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Estado de Minas

Trilhas de moto nas montanhas ameaçam a natureza, alertam especialistas

Prática de esporte ao Sul da Grande BH, que atrai milhares de motociclistas, recebe críticas por danos ambientais que favorecem erosões


postado em 06/05/2014 06:00 / atualizado em 06/05/2014 12:58

Segundo especialista, abertura de caminhos em vegetação de campos rupestres, com solo rico em minério, gera prejuízos irrecuperáveis ao ambiente e causa voçorocas com ação da chuva(foto: Fotos: Rodrigo Clemente/EM/D.A Press)
Segundo especialista, abertura de caminhos em vegetação de campos rupestres, com solo rico em minério, gera prejuízos irrecuperáveis ao ambiente e causa voçorocas com ação da chuva (foto: Fotos: Rodrigo Clemente/EM/D.A Press)

A vegetação de montanha que conseguiu resistir à expansão imobiliária e à mineração na porção Sul da Região Metropolitana de Belo Horizonte vem sendo retalhada por uma outra ameaça, nada silenciosa. Em um ecossistema considerado frágil por especialistas, caminhos abertos por motociclistas que praticam trilhas se multiplicam, destruindo a vegetação, vitimando animais e abrindo caminho para a erosão, que por sua vez leva à exploração de novos caminhos por adeptos do esporte. O tempo necessário para recomposição natural das áreas devastadas em municípios como Nova Lima, Rio Acima e Moeda pode chegar a 100 anos, de acordo com o professor titular de ecologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Geraldo Wilson Fernandes.

Segundo ele, na prática os danos são irreparáveis, pois o ambiente de campos rupestres sobre terreno de cristal de quartzo com depósitos de ferro é muito frágil. Quando a camada de vegetação é retirada, as chances de recuperação são baixíssimas. “Nesses locais há uma flora muito especializada, plantas únicas que só crescem ali e que precisam ser protegidas”, alerta o especialista.

Os danos causados ao meio ambiente pelas motos de trilhas preocupam autoridades do Poder Executivo e do Ministério Público do estado, principalmente em São Sebastião das Águas Claras, distrito conhecido como Macacos, em Nova Lima, distante 20 quilômetros da capital. Nos fins de semana, o lugarejo de 1,2 mil habitantes chega a receber mil motoqueiros, sem contar os turistas atraídos pelas belezas naturais e bons restaurantes. As cicatrizes abertas na vegetação pelas motos podem ser vistas a distância, em uma devastação que se estende às cidades vizinhas de Moeda e Rio Acima, assim como na Serra da Calçada, região que também pertence a Nova Lima, às margens da BR-040.

Em Macacos, segundo o professor Geraldo Fernandes, as trilhas abertas por motoqueiros, sob ação da chuva, transformam-se em grandes erosões, as chamadas voçorocas, que só vão aumentando. “Fica caríssimo e é praticamente impossível restaurar essas voçorocas. E o problema aumenta, pois os motoqueiros fazem uma trilha e, quando aquilo vira uma voçoroca, abrem caminho de outro lado”, afirma o especialista em ecologia evolutiva e em restauração ambiental. Ele sugere alternativas, como pistas em locais apropriados para a prática do esporte. “Não é a mesma coisa, porque é um esporte praticado ao ar livre, mas pode aliviar essa pressão. O que não tem alternativa e é muito caro é destruir o meio ambiente”, lamenta, acrescentando que a região já é suscetível a outros fatores, como a extração mineral e a expansão imobiliária.

Além dos danos ambientais, moradores do distrito de Macacos reclamam dos abusos dos motoqueiros no perímetro urbano, onde eles pilotam em alta velocidade, fazem manobras arriscadas e provocam acidentes de trânsito, muitas vezes protegidos pela falta de identificação das motos. De acordo com o Código de Trânsito Brasileiro, motocicletas dedicadas única e exclusivamente à prática de trilhas não precisam ter placas ou licenciamento, mas são proibidas de transitar em vias públicas, podendo apenas ser transportadas por reboques ou caminhonetes. Em Macacos, há um acordo com o município de Nova Lima para que os motociclistas possam trafegar pelas ruas, por ser passagem de uma trilha para outra. A Guarda Municipal informou que tem combatido abusos e apreendido motos.

