 horas por dia.

No HC, Janair do Carmo Marques, de 45, não se abate ao ver Adriano do Carmo Marques, de 14, em recuperação de cirurgia no pulmão. Adriano tem bronquiolite obliterante desde os três meses. Janair se mantém firme ao lado dele, dia e noite, sem reclamar. “Para mim, até que é tranquilo. A angústia maior é dele, que fica querendo ir para casa”, diz. Dona de casa e profissional de serviços gerais, é uma das mulheres residentes no alojamento reservado aos pais dos pacientes do CTI. Recanto para cochilo apenas, já que, na maior parte do tempo, as mães estão de pé, ao lado dos leitos.

Colega de alojamento de Janair, Rosana Bezerra Pinto, de 24, também tem o olhar reluzente, de mãe dedicada. Está feliz pela recuperação de Analu, de três meses. A mocinha valente, nascida prematura, está se saindo muito bem depois da cirurgia no coração. Vinda de Bom Jesus da Lapa, na Bahia, Rosana teve o diagnóstico de toxoplasmose no sexto mês de gravidez. Com parentes em Belo Horizonte, a dona de casa veio a Minas em busca de melhor atendimento. Tudo pelo futuro da bebê. “Aqui, não me sinto desamparada em nenhum momento e minha fé em Deus só aumenta”, sorri.

Janair e Rosana comentam a passagem das cirurgias, em horas de espera sem fim. O procedimento cirúrgico de Adriano, no pulmão, levou quase 6 horas. Rosana aguardou duas horas em prece pela sorte de Analu, com veia aberta no coração. Para as duas, a vivência com as outras mães de CTI é outro ponto de apoio e coragem para dar conta das dificuldades. “Não somos as únicas. E nossos problemas não são os maiores. Volto transformada para a Bahia”, diz Rosana. Janair destaca a solidariedade dos seus familiares, mobilizados pela doação de sangue para a cirurgia do filho. Emociona-se ao contar que “toda a região do Bairro Paulo VI fez campanha pelo Adriano”.

Rosana não sai de perto de Analu, de três meses, que nasceu prematura com problema no coração
Rosana não sai de perto de Analu, de três meses, que nasceu prematura com problema no coração

Por um fio

Danúbia da Costa Teixeira comemorou o aniversário deste ano na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) do Hospital Sofia Feldman, onde está desde o nascimento de Ana Rafaela, em 25 de abril, com 27 semanas e pouca chance de sobrevivência. Nada impossível para a fé de Danúbia, moradora de Farias, Zona Rural de Guanhães, no Vale do Rio Doce. Ana Rafaela passou 33 dias respirando com ajuda de aparelho. Anemia, refluxo e quatro transfusões de sangue. “Eu falo para ela: ‘fique bem quietinha porque você ainda não nasceu’. A previsão era 17 de julho”, conta a professora.

A corrente de oração na madrugada, que comoveu outras mães, foi iniciada numa segunda-feira, quando Ana Rafaela teve quatro apineias e quadro de anemia. “O mais difícil é você estar perto e não poder pegar a sua filha no colo. Já devo ter lavado de lágrimas aquela incubadora”, diz. Danúbia lamenta não ter podido vestir a bebê com a roupinha que preparou com tanto carinho para o dia do nascimento. Por outro lado, se apega a “pontos de luz”: “Oro, leio a Bíblia e converso com ela. Ela responde, olhando para mim e segurando a minha mão”, emociona-se.

Maria Lúcia de Souza Esteves, de 40, também está na corrente de oração da madrugada do Sofia Feldman. Suplica, especialmente, por dias melhores para o filho Lucas Gabriel – nascido em abril e internado desde então. O pequeno guerreiro nasceu com malformação do intestino e do esôfago. Com menos de um mês de vida, Lucas enfrentou duas cirurgias complexas. Em recuperação, o bebê tem quadro estável e a dona de casa já faz planos para voltar ao lar, em Francisco Badaró, no Vale do Jequitinhonha.

Danúbia ao lado de Ana Rafaela: a bebê nasceria quinta-feira, mas desde abril está no CTI
Danúbia ao lado de Ana Rafaela: a bebê nasceria quinta-feira, mas desde abril está no CTI

Luta sem fim

João Pedro tem 1 ano e sete meses. Um mocinho simpático e envolvente. Tem paralisia cerebral. 23 de outubro de 2012 foi um dia de agonia para Rosilene Custódia, de 45, na Maternidade Hilda Brandão, da Santa Casa de BH. Numa cesariana de urgência, a saladeira ouviu notícia ruim da equipe médica: o filho nasceu com insuficiência respiratória e o cordão umbilical enrolado no pescoço. Tempos de drama sem fim, com convulsões seguidas e temporadas em centros de tratamento intensivo.

Rosilene deixou o trabalho em um restaurante no Bairro Ouro Preto, Região da Pampulha, para viver exclusivamente por conta do filho caçula. Desde 1º de junho, Rosilene e João Pedro estão “morando” no Hospital Municipal Odilon Behrens, no Bairro São Cristóvão. “É uma situação triste, mas busco força em Deus e nas outras mães com as quais convivo aqui no CTI”, diz.

A dona de casa conta que a família está mais unida do que nunca. João Pedro enfrenta um quadro grave de asma, por isso está no CTI. Rosilene se mantém firme ao lado do mocinho. Conversa, faz carinho e não se mostra derrotada. “Tenho muita fé de que tudo vai ficar bem. Ele vai ficar bem e a gente vai voltar ao Odilon só para as consultas de rotina”, sorri.

Embora tomada de fé, Rosilene não esconde a revolta pelas faltas que tem enfrentado. “São muitos os medicamentos de que o João Pedro faz uso e todos são muito caros. Apenas alguns são disponibilizados pelo governo. Estou buscando ajuda no INSS, aguardando uma perícia. Se não conseguir, infelizmente, vou ter que pedir auxílio à Justiça”, ressalta. Ainda tem o aluguel. Sem trabalho de remuneração, 24 horas por dia por conta do filho, Rosilene tem vivido com o salário do marido, Hudson, de 40, trocador de ônibus.

Anjos de jaleco
As intensivistas Alessandra Kátia de Aguiar, do Odilon Behrens, e Adrianne Leão Sete e Oliveira, do Hospital das Clínicas, têm muito em comum. Não há paciente em apuros que não possa contar com a solidariedade das duas pediatras, especialistas em sofrimento e alegrias. Sem filhos ou consultórios particulares, as duas doutoras queridas vivem exclusivamente para a lida em seus hospitais.

Discretas e reservadas, não são de entrevistas e menos ainda de fotografias. No HC, na Região Hospitalar, não há quem conheça bem o CTI pediátrico e não seja fã de carteirinha de Adrianne – melhor companheira das mamães e dos sujeitos com a vida por um fio. Na Região Noroeste, a história se repete com Alessandra, que chega a receber presentes nos Dia das Mães. “Não tenho o coração blindado. Choro junto, sofro junto. Não é fácil lidar com o sofrimento. A força vem da vontade de ajudar, de querer fazer algo”, diz Alessandra.

No Hospital Sofia Feldman, um dos anjos da casa é a psicóloga Ada Helena Gomes, de 32, que trabalha para reconhecer, com carinho e respeito, as necessidades de cada acompanhante. Mãe do pequeno Inácio, de 4, Ada não esquece o tempo em que também foi “mãe de CTI”. Ao nascer, Inácio teve o diagnóstico de pneumonia. “A angústia de ver e não poder trazer ao peito é enorme”, relembra.


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