Jornal Estado de Minas

O fole do Gonzagão

Confira a crônica do repórter passageiro no BRT/Move

Arnaldo Viana
Na virada da Avenida Getúlio Vargas para a Rua Professor Moraes, na quente tarde dessa terça-feira, a articulação do gigante abriu de um lado, como um fole, e fechou do outro.
O movimento arrancou um largo sorriso de Alvim Reis. “Parece mesmo o fole de uma acordeon de 80 baixos.” Ele nem se incomodou com o atraso de pelo menos 15 minutos do busão. Pegou a mulher, Maria da Saúde, pela mão e subiu os degraus. Saiu do calor de 30 graus para o frescor do ar-condicionado. Sorriu mais quando soube que embarcara no Gonzagão.

“O apelido é bom”, diz Alvim. “Mas não tem nada de mineiro. Bom seria se fosse um nome mais ligado à cultura de Minas”, retruca Maria da Saúde.
Ele tem 77 anos e ela, 66. Tinham acabado de tirar a carteirinha da BHTRans que lhes permite andar de graça no transporte coletivo. Mas se conquistaram direito ao benefício aos 65 anos, por que só agora foram buscá-lo? “Moro na Cidade Nova, mas passo a maior parte do tempo no sítio fora da capital”, responde Alvim. Buscou a carteirinha só para experimentar a novidade, o Gonzagão.

”Engraçado, nós sentados aqui e as pessoas, lá fora, olhando como se fôssemos seres de outro mundo”, diverte-se Maria da Saúde. Mas ele está enganada. É aquela coisa, né, como quando alguém, no aeroporto cheio, acena para o Reynaldo Cisotto Gianecchini e você pensa que é para você. As pessoas olhavam, entre curiosas e espantadas, era para a nova estrela do transporte coletivo de BH, o Gonzagão, oficialmente chamado de Move, que passa arrastado pelo motor de 360 cavalos. O apelido pode até não pegar, nem no tranco, mas o sistema…

“Já colou, nem só pelo conforto, mas pela rapidez”, diz Valdivino Rodrigues, de 29 anos, ao volante do Gonzagão número 20477, o mesmo no qual embarcaram Alvim e Maria Saúde. “Faço uma viagem de ida e volta da Estação São Gabriel ao Bairro Funcionários em 55 minutos, uma hora. Naquele lá (e aponta para um Gonzaguinha, o modelo padrão que passa ao lado) nem em uma hora e meia.” É que o Gonzaguinha não goza de privilégios no tráfego, como o Gonzagão. Com Valdivinio, concorda a cobradora Maria de Fátima Luz, de 37.

O Gonzaguinha, barulhento e sacolejante, montado em carroceria de caminhão, sem ar-condicionado e sem oferecer o menor conforto nos assentos, é sério candidato a uma página virada para quem está na rota do novo sistema. As amigas Aline Nogueira, de 25, e Silvana Souza, de 29, se deliciam com a primeira viagem no Gonzagão. “Vale só por esse ar, fresquinho.
Aquele outro lá (aponta para o modelo padrão do outro lado da avenida), neste trajeto, não pegamos mais. Aliás, nem na música gosto tanto do Gonzaguinha como gosto do Gonzagão”, diz Aline..