Em Macacos, distrito de Nova Lima, tráfego de motos sem identificação favorece abusos, dizem moradores(foto: Fotos: Rodrigo Clemente/EM/D.A Press)
Em Macacos, distrito de Nova Lima, tráfego de motos sem identificação favorece abusos, dizem moradores (foto: Fotos: Rodrigo Clemente/EM/D.A Press)
Conscientização

O empresário Daniel Soares, de 40 anos, faz parte do grupo de trilha “Quarta às Quatro” e pratica o esporte em Macacos há vários anos. Ele admite que danos são causados pelas motos ao meio ambiente, mas entende que a degradação é pequena em relação à extração de minério ou ao avanço imobiliário. Segundo ele, pelo menos mil motoqueiros de vários grupos organizados procuram Macacos nos fins de semana, e muitos deixam seus veículos guardados em “hotéis de moto”, comuns na área. “O esporte é praticado em Macacos e região há mais de 30 anos”, disse.

Para o empresário, foram os trilheiros que atraíram o turismo para Macacos e foram responsáveis pelo desenvolvimento do distrito, principalmente na década de 80, quando, segundo ele, foram construídos vários restaurantes, hotéis e pousadas exclusivos para os praticantes do esporte.

Daniel, porém, admite que há uma minoria de motoqueiros cometendo abusos na área urbana, acelerando e fazendo manobras perigosas, mas afirma que ninguém de seu grupo concorda com essa prática. “Somos a favor de blitzes e queremos coibir esse tipo de coisa. Há abuso de velocidade em áreas urbanas, há motos sendo roubadas nas trilhas, e a polícia não faz nada para impedir isso. Só não acho certo discriminar um grupo inteiro por causa de meia dúzia”, reclama o empresário. Ele acrescenta que o trilheiro não deixa lixo por onde passa, ao contrário de pessoas que vão se divertir nas cachoeiras.

O Ministério Público estadual informou que há um inquérito para efetivar a implantação do monumento natural da Serra da Calçada, transformando-o em área de preservação, o que coibiria a presença de praticantes de trilhas na região. A Promotoria de Meio Ambiente de Nova Lima também move uma ação civil pública para apurar os danos causados ao meio ambiente em Macacos e outras regiões do município. A Prefeitura de Nova Lima nomeou um gerente, que participa das reuniões no MP sobre o tema. A Polícia Militar em Nova Lima não se manifestou sobre os abusos de trânsito em Macacos.

LEITORES COMENTAM NO EM.COM.BR

“Há muito tempo isso já acontece. Esse pessoal se diz amante da natureza, faz ‘trilhas ecológicas’ e deixa sulcos de destruição principalmente nas cristas dos morros, que têm provocado erosões gigantescas. E, para relaxar, como as motos não têm placas, transgressões de trânsito.”

Alfredo H.W.

“Obviamente existem os que não seguem as leis de trânsito nem o bom senso. Mas não é admissível que todos os praticantes do esporte paguem por essa pequena minoria. Os verdadeiros praticantes possuem o espírito de ajudar o próximo, preservar o meio ambiente, seguir as leis.”

Felipe Maciel

“Esses senhores não são pessoas sem recursos. Muito pelo contrário. E, assim como na vida, não estão nem um pouco preocupados com o que é dos outros. Preocupam-se com sua diversão e o resto que se exploda. Fiscalização neles.”
Pedro Brito

“Quem critica desconhece o esporte e nunca subiu em uma moto. Trabalho a semana toda esperando a hora em que vou poder sair do inferno da cidade e sumir no meio no mato! Lazer, companheirismo, adrenalina e bom humor. Ser trilheiro é mais do que tudo um estilo de vida.”
Aloysio Vale


